Discursos Bento XVI

BÊNÇÃO APOSTÓLICA «URBI ET ORBI» PRIMEIRA SAUDAÇÃO DE SUA SANTIDADE BENTO XVI

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Terça-feira, 19 de Abril de 2005




Amados Irmãos e Irmãs,

Depois do grande Papa João Paulo II, os Senhores Cardeais elegeram-me, simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor.

Consola-me saber que o Senhor sabe trabalhar e agir também com instrumentos insuficientes. E, sobretudo, recomendo-me às vossas orações.

Na alegria do Senhor Ressuscitado, confiantes na sua ajuda permanente, vamos em frente. O Senhor ajudar-nos-á. Maria, sua Mãe Santíssima, está connosco. Obrigado!




AOS MEMBROS DO COLÉGIO CARDINALÍCIO NO ENCONTRO NA SALA CLEMENTINA Sexta-feira, 22 de Abril de 2005

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Venerados Irmãos Cardeais!

1. Encontro-me hoje convosco e desejo fazer-vos partícipes, de modo simples e fraterno, do estado de ânimo que estou a viver nestes dias. Às intensas emoções sentidas por ocasião da morte do meu venerado predecessor João Paulo II e depois durante o Conclave e, sobretudo, no seu epílogo juntam-se uma profunda necessidade de silêncio e dois sentimentos entre si complementares: um profundo desejo do coração de agradecer e um sentido de humana debilidade perante a alta tarefa que me aguarda.

Antes de tudo, a gratidão. Sinto, em primeiro lugar, que devo dar graças a Deus, que me quis, apesar da minha humana fragilidade, como Sucessor do apóstolo Pedro, e me confiou a tarefa de reger e guiar a Igreja, para que seja no mundo sacramento de unidade para todo o género humano (cf. Lumen gentium
LG 1). Disto temos a certeza, é o Pastor eterno quem conduz com a força do seu Espírito a sua grei, garantindo-lhe, em todos os tempos, Pastores por Ele escolhidos. Nestes dias elevou-se em coro a oração do povo cristão pelo novo Pontífice e foi deveras comovedor o primeiro encontro com os fiéis, anteontem, na Praça de São Pedro: a todos, Bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas, jovens e idosos chegue o meu agradecimento mais sentido pela sua solidariedade espiritual.

2. Sinto o dever de dirigir um profundo agradecimento a cada um de vós, venerados Irmãos, começando pelo Senhor Cardeal Angelo Sodano que, fazendo-se intérprete dos sentimentos comuns, há pouco me dirigiu afectuosas expressões e calorosos bons-votos. Com ele, agradeço ao Senhor Cardeal Camerlengo, Eduardo Martínez Somalo, pelo serviço prestado generosamente nesta delicada fase de passagem.

Depois, desejo abranger com o meu reconhecimento sincero todos os membros do Colégio Cardinalício pela activa colaboração por eles prestada na gestão da Igreja durante a Sede Vacante. Desejaria saudar com afecto particular os Cardeais que, devido à sua idade ou doença, não participaram no Conclave. Estou grato a cada um pelo exemplo que deram de disponibilidade e de comunhão fraterna, assim como pela sua intensa oração, ambas expressões de amor fiel à Igreja, esposa de Cristo.

Além disso, não posso deixar de expressar a minha gratidão a quantos, com diversas funções, cooperaram na organização e no desenvolvimento do Conclave, ajudando de muitas formas os Cardeais a transcorrer do modo mais seguro e tranquilo estes dias repletos de responsabilidade.

3. Venerados Irmãos, dirijo-vos o meu agradecimento mais pessoal pela confiança que depusestes em mim elegendo-me Bispo de Roma e Pastor da Igreja universal. É um acto de confiança que constitui um encorajamento a empreender esta nova missão com mais serenidade, porque estou persuadido de poder contar, além da ajuda indispensável de Deus, também com a vossa generosa colaboração. Peço-vos que nunca me deixeis faltar este vosso apoio! Se por um lado tenho presente os limites da minha pessoa e das minhas capacidades, por outro sei bem qual é a natureza da missão que me foi confiada e que me preparo para desempenhar com uma atitude de dedicação interior. Não se trata de honras, mas de serviço a desempenhar com simplicidade e disponibilidade, imitando o nosso Mestre e Senhor, que não veio para ser servido mas para servir (cf. Mt 20,28), e na Última Ceia lavou os pés dos apóstolos dizendo-lhes que fizessem o mesmo (cf. Jn 13,13-14). Portanto, mais não nos resta, a mim e a todos nós juntos, que aceitar da Providência a vontade de Deus e fazer o melhor que podemos para lhe corresponder, ajudando-nos uns aos outros no cumprimento das respectivas tarefas ao serviço da Igreja.

4. Neste momento, apraz-me voltar com o pensamento aos meus venerados Predecessores, o beato João XXIII, os servos de Deus Paulo VI e João Paulo I e especialmente a João Paulo II, cujo testemunho nos sustentou como nunca nos dias passados, e cuja presença continuamos a sentir sempre viva. O doloroso acontecimento da sua morte, depois de um período de grandes provações e sofrimentos, revelou-se na realidade com características pascais, como ele tinha desejado no seu Testamento (24.III.1980). A luz e a força de Cristo ressuscitado foram irradiadas na Igreja por aquela espécie de "última Missa" que ele celebrou na sua agonia, que culminou no "Amém" de uma vida totalmente oferecida, por meio do Coração Imaculado de Maria, para a salvação do mundo.

5. Venerados Irmãos! Cada um de vós voltará agora à respectiva Sede para retomar o seu trabalho, mas espiritualmente permaneceremos unidos na fé e no amor do Senhor, no vínculo da celebração eucarística, na oração insistente e na partilha do ministério apostólico quotidiano. A vossa espiritual proximidade, os vossos conselhos iluminados e a vossa cooperação efectiva serão para mim um dom do qual vos serei sempre grato e um estímulo para cumprir o mandato que me foi confiado com total fidelidade e dedicação.

À Virgem Mãe de Deus, que acompanhou com a sua presença silenciosa os passos da Igreja nascente e confortou a fé dos Apóstolos, confio todos nós e as expectativas, as esperanças e as preocupações de toda a comunidade dos cristãos. Sob a materna protecção de Maria, Mater Ecclesia, convido-vos a caminhar com docilidade e obediência à voz do seu divino Filho e nosso Senhor Jesus Cristo. Invocando o seu constante patrocínio, concedo de coração a Bênção Apostólica a cada um de vós e a quantos a Providência divina confia aos vossos cuidados pastorais.






AOS REPRESENTANTES DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL PRESENTES EM ROMA 23 de Abril de 2005

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Ilustres Senhores,
gentis Senhoras!

1. É com prazer que vos encontro e vos saúdo cordialmente, jornalistas, fotógrafos, profissionais da televisão e todos vós que, por diversos títulos, pertenceis ao mundo das comunicações.

Obrigado pela vossa visita e particularmente pelo serviço que realizastes nestes dias à Santa Sé e à Igreja Católica. Dirijo uma cordial saudação a D. John Patrick Folley, Presidente do Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais, e agradeço-lhe as palavras que pronunciou em nome dos presentes.

Pode-se dizer que, graças ao vosso trabalho, por diversas semanas a atenção do mundo inteiro permaneceu fixada na Basílica, na Praça de São Pedro e no Palácio Apostólico onde o meu Predecessor, o inesquecível Papa João Paulo II, encerrou serenamente a sua existência terrena, e onde em seguida, na Capela Sistina, os Senhores Cardeais me elegeram, como seu Sucessor.

2. Estes eventos eclesiais de histórica importância tiveram, por vosso intermédio, uma cobertura mundial. Sei bem quanto cansaço suportastes, obrigados a permanecer longe da família e das vossas casas, a trabalhar com horários prolongados e em condições nem sempre fáceis. Por tudo isso desejo agradecer em meu nome pessoal e especialmente dos católicos que, vivendo em Países muito distantes de Roma, puderam compartilhar estes momentos emocionantes de fé em tempo real. Prodígios e extraordinários poderes dos meios de comunicação social!

O Concílio Vaticano II já contemplava o promissor desenvolvimento destes instrumentos. A eles, de facto, os Padres Conciliares quiseram dedicar o primeiro dos seus documentos no qual se afirma que tais meios "por sua natureza, não só podem chegar a cada um dos homens, mas também às multidões e a toda a sociedade humana" (Inter mirifica
IM 1). Desde 4 de Dezembro de 1963, quando foi publicado o Decreto Inter mirifica, a humanidade conheceu e ainda é testemunha de uma extraordinária revolução mediática, que contemplou cada aspecto e possibilidade de toda a existência humana.

3. Consciente da sua missão e da importância dos meios de comunicação, a Igreja, especialmente a partir do Concílio Vaticano II, procurou a colaboração com o mundo da comunicação social. Grande artífice deste diálogo aberto e sincero foi, sem dúvida, também João Paulo II que convosco, agentes das comunicações sociais, em mais de 26 anos de Pontificado, manteve um constante e fecundo relacionamento. E é exactamente aos responsáveis das comunicações sociais que ele quis dedicar um dos seus últimos documentos, a Carta Apostólica do último dia 24 de Janeiro na qual recorda que "a nossa época é uma época de comunicação global, onde muitos momentos da existência humana se desenrolam através de processos mediáticos, ou pelo menos se devem confrontar com eles" (O Rápido desenvolvimento, 3).

É meu desejo prosseguir este frutuoso diálogo, e compartilho a propósito o que observou João Paulo II que "o actual fenómeno das comunicações sociais impulsiona a Igreja a fazer uma espécie de revisão pastoral e cultural, a fim de ser capaz de enfrentar, de maneira apropriada, a passagem de época que estamos a viver" (ibid., 8).

4. Para que os instrumentos de comunicação social possam prestar um serviço positivo ao bem comum, é preciso uma contribuição responsável de todos e de cada um. É sempre necessária uma compreensão melhor das perspectivas e das responsabilidades que o seu desenvolvimento comporta quanto aos reflexos que de facto se verificam na consciência e na mentalidade dos indivíduos como na formação da opinião pública. Não se pode, portanto, deixar de evidenciar a necessidade de claras referências sobre a responsabilidade ética de quem trabalha em tal sector, especialmente no que se refere à sincera busca da verdade e à salvaguarda da centralidade e da dignidade da pessoa. Somente sob estas condições os meios de comunicação podem responder ao desígnio de Deus que os colocou à nossa disposição "para os descobrirmos, usarmos, fazer conhecer a verdade, também a verdade acerca do nosso destino de filhos seus, herdeiros do seu Reino eterno" (ibid., 14).

5. Ilustres Senhores, gentis Senhoras, agradeço-vos ainda o importante serviço que prestais à sociedade. A cada um chegue o meu cordial reconhecimento com a certeza de uma recordação na oração por todas as vossas intenções. Estendo a minha saudação às vossas famílias e a quantos fazem parte das vossas comunidades de trabalho. Por intercessão da celestial Mãe de Cristo, invoco em profusão para cada um os dons de Deus, em penhor dos quais a todos concedo a minha Bênção.




AOS DELEGADOS DAS OUTRAS IGREJAS, COMUNIDADES ECLESIAIS E TRADIÇÕES RELIGIOSAS Segunda-feira, 25 de Abril de 2005

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Com grande alegria vos recebo, queridos Delegados das Igrejas Ortodoxas, das Igrejas ortodoxas orientais e das Comunidades eclesiais do Ocidente, poucos dias após a minha eleição. Foi particularmente apreciada a vossa presença ontem na Praça de São Pedro, depois de termos vivido juntos os tristes momentos da despedida do saudoso Papa João Paulo II. O tributo de simpatia e de afecto que expressastes ao meu Predecessor inesquecível foi muito mais do que um simples acto de cortesia. Foi percorrido muito caminho durante os anos do seu Pontificado e a vossa participação no luto da Igreja católica pelo seu desaparecimento mostrou como é verdadeira e grande a paixão comum pela unidade.

Ao saudar-vos gostaria de dar graças ao Senhor que nos abençoou com a sua misericórdia e infundiu em nós uma sincera disposição para fazer nossa a sua oração: ut unum sint. Assim, ele tornou-nos cada vez mais conscientes da importância de caminhar rumo à plena comunhão. Com fraterna amizade podemos trocar os dons recebidos do Espírito e sentimo-nos estimulados a encorajar-nos reciprocamente para anunciar Cristo e a sua mensagem ao mundo, que hoje se mostra com frequência perturbado e inquieto, inconsciente e indiferente.

O nosso encontro de hoje é particularmente significativo. Ele permite, antes de tudo, que o novo Bispo de Roma, Pastor da Igreja católica, repita a todos, com simplicidade: Duc in altum! Prossigamos na esperança. Seguindo as pegadas dos meus Predecessores, em particular de Paulo VI e de João Paulo II, sinto a enorme necessidade de afirmar de novo o compromisso irreversível, assumido pelo Concílio Vaticano II e prosseguido durante os últimos anos graças também à acção do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos. O caminho rumo à plena comunhão querida por Jesus para os seus discípulos exige, numa docilidade concreta ao que o Espírito diz às Igrejas, coragem, docilidade, firmeza e esperança de alcançar a finalidade. Exige em primeiro lugar a oração insistente e de um só coração, para obter do Bom Pastor o dom da unidade para o seu rebanho.

Como não reconhecer com um espírito de gratidão a Deus que o nosso encontro tem também o significado de um dom já concedido? De facto, Cristo, o Príncipe da Paz, agiu entre nós, distribuiu a mãos-cheias sentimentos de amizade, atenuou as discórdias, ensinou-nos a viver com uma atitude de maior diálogo, em harmonia com os compromissos próprios de quem tem o seu nome. A vossa presença, queridos Irmãos em Cristo, além do que nos separa e lança sombras sobre a nossa comunhão plena e visível, constitui um sinal de partilha e de apoio para o Bispo de Roma, que pode contar convosco para prosseguir o caminho da esperança e para crescer para Ele, para Cristo, que é a Cabeça.

Numa ocasião tão singular como esta, que nos vê reunidos precisamente no início do meu serviço eclesial aceite com temor e obediência confiante no Senhor, peço a todos vós que deis juntamente comigo um exemplo daquele ecumenismo espiritual, que na oração realiza sem obstáculos a nossa comunhão.

Confio a todos vós estas intenções e reflexões com as minhas saudações mais cordiais para que, através das vossas pessoas, possam ser transmitidas às vossas Igrejas e Comunidades eclesiais.
Dirijo-me agora a vós, amados amigos das diversas tradições religiosas, e agradeço-vos sinceramente a vossa presença na solene inauguração do meu Pontificado. Saúdo cordial e afectuosamente todos vós e quantos pertencem às religiões que representais. Estou grato de modo particular pela presença entre vós de membros da comunidade muçulmana, e exprimo o meu apreço pelo crescimento do diálogo entre muçulmanos e cristãos, a nível quer eclesial quer internacional. Garanto-vos que a Igreja deseja dar continuidade à construção de pontes de amizade com os seguidores de todas as religiões, a fim de procurar o bem autêntico de todas as pessoas e da sociedade no seu conjunto.

O mundo em que vivemos com frequência está marcado por conflitos, violência e guerras, mas aspira seriamente pela paz, uma paz que é sobretudo um dom de Deus, uma paz pela qual devemos rezar incessantemente. Contudo, a paz é também um dever pelo qual todos os povos se devem comprometer, sobretudo os que professam pertencer a tradições religiosas. Os nossos esforços para nos encontrarmos e promover o diálogo são um precioso contributo para construir a paz sobre bases sólidas. O Papa João Paulo II, o meu venerável predecessor, no início do novo Milénio escreveu que "o nome do único Deus deve tornar-se cada vez mais, como é, um nome de paz e um imperativo de paz" (Novo millennio ineunte
NM 55). Portanto é imperativo comprometer-se num diálogo autêntico e sincero, construído no respeito da dignidade de todas as pessoas humanas, criadas, como nós cristãos cremos firmemente, à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn 1,26-27).

No início do meu Pontificado dirijo a vós e a todos os crentes das tradições religiosas que representais, assim como a quantos procuram de coração sincero a Verdade, um forte convite a tornar-se juntos artífices de paz, num compromisso recíproco de compreensão, de respeito e de amor.

A todos a minha cordial saudação.




ÀS DELEGAÇÕES E PEREGRINOS DE LÍNGUA ALEMÃ QUE VIERAM A ROMA POR OCASIÃO DA ELEIÇÃO Segunda-feira, 25 de Abril de 2005

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Queridos Concidadãos!

Em primeiro lugar devo pedir desculpa pelo atraso. Os alemães são famosos pela pontualidade. Ao que parece, já me italianizei muito. Mas tivemos um encontro ecuménico com os representantes do ecumenismo de todo o mundo, de todas as Igrejas e comunidades eclesiais, com os representantes das outras religiões. Foi um encontro muito cordial, e por isso durou mais tempo. Mas agora finalmente: cordiais boas-vindas!

Agradeço de coração os bons votos, as palavras e as manifestações de afecto e de amizade que recebi de modo impressionante de todas as partes da Alemanha. No início do meu caminho num ministério no qual jamais tinha pensado e para o qual não me sentia adequado, tudo isto me dá grande força e ajuda. Que Deus vos recompense! Quando, lentamente, o andamento das votações me fez compreender que, por assim dizer, a guilhotina teria caído sobre mim, comecei a ter vertigens. Estava convencido de que tinha desempenhado a obra de toda uma vida e de poder transcorrer os meus últimos dias em tranquilidade. Com profunda convicção disse ao Senhor: não me faças isto! Dispões de pessoas mais jovens e melhores, que podem enfrentar esta grande tarefa com outro impulso e vigor. Permaneci então muito comovido com uma breve carta que me escreveu um irmão do colégio cardinalício. Recordou-me que por ocasião da Missa por João Paulo II eu tinha centrado a homilia, partindo do Evangelho, sobre a palavra que o Senhor disse a Pedro junto do lago de Genesaré: segue-me! Expliquei que Karol Wojtyla recebeu sempre de novo esta chamada do Senhor, e como sempre de novo tivera que renunciar a muito e dizer simplesmente: sim, sigo-te, mesmo se me conduzes onde não quero. O irmão escreveu-me: Se agora o Senhor te dissesse a ti "segue-me", então recorda-te do que pregaste. Não te recuses! Sê obediente como descreveste o grande Papa, que voltou à casa do Pai. Isto admirou-me profundamente. As vias do Senhor não são confortáveis, mas nós não somos criados para o conforto, mas para as coisas grandes, para o bem.

Assim, no final mais não pude fazer do que dizer sim. Confio no Senhor, e confio em vós, queridos amigos. Um cristão nunca está sozinho, disse ontem na homilia. Expressei assim a maravilhosa experiência que todos nós vivemos nas extraordinárias quatro semanas acabadas de transcorrer. Com a morte do Papa, entre tanto sofrimento, emergiu a Igreja viva. Foi evidenciado que a Igreja é uma força de unidade, um sinal para a humanidade. Quando as grandes emissoras radiotelevisivas transmitiam ininterruptamente o retorno à casa do Pai do Papa, o sofrimento das pessoas, a obra do grande defunto, respondiam a uma participação que superou qualquer expectativa. No Papa eles viram um pai que dava segurança e confiança. Que de certa forma unia todos entre si. Viu-se que a Igreja não está fechada em si mesma e não existe só para si mesma, mas que é um ponto luminoso para os homens. Viu-se que a Igreja não é absolutamente velha e imóvel. Não, é jovem.

E se olharmos para estes jovens, que se reuniram à volta do Papa defunto e, enfim, à volta de Cristo, cuja causa o Papa fez sua, então viu-se uma coisa não menos confortadora: não é verdade que os jovens pensam sobretudo no consumo e no prazer. Não é verdade que são materialistas e egoístas. É verdade o contrário: os jovens desejam coisas grandes. Querem que a injustiça seja eliminada. Querem que sejam superadas as desigualdades e que todos tenham a sua parte dos bens da terra. Querem que os oprimidos obtenham a liberdade. Querem coisas grandes. Desejam coisas boas. E por isso os jovens estão vós sabei-lo de novo plenamente abertos a Cristo. Cristo não nos prometeu uma vida confortável. Quem deseja comodidades, com Ele errou direcção. Mas ele mostra-nos o caminho rumo às coisas grandes, o bem, rumo à vida humana autêntica. Quando fala da cruz que devemos carregar sobre os nossos ombros, não se trata de prazer do tormento ou de pedante moralismo. É impulso do amor, que se encaminha por si mesmo, que não olha em redor procurando-se a si mesmo, mas que abre a pessoa ao serviço da verdade, à justiça, ao bem. Cristo mostra-nos Deus, e com isto a verdadeira grandeza do homem.

Com grato prazer vejo aqui as delegações e os peregrinos da minha terra da Baviera. Já noutras ocasiões pude dizer-vos quanto é importante para mim o vosso afecto fiel, que perdura desde os dias em que deixei a minha amada Arquidiocese de Monastério e Frisinga para vir para o Vaticano a fim de responder à chamada do meu venerado predecessor o Papa João Paulo II, que há mais de 23 anos me nomeou Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Em todos os anos transcorridos desde então estive sempre consciente de que a Baviera e Roma não são, sob o ponto de vista geográfico, muito distantes: a Baviera e Roma foram desde sempre dois pontos entre os quais existiu uma recíproca relação fecunda. De Roma, por meio dos comerciantes, funcionários e soldados, o Evangelho chegou até ao Danúbio e ao Lech. Salto muitos acontecimentos. Depois, nos séculos XVI e XVII, a Baviera deu um dos mais belos testemunhos de fidelidade à Igreja católica. Isto é confirmado pelo intercâmbio fecundo de cultura e piedade entre a Baviera barroca e a Sé do Sucessor de Pedro. Na época moderna foi a Baviera que deu à Igreja universal um santo tão amável como o capuchinho Fratel Corrado de Parzam.

Queridos Amigos, não nos distraíamos desta generosidade, desta peregrinação para Cristo. Aguardo com alegria Colónia, onde se encontrarão os jovens do mundo, ou melhor: onde a juventude do mundo terá o seu encontro com Cristo. Caminhemos juntos, estamos unidos. Confio na vossa ajuda. Peço a vossa indulgência se cometer erros como todos os homens, ou se algo do que o Papa deve dizer e fazer segundo a própria consciência e segundo a consciência da Igreja não é compreendido. Peço a vossa confiança. Se permanecermos unidos, então encontraremos o caminho justo. E rezemos a Maria, Mãe do Senhor, para que nos faça sentir o seu amor de mulher e de mãe, no qual podemos compreender toda a profundidade do mistério de Cristo. O Senhor vos abençoe a todos!




NA VISITA AO PALÁCIO APOSTÓLICO DE CASTEL GANDOLFO E ÀS VILAS PONTIFÍCIAS 5 de Maio de 2005

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Vim hoje encontrar-me convosco pela primeira vez, queridos amigos de Castel Gandolfo. Obrigado pela vossa presença e pela vossa cordialidade. O motivo da visita de hoje é conhecer o Palácio Apostólico e as Vilas Pontifícias, onde, se Deus quiser, é minha intenção transcorrer os meses de Verão, como faziam os meus venerados Predecessores. Portanto, este é o primeiro de muitos outros encontros que espero ter convosco nesta vossa bela cidadezinha.

Saúdo o Secretário de Estado, Cardeal Angelo Sodano, o Pastor da Diocese de Albano, D. Marcello Semeraro, o Pároco de Castel Gandolfo com os sacerdotes que o coadjuvam e toda a comunidade paroquial. Depois, saúdo o Director das Vilas Pontifícias, Dr. Saverio Petrillo, e quantos nelas trabalham e garantem o funcionamento quotidiano. Por fim, saúdo o Presidente da Câmara e o Conselho Municipal e, através deles, estendo o meu grato pensamento à vossa cidade sempre acolhedora com os turistas e peregrinos. A todos os habitantes dos Castelos gostaria de fazer chegar os meus cordiais votos de serenidade e de paz.




AO CORPO DA GUARDA SUÍÇA PONTIFÍCIA POR OCASIÃO DO JURAMENTO DOS NOVOS RECRUTAS Sexta-feira, 6 de Maio 2005

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Excelentíssimo Senhor Comandante
Reverendo Capelão
Queridos Guardas Suíços
Queridos parentes e amigos
do Corpo da Guarda Suíça Pontifícia!

Dirijo-vos uma calorosa saudação e dou-vos as boas-vindas à casa do Papa! Desde as primeiras horas do meu Pontificado vós, Guardas Suíços, fostes fiéis e disponíveis. Acompanhais o Sucessor de Pedro "passo a passo" e garantis de maneira eficaz a sua protecção, de modo que, livre de preocupações acerca da própria incolumidade, possa desenvolver o seu serviço pela salvação dos homens e para o bem dos povos. Queridos amigos, sinto-me extraordinariamente feliz pelo facto de que o tradicional juramento dos recrutas precisamente poucos dias depois do início do meu Pontificado me oferece a oportunidade de dirigir a todos vós uma palavra de reconhecimento, de agradecimento e de encorajamento. Neste momento sois meus hóspedes aqui no Palácio Apostólico, o "lugar de serviço" mais importante para a Guarda Suíça! Naturalmente dirijo uma saudação particular aos recrutas, que hoje são incorporados oficialmente no Corpo, e aos seus pais, que vieram até aqui para manifestar a vontade de acompanhar os próprios filhos com o seu amor e com a sua oração. Vós, queridos pais, confiais os vossos filhos e as preocupações das vossas famílias à intercessão dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, assim como à de muitos outros santos. Qualquer verdadeira peregrinação aproxima-nos de Deus, meta da nossa viagem. Desejo de coração a todos vós, nestes dias, um autêntico aprofundamento da vossa fé e da vossa proximidade ao Sucessor de Pedro, o Chefe visível da Igreja universal. Que as celebrações litúrgicas e muitos encontros proveitosos vos ajudem!

Queridos Guardas suíços, o motivo do vosso compromisso pode ter sido diferente para cada um de vós: do prazer pela aventura, passando pela vontade de fazer algo verdadeiramente diferente, até ao nobre desejo de servir a Igreja e o Papa e através dele aprofundar a vossa fé vindo para Roma. Seja qual for a razão da vossa decisão, o importante agora, aqui no Vaticano, é viver o seu espírito, que pode suscitar um verdadeiro vínculo espiritual entre vós. Este espírito da Guarda suíça alimenta-se da gloriosa tradição de quase cinco séculos da vida de um pequeno exército com grandes ideais. Estes ideais, que dão vida a este espírito sem o qual a Guarda Suíça não poderia estar à altura da sua missão tão importante, são os seguintes: firmeza na fé católica, maneira cristã de viver convencido e convincente, fidelidade inabalável e amor profundo à Igreja e ao Vigário de Cristo, consciência e perseverança nas tarefas pequenas e grandes do serviço quotidiano, coragem e humildade, sentido do próximo e humanidade.

Queridos Guardas Suíços, a colaboração que ofereceis ao Sucessor de Pedro, Pastor da Igreja universal, exige a alta profissionalidade dos modernos serviços de segurança, mas, ao mesmo tempo, reveste uma autêntica e significativa dimensão eclesial. Na pessoa do Papa vós servis a Igreja inteira; pondes ao seu serviço o vosso impulso juvenil, a vossa vitalidade e vigor interior. Ao olhar para vós, queridos amigos, volta à minha mente o que disse durante a celebração litúrgica para o início do meu Pontificado: "A Igreja é viva. A Igreja é jovem. Ela tem em si o futuro do mundo e por isso mostra também a cada um de nós o caminho para o futuro". Disto vós, queridos Guardas, podeis e deveis ser exemplo e testemunho vivo. Será este o modo de viver a vocação de cristãos, comprometidos a reflectir no comportamento de cada dia a grandeza da vida nova recebida no Baptismo.

Queridos Guardas Suíços, confio-vos a vós, as vossas famílias, e quantos vieram a Roma por ocasião do juramento, à intercessão da Santa Virgem e Mãe de Deus e aos vossos Padroeiros Martinho e Sebastião, assim como ao grande padroeiro da vossa bela pátria que está no centro da Europa, Irmão Nicolau de Flüe, e concedo-vos a minha Bençao Apostólica.




AOS MEMBROS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DO SRI LANKA POR OCASIÃO DA VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Sábado, 7 de Maio de 2005

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Queridos Irmãos Bispos

1. Nestes primeiros dias do meu Pontificado, é-me grato dar-vos as boas-vindas, Pastores da Igreja que está no Sri Lanka, por ocasião da vossa visita ad limina Apostolorum a primeira que se realiza, depois da minha eleição. Agradeço a D. Joseph Vianney Fernando, Presidente da vossa Conferência Episcopal, as amáveis palavras que me dirigiu em vosso nome. Vós vindes de um Continente particularmente caracterizado por uma riqueza de culturas, línguas e tradições (cf. Ecclesia in Asia ), e dais testemunho da profunda fé do vosso povo em Jesus Cristo, o único Redentor do mundo. Rezo a fim de que a vossa peregrinação aos túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo possa renovar o vosso compromisso em servir e proclamar Cristo com convicção, de tal maneira que o vosso povo cresça no conhecimento e no amor Àquele que veio para que todos "tenham vida, e a tenham em abundância" (
Jn 10,10).

2. Juntamente com as inumeráveis outras pessoas do mundo inteiro, fiquei profundamente preocupado ao observar os efeitos devastadores do tsunami, no passado mês de Dezembro, que só no Sri Lanka ceifou um elevado número de vidas, deixando centenas de milhares de pessoas desabrigadas. Aceitai as minhas profundas condolências, assim como as dos católicos de todas as regiões, por quantos sofreram perdas tão terríveis. No rosto dos despojados e dos deserdados, não podemos deixar de reconhecer o rosto sofredor de Cristo, e é precisamente a Ele que servimos, quando manifestamos o nosso amor e compaixão pelas pessoas em necessidade (cf. Mt 25,40).

A comunidade cristã tem a particular obrigação de cuidar das crianças que perderam os seus pais nesta calamidade natural. O Reino dos Céus pertence aos membros mais vulneráveis da sociedade (cf. Mt 19,14); todavia, muitas vezes eles são simplesmente esquecidos ou vergonhosamente explorados como soldados, trabalhadores ou vítimas inocentes no tráfico de seres humanos. Não se deve poupar qualquer esforço em vista de exortar as autoridades civis e a comunidade internacional a lutar contra tais abusos e a oferecer às crianças a salvaguarda legal que elas justamente merecem.

Até mesmo nos momentos mais obscuros das nossas vidas, sabemos que Deus nunca está ausente. São Paulo recorda-nos que "tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus" (Rm 8,28), e isto manifestou-se na generosidade incondicional da resposta humanitária ao tsunami. Desejo elogiar-vos pela maneira extraordinária com que a Igreja no Sri Lanka se esforçou para ir ao encontro das necessidades materiais, morais, psicológicas e espirituais das pessoas atingidas.

Podemos reconhecer ulteriores sinais da bondade de Deus na união e na colaboração de tão diferentes sectores da sociedade nos esforços assistenciais. Foi encorajador ver membros de diversificadas religiões e grupos étnicos, tanto no Sri Lanka como na comunidade internacional, unirem-se a fim de demonstrar a sua solidariedade para com os aflitos e redescobrir os vínculos fraternos que os vinculam. Estou convicto de que encontrareis modos de continuar a edificar sobre os frutos desta cooperação, assegurando de maneira especial que seja oferecida a assistência gratuita a todas as pessoas em necessidade.

3. A Igreja que está no Sri Lanka é jovem um terço da população do vosso país tem menos de 15 anos de idade e isto representa uma grande esperança para o futuro. Por conseguinte, a educação religiosa nas escolas deve constituir uma das principais prioridades. Independentemente das dificuldades que possais encontrar neste sector, não deixeis de assumir a responsabilidade que vos compete. Também os seminários exigem uma particular atenção da parte dos Bispos (cf. Directório para o Ministério Pastoral dos Bispos, nn. ), e exorto-vos a ser cada vez mais vigilantes, garantindo uma sólida formação espiritual e teológica aos vossos seminaristas. Eles têm a necessidade de ser inspirados no exercício do seu apostolado futuro, de maneira a levar os demais a seguir Cristo quanto mais eles forem santos, alegres e apaixonados no exercício do seu ministério presbiteral, tanto mais ele será fecundo (cf. Carta do Santo Padre João Paulo II aos Sacerdotes, por ocasião da Quinta-Feira Santa de 2005, n. 7). É gratificante saber que o vosso país já tem sido abençoado com um bom número de vocações sacerdotais, e rezo a fim de que muitos outros jovens reconheçam e respondam ao apelo de Deus, a entregarem-se completamente pelo Reino.

4. Para concluir as minhas hodiernas reflexões convosco, apresento-vos a imagem dos discípulos no caminho de Emaús, ainda recentemente evocada pelo meu querido predecessor, para nos orientar neste Ano da Eucaristia. Era o próprio Cristo que os acompanhava na sua caminhada. Ele abriu os seus olhos para a verdade contida nas Escrituras, fomentou a sua esperança e revelou-se-lhes na fracção do pão (cf. Mane nobiscum Domine, 1). Ele acompanha-vos, também a vós, enquanto guiais o vosso povo ao longo da vereda do discipulado. Renovai a vossa confiança nele! Abri-lhe os vossos corações! Implorai com Ele, em união com a Igreja do mundo inteiro: "Mane nobiscum, Domine".

Enquanto vos confio, assim como os vossos sacerdotes, diáconos, religiosos, religiosas e fiéis leigos à intercessão de Maria, Mulher Eucarística, concedo-vos cordialmente a minha Bênção Apostólica como penhor de graça e de fortaleza no seu Filho, nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.




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