Discursos Bento XVI 320

320 Neste contexto, gostaria de mencionar mais uma coisa, que me chamou a atenção e me impressionou por muito tempo. Na última obra, incompleta, de S. Tomás de Aquino, o Compendium Theologiae, que ele tencionava estruturar simplesmente segundo as três virtudes teologias da fé, da esperança e da caridade, o grande Doutor começou a desenvolver parcialmente o capítulo sobre a esperança. Ali ele identifica, por assim dizer, a esperança com a oração: o capítulo sobre a esperança é, ao mesmo tempo, o capítulo sobre a oração. A oração é a esperança em acto. E, efectivamente, na oração descerra-se a verdadeira razão, pelo que nos é possível esperar: nós podemos entrar em contacto com o Senhor do mundo, Ele ouve-nos e nós podemos escutá-lo. Era a isto que aludia Santo Inácio, e que eu queria recordar-vos mais uma vez no dia de hoje: "Ou peismones to ergon, alla megethous estin ho Christianismos" (Rm 3,3) a verdadeira grandeza do Cristianismo, que não dispensa das coisas pequenas e quotidianas, mas que também não deve ser ocultada por estas últimas, é o facto de poder entrar em contacto com Deus.

A segunda coisa, que precisamente nestes dias me voltou à mente, diz respeito à moral. Ouço muitas vezes dizer que hoje existe nas pessoas uma saudade de Deus, de espiritualidade, de religião, e que se recomeça também a ver na Igreja uma possível interlocutora da qual, a este propósito, é possível receber algo (houve um período em que, em última análise, isto era procurado somente nas outras religiões). Aumenta novamente a consciência: a Igreja é uma grande portadora de esperança espiritual; é como uma árvore, em que os passarinhos podem construir o seu ninho, mesmo que depois queiram voltar a voar mas é, precisamente, o lugar onde se pode pousar por um certo tempo. O que, ao contrário, é muito difícil para as pessoas é a moral proclamada pela Igreja.

Reflecti sobre isto reflicto sobre isto há muito tempo e vejo cada vez mais claramente que, nesta nossa época, a moral dividiu-se como que em duas partes. A sociedade moderna não é simplesmente desprovida da moral mas, por assim dizer, "descobriu" e reivindica uma outra parte da moral que, no anúncio da Igreja nas últimas décadas e mesmo além, talvez não tenha sido proposta suficientemente. São os grandes temas da paz, da não-violência, da justiça para todos, da solicitude pelos pobres e do respeito pela criação. Isto tornou-se um conjunto ético que, precisamente como força política, tem um grande poder e constitui para muitos a substituição ou a sucessão da religião. No lugar da religião, que é vista como metafísica e uma coisa do além talvez também como algo individualista sobressaem os temas morais, como o essencial que depois confere dignidade ao homem e que o compromete. E este é um aspecto, ou seja, o facto de que esta moralidade existe e fascina também os jovens, que se comprometem pela paz, pela não-violência, pela justiça, pelos pobres e pela criação. E trata-se verdadeiramente de grandes temas morais, que de resto pertencem também à tradição da Igreja. Os meios que se oferecem para a sua solução são, além disso, frequentemente muito unilaterais e nem sempre credíveis, mas agora não nos devemos deter nisto. Os grandes temas estão presentes.

A outra parte da moral, que não raro é interpretada de forma muito controversa pela política, diz respeito à vida. Dela faz parte o compromisso em favor da vida, desde a concepção até à morte, ou seja, a sua salvaguarda contra o aborto, contra a eutanásia, contra a manipulação e contra a autolegitimação do homem a dispor da sua própria vida. Com frequência, procura-se justificar estas intervenções com as finalidades aparentemente grandes, de poder assim ser útil para as gerações futuras, e deste modo até parece algo moral inclusive o facto de o homem tomar nas suas mãos a própria vida e manipulá-la. Mas, por outro lado, existe também a consciência de que a vida humana é um dom que exige o nosso respeito e o nosso amor, desde o primeiro até ao último momento, também para os sofredores, os portadores de deficiência e os indivíduos mais frágeis.

Além disso, é neste contexto que se insere inclusive a moral do matrimónio e da família. O matrimónio está a ser, por assim dizer, cada vez mais marginalizado. Conhecemos o exemplo de alguns países, onde foi realizada uma modificação legislativa segundo a qual agora o matrimónio já não é definido como vínculo entre um homem e uma mulher, mas como um laço entre pessoas; naturalmente, com isto é aniquilada a ideia fundamental e, a partir das suas raízes, a sociedade torna-se algo totalmente diferente. A consciência de que a sexualidade, o eros e o matrimónio como a união entre um homem e uma mulher caminham juntos "Os dois serão uma só carne", afirma o Génesis é uma consciência que se atenua cada vez mais; cada género de vínculo parece absolutamente normal e tudo é apresentado como uma espécie de moralidade da não-discriminação e uma forma de liberdade devida ao homem. Assim, naturalmente, a indissolubilidade do matrimónio tornou-se uma ideia quase utópica que, precisamente também para muitas pessoas da vida pública, parece desmentida. Deste modo, inclusive a família dissolve-se progresssivamente.

Sem dúvida, para o problema da impressionante diminuição da taxa de natalidade existem múltiplas explicações, mas nisto desempenha seguramente um papel determinante também o facto de que o ser humano deseja ter a vida para si mesmo, que ele confia pouco no futuro e que, precisamente, considera quase já irrrealizável a família como comunidade duradoura, em que assim podem crescer as futuras gerações.

Por conseguinte, neste âmbito o nosso anúncio embate-se com uma consciência contrária da sociedade, por assim dizer, com uma espécie de antimoralidade que se alicerça numa concepção da liberdade vista como faculdade de escolher autonomamente sem orientações predefinidas, como não-discriminação, portanto como aprovação de todos os tipos de possibilidade, colocando-se assim de forma autónoma como eticamente correcto. Mas a outra consciência não desapareceu.

Ela existe, e penso que nós devemos comprometer-nos para voltar a unir estas duas partes da moralidade e tornar evidente que elas devem estar inseparavelmente unidas entre si. Somente se se respeita a vida humana, desde a concepção até à morte, também a ética da paz é possível e credível; somente então a não-violência pode expressar-se em todas as direcções, só assim acolhemos verdadeiramente a criação e somente então é possível alcançar a justiça autêntica.

Penso que nisto temos uma grande tarefa à nossa frente: por um lado, fazer com que o cristianismo não pareça um simples moralismo, mas uma dádiva em que nos é concedido o amor que nos sustém e depois nos oferece a força necessária para sabermos "perder a nossa própria vida"; por outro, neste contexto de amor entregue, progredir também em vista de concretizações, pelas quais o fundamento nos é sempre oferecido pelo Decálogo que, juntamente com Cristo e com a Igreja, temos o dever de ler nesta época de modo progressivo e renovado.

Portanto, estes eram os temas que eu julgava que ainda devia e podia acrescentar. Estou-vos grato pela vossa indulgência e paciência. Esperemos que o Senhor ajude todos nós ao longo do nosso caminho!




AOS BISPOS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL DA REPÚBLICA FEDERAL DA ALEMANHA EM VISITA «AD LIMINA APOSTOLORUM» Sexta-feira, 10 de Novembro de 2006

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Senhores Cardeais!
Queridos Irmãos no Episcopado!

Sede bem-vindos à casa do Sucessor de Pedro! Na alegria da fé, cujo anúncio é o nosso serviço comum de Pastores, dou-vos as boas-vindas a este encontro com o primeiro grupo de Bispos alemães por ocasião da visita ad Limina.Depois das minhas visitas na Alemanha para a Jornada Mundial da Juventude em 2005 e, mais recentemente, em Setembro, durante as quais pude, pelo menos em breve, encontrar-me com muitos de vós, sinto-me feliz por vos receber aqui para lançar juntos um olhar sobre a situação da Igreja no nosso País. Sem dúvida, não é preciso que eu o diga expressamente: preocupo-me com os católicos nas Dioceses alemãs e em geral com todos os cristãos no nosso País. Rezo todos os dias para que Deus abençoe o povo alemão e todas as pessoas que vivem na nossa Pátria. Possa o grande amor de Deus tocar e transformar o coração de todos! Estou grato por poder, através do diálogo com cada um de vós, não só aprofundar a nossa amizade e o nosso vínculo pessoal, mas também aprender muito sobre a situação nas vossas Dioceses. Nos dois discursos, com os quais concluimos os encontros pessoais, gostaria de ressaltar alguns aspectos da vida eclesial que, neste momento da nossa história, me preocupam de modo particular.

A República Federal da Alemanha partilha com todo o mundo ocidental uma cultura caracterizada pela secularização, na qual Deus desaparece cada vez mais da consciência pública, na qual a unicidade da figura de Cristo se apaga e na qual os valores formados pela tradição da Igreja perdem cada vez mais a sua eficiência. Assim, também para o indivíduo a fé se torna sempre mais difícil; com maior frequência os projectos de vida e o modo de viver são determinados pelo gosto pessoal. É esta a situação que os Pastores da Igreja e os fiéis devem enfrentar. Portanto, não poucos se deixaram invadir pelo desencorajamento e pela resignação, atitudes que impedem o testemunho do Evangelho libertador e salvífico de Cristo. No fundo, não é porventura também o cristianismo uma das muitas outras propostas destinadas a dar um sentido à vida? É uma pergunta que muitos fazem. Mas, ao mesmo tempo, face à fragilidade e à breve duração da maior parte destas propostas, perguntando e esperando, muitos olham para a mensagem cristã e esperam de nós respostas convincentes.

Penso que a Igreja na Alemanha deve considerar a situação agora mencionada como um desafio providencial e enfrentá-la com coragem. Nós, cristãos, não devemos temer o confronto espiritual com uma sociedade que por trás da sua ostentada superioridade intelectual esconde a perplexidade face às perguntas existenciais últimas. As respostas que a Igreja tira do Evangelho do Logos feito homem na verdade demonstraram-se válidas em relação ao pensamento dos dois últimos milénios; têm um valor duradouro. Fortalecidos por esta certeza, podemos responder a quantos nos perguntam a razão da nossa esperança (cf.
1P 3,15). Isto é válido também para as nossas relações com os fiéis das outras religiões, sobretudo com os numerosos muçulmanos que vivem na Alemanha, e dos quais vamos ao encontro com respeito e benevolência. Precisamente eles, que observam as suas convicções e os seus ritos religiosos com frequência com grande seriedade, têm o direito de receber o nosso testemunho humilde e firme em favor de Jesus Cristo. Mas para poder dar testemunho com uma força persuasiva, é necessário um compromisso sério. Por isso, nos lugares em que a população muçulmana é numerosa, deveriam estar disponíveis interlocutores católicos com conhecimentos adequados quer linguísticos quer da história das religiões, que os tornem capazes de dialogar com os muçulmanos. Este diálogo, contudo, pressupõe antes de tudo um sólido conhecimento da própria fé católica.

Com isto chega-se a outro tema muito central: o do ensino da religião, das escolas católicas e da formação católica dos adultos. Este âmbito exige uma nova e particular atenção da parte dos Bispos. Antes de tudo, é necessário preocupar-se com os programas de estudo para o ensino da religião, que devem ser inspirados no Catecismo da Igreja Católica, para que durante os estudos seja transmitida a totalidade da fé e dos costumes da Igreja. No passado, não raramente o conteúdo da catequese era colocado em segundo plano em relação aos métodos didácticos. A apresentação integral e compreensível dos conteúdos da fé é um aspecto decisivo para a aprovação dos livros de texto para o ensino da religião. De igual importância é também a fidelidade de quem ensina a fé da Igreja e a sua participação na vida litúrgica e pastoral das paróquias ou das comunidades eclesiais em cujo território desempenham o seu trabalho. Nas escolas católicas, além disso, é importante que a introdução na visão católica do mundo e na prática da fé, assim como a integral formação católica da personalidade, sejam transmitidas de modo convincente não só durante a hora de religião, mas durante todo o dia escolar inclusive através do testemunho pessoal dos professores. Igual importância deve ser concedida às numerosas instituições e actividades no âmbito da formação dos adultos. É preciso neste aspecto dedicar uma atenção particular à escolha dos temas e dos formadores para que, em favor de questões superficialmente actuais ou problemas marginais, não sejam descuidados os conteúdos centrais da fé e da orientação cristã da vida.

A transmissão completa e fiel da fé na escola e na formação dos adultos depende, por sua vez, de modo determinante da formação dos candidatos ao sacerdócio e dos professores de religião nas Faculdades teológicas e nas universidades. Nunca se realçará o suficiente que a fidelidade ao Depositum fidei, do modo como é apresentado pelo magistério da Igreja, é por excelência o pressuposto para uma séria pesquisa e um ensino sério. Esta fidelidade é também uma exigência da honestidade intelectual para quem desempenha uma tarefa de ensino académico por encargo da Igreja. Os Bispos têm o dever, em relação a isto, de dar o seu "nihil obstat" como máximos Responsáveis unicamente depois de um exame consciencioso. Só uma Faculdade teológica que se sente obrigada a respeitar este princípio poderá ser capaz de dar uma contribuição autêntica ao intercâmbio espiritual no âmbito da universidade.

Venerados Irmãos, permiti-me falar também da formação dos Seminários maiores. Em relação a isto, o Concílio Vaticano II, no seu decreto Opatam totius, estabeleceu normas importantes que, infelizmente, ainda não foram plenamente postas em prática. Isto é válido em particular para a instituição do chamado curso introdutivo antes do início real e concreto dos estudos. Isto não deveria apenas transmitir um sólido conhecimento das línguas clássicas, que é necessário exigir concretamente para o estudo da filosofia, mas também a familiaridade com o catecismo, com a prática religiosa, litúrgica e sacramental da Igreja. Face ao crescente número de pessoas interessadas e de candidatos que já não provêm de uma formação católica tradicional, é urgentemente necessário um ano introdutivo. Além disso, durante esse ano o estudante pode alcançar uma clareza maior sobre a sua vocação ao sacerdócio. Por outro lado, as pessoas responsáveis pela formação sacerdotal têm a possibilidade de formar uma opinião do candidato, da sua maturidade humana e da sua vida de fé. Os chamados jogos das partes com uma dinâmica de grupo, os grupos de autoconsciência e outras experiências psicológicas são ao contrário menos adoptados para esta finalidade e podem até criar confusão e incerteza.

Neste contexto mais amplo, desejo recomendar-vos, queridos Irmãos no Episcopado, de modo particular a Universidade católica de Eischstätt-Ingolstadt. Com ela, a Alemanha católica dispõe de um lugar excelente para um confronto de alto nível académico à luz da fé católica com as correntes espirituais e com os problemas, e para a formação de uma elite espiritual que possa enfrentar os desafios do presente e do futuro no espírito do Evangelho. A consolidação económica da única Universidade católica na Alemanha deveria ser reconhecida como compromisso comum de todas as Dioceses alemãs, porque no futuro os encargos com ela relacionados não poderão continuar a ser assumidos apenas pelas Dioceses bávaras que, contudo, continuam a ter uma particular responsabilidade por esta Universidade.

Por fim, desejo falar ainda sobre um problema tão urgente quanto cheio de emotividade: a relação entre sacerdotes e leigos no cumprimento da missão da Igreja. Quanto seja importante a colaboração activa dos leigos para a vida da Igreja, descobrimo-lo cada vez mais na nossa cultura secular. Desejo agradecer de coração a todos os leigos que, em virtude da força do baptismo, apoiam a Igreja de maneira viva. Precisamente porque o testemunho activo dos leigos é tão importante, é de igual modo importante que os perfis específicos das diversas missões não sejam confundidos. A homilia durante a Santa Missa é uma tarefa ligada ao ministério ordenado; quando está presente um número suficiente de sacerdotes e de diáconos, compete a eles a distribuição da Sagrada Comunhão. Além disso, continua a ser feito o pedido para que os leigos possam desempenhar funções de guias pastorais.

Em relação a isto, não podemos debater as questões que com isto estão relacionadas só à luz da convivência pastoral, porque este aspecto se refere à verdade da fé, ao que significa, à estrutura sacramental-hierárquica querida por Jesus Cristo para a sua Igreja. Dado que ela se funda na Sua vontade assim como a delegação apostólica se baseia no Seu mandamento, elas estão subtraídas à intervenção humana. Só o sacramento da Ordenação autoriza quem o recebe a falar e a agir in persona Christi. É isto, queridos Irmãos, que é preciso inculcar sempre de novo com grande paciência e sabedoria, tirando depois as necessárias consequências.

322 Queridos Irmãos no Episcopado! A Igreja na Alemanha possui profundas raízes espirituais e meios excepcionais para a promoção da fé e para o apoio às pessoas necessitadas no próprio País e no estrangeiro. O número dos fiéis comprometidos e também a qualidade das suas obras para o bem da Igreja e da sociedade são deveras notáveis. Para a realização da missão da Igreja serve também a colaboração geralmente boa entre o Estado e a Igreja para o bem das pessoas na Alemanha.

Para poder enfrentar de modo adequado os desafios devidos ao processo persistente de secularização, do qual se falou no inicio, a Igreja na Alemanha deve sobretudo tornar de novo visíveis a força e a beleza da fé católica: para o poder fazer, deve crescer na comunhão com Cristo.

A unidade dos Bispos, do seu clero e dos leigos entre si e também com a Igreja universal, especialmente com o Sucessor de Pedro, é nisto de importância fundamental. A poderosa intercessão de Maria, Virgem e Mãe de Deus, que na nossa Pátria alemã possui muitos santuários maravilhosos, assim como a intercessão de São Bonifácio e de todos os santos do nosso Pais, possam obter para vós e para todos os fiéis a força e a perseverança para prosseguir com coragem e confiança a grande obra de uma renovação autentica da vida de fé em fiel adesão às indicações da Igreja universal! A todos vós, nas tarefas do vosso serviço de Pastores, como para todos os fiéis na Alemanha concedo de coração a Bênção Apostólica.




À "FUNDAÇÃO SAGRADA FAMÍLIA DE NAZARÉ" E A ASSOCIAÇÃO LAICAL "COMUNIDADE DOMENICO TARDINI" Sábado, 11 de Novembro de 2006


Senhor Cardeal
Venerados Irmãos no Episcopado
Amados irmãos e irmãs

É com alegria que hoje me encontro no meio de vós, para celebrar o 60º aniversário da origem da Instituição, nascida da sábia intuição do então Mons. Domenico Tardini, sucessivamente orientada pelo saudoso Cardeal António Samoré, e pelo nosso Cardeal Silvestrini, com a contribuição de amigos do mundo da escola, da cultura e do trabalho, e de benfeitores tanto italianos como americanos. Saúdo com carinho todos vós, estudantes, ex-alunos, amigos e todas as vossas famílias, enquanto vos agradeço a calorosa hospitalidade. Saúdo de modo particular o Cardeal Achille Silvestrini, Presidente da "Fundação Sagrada Família de Nazaré", e estou-lhe reconhecido pelas palavras com que me apresentou esta obra educativa e eclesial, à qual dedica tanta compreensão e amor. Saúdo a Vice-Presidente, Professora Ângela Groppelli, psicóloga, que se prodigaliza há mais de cinquenta anos em benefício da Vila Nazaré, e o Arcebispo D. Cláudio Maria Celli, juntamente com os Bispos e os sacerdotes que nela infundiram ou estão a incutir os dons da vida espiritual, os membros do Conselho da Fundação e da Associação laical "Comunidade Domenico Tardini", com o Vice-Presidente Pier Silvério Pozzi e todos os associados.

A Vila Nazaré é uma realidade rica, que continua a desenvolver-se graças ao compromisso dos estudantes no período de formação, e também graças à inserção profissional e às nvas famílias que nascem. É toda esta grande família que desejo saudar, com especial carinho paterno.

A Vila Nazaré, que ao longo dos últimos sessenta anos acolheu diversas gerações de adolescentes e de jovens, propõe-se valorizar a inteligência dos seus alunos, no respeito pela liberdade da pessoa, orientada a entrever no serviço aos outros a autêntica expressão do amor cristão. A Vila Nazaré deseja formar os seus jovens na coragem das decisões, numa atitude de abertura ao diálogo, com referência à razão purificada no cadinho da fé. Efectivamente, a fé é capaz de oferecer perspectivas de esperança a todos os projectos que tenham a peito o destino do homem. A fé perscruta o invisível e, por isso mesmo, é amiga da razão que levanta as interrogações essenciais de onde o nosso caminho sobre a terra espera haurir um sentido.

A este propósito, segunda a narração de Lucas nos Actos dos Apóstolos, pode ser iluminadora a pergunta que o diácono Filipe apresenta ao Etíope com quem se encontra ao longo do caminho de Jerusalém para Gaza: "Compreendes, verdadeiramente, o que estás a ler?" (8, 30). O Etíope responde: "E como poderei compreender, sem alguém que me oriente?" (8, 31). Então, Filipe fala-nos de Cristo. Assim, o Etíope descobre a resposta às suas próprias interrogações na pessoa de Cristo, anunciado com palavras veladas pelo profeta Isaías. Por conseguinte, é importante que alguém chegue ao lado daquele que está a caminho e que lhe anuncie "a boa nova de Jesus", como fez Filipe. Aqui delineia-se a "diaconia" que a cultura cristã pode desempenhar, ajudando as pessoas que estão em busca a descobrirem Aquele que se encontra escondido nas páginas da Bíblia, como nas vicissitudes da vida de cada um. Todavia, não se pode esquecer que o Senhor se considera saciado, dessedentado, hospedado, vestido e visitado em cada pessoa necessitada (cf. Mt 25,31-46). Portanto, Ele está também "escondido" em tais pessoas e acontecimentos.

323 Queridos amigos, bem sei que vós estais habituados a reflectir sobre estes e outros textos semelhantes da Bíblia. Trata-se de palavras que vos acompanham nos vossos dias. Unindo entre si estas imagens e estas admoestações, vós podeis compreender claramente como a verdade e o amor são inseparáveis. Nenhuma cultura pode sentir-se feliz consigo mesma, enquanto não descobrir que deve estar atenta às necessidades concretas e profundas do homem, de cada homem.

Na Vila Nazaré podeis experimentar como a palavra de Deus exige uma escuta atenta e um coração generoso e maduro para ser vivida em plenitude. Os conteúdos da revelação de Jesus são concretos, e um intelectual cristãmente inspirado deve estar sempre pronto a comunicá-los, quando dialoga com aqueles que estão em busca de soluções capazes de melhorar a existência e de responder à inquietude que angustia todos os corações humanos. É necessário demonstrar sobretudo a profunda correspondência que existe entre as instâncias que sobressaem da reflexão sobre as vicissitudes humanas e o Logos divino, que "se fez carne" e veio "habitar no meio de nós" (cf.
Jn 1,14). Desta maneira, cria-se uma convergência fecunda entre os postulados da razão e as respostas da Revelação, e precisamente daqui brota uma luz que ilumina o caminho sobre o qual orientar o próprio compromisso.

É mediante o contacto quotidiano com a Escritura e com os ensinamentos da Igreja que se desenvolve o vosso amadurecimento nos planos humano, profissional e espiritual, e assim podeis entrar cada vez mais no mistério daquela Razão criadora, que continua a amar o mundo e a dialogar com a liberdade das criaturas. Um intelectual cristão e sem dúvida é isto que querem ser quantos saem da Vila Nazaré deve cultivar sempre em si a admiração por esta verdade fundamental. Isto facilita a adesão dócil ao Espírito de Deus e, ao mesmo tempo, impele a servir os irmãos com pronta disponibilidade.

Vós podeis haurir o "estilo" do vosso compromisso de uma palavra de São Paulo à comunidade cristã que vivia em Filipos: "De resto, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é nobre, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que possa ser virtude e mereça louvor, tende tudo isto em mente" (Ph 4,8). É precisamente nesta perspectiva que vós podeis estabelecer um diálogo fecundo com a cultura, e oferecer assim a vossa contribuição para fazer com que numerosas pessoas encontrem a resposta em Jesus Cristo. Senti-vos, também vós, impelidos pelo Espírito de Jesus, como aconteceu com o diácono Filipe, que ouviu dizer: "Põe-te a caminho e dirige-te para o Sul, pela estrada que desce de Jerusalém para Gaza, a qual se encontra deserta" (Ac 8,26).

Queridos jovens, também hoje não são poucas as estradas desertas, ao longo das quais devereis caminhar na vossa existência de crentes: exactamente ao longo delas podereis acompanhar aqueles que estão em busca do sentido da vida. Preparai-vos para estar, também vós, ao serviço de uma cultura que favoreça o encontro de fraternidade do homem com o homem, assim como a descoberta da salvação que nos provém de Cristo.

Estimados irmãos e irmãs, desde o seu início a Vila Nazaré foi sempre objecto de especial benevolência por parte dos meus venerados Predecessores: do Servo de Deus Pio XII, que a viu nascer, ao Servo de Deus João Paulo II, que foi visitar-vos há dez anos, por ocasião do 50º aniversário de fundação. Esta benevolência dos Papas alimentou e deve continuar a alimentar a vossa união espiritual com a Santa Sé. Ao mesmo tempo, este vínculo de estima e de carinho compromete-vos a seguir fielmente o caminho daquele grande "homem de Deus", que foi o Cardeal Domenico Tardini. Com as suas palavras e o seu exemplo, ele exorta-vos a ser particularmente sensíveis, atentos e receptivos em relação aos ensinamentos da Igreja. Com estes sentimentos, enquanto invoco sobre vós a especial protecção de Nossa Senhora, "Mater Ecclesiae", asseguro para cada um de vós a minha lembrança na oração, e com afecto abençoo todos, a começar pelos vossos filhos.




AO SENHOR KAGEFUMI UENO NOVO EMBAIXADOR DO JAPÃO JUNTO DA SANTA SÉ Segunda-feira, 13 de Novembro de 2006


Senhor Embaixador!

É com prazer que recebo Vossa Excelência nesta circunstância solene da apresentação das Cartas que o acreditam como Embaixador extraordinário e plenipotenciário do Japão junto da Santa Sé.

Sensibilizaram-me as palavras que me dirigiu, assim como as saudações que me transmitiu da parte de Sua Majestade o Imperador Akihito. Ficar-lhe-ia grato se se dignasse expressar-lhe em retribuição os meus melhores votos pela sua pessoa assim como pela família imperial. Alegrando-me sentidamente pelas relações de respeito e de estima que o Japão mantém com a Santa Sé, saúdo cordialmente o povo Japonês, desejando que prossiga o seu desenvolvimento humano e espiritual, procurando incansavelmente promover a paz e a solidariedade entre os povos.

Senhor Embaixador, como Vossa Excelência realçou, as ricas tradições culturais e espirituais do seu país contribuíram para a expansão dos valores humanos fundamentais. O reconhecimento da dimensão espiritual da sociedade, suscitando um autêntico diálogo entre as religiões e entre as culturas, favorecem um caminho comum fraterno e solidário, o único que permite o desenvolvimento integral do homem. De facto, as colaborações inter-religiosas e interculturais têm numerosos campos de acção possíveis, sobretudo nos âmbitos do compromisso em favor de uma sociedade justa, da paz mundial e da luta contra a pobreza, numa solidariedade crescente.

324 Mais do que nunca, a busca da paz entre as nações deve ser uma prioridade nas relações internacionais. As crises que o mundo vive não podem encontrar soluções definitivas mediante a violência; ao contrário, elas só se resolverão com meios pacíficos no respeito pelos compromissos assumidos. Como sabemos, e a experiência não cessa de o demonstrar, a violência nunca pode ser uma resposta justa aos problemas das sociedades, porque destrói a dignidade, a vida e a liberdade do homem, que pretende defender. Para construir a paz, os caminhos de ordem cultural, política e económica são importantes. "Mas, em primeiro lugar, a paz deve ser construída nos corações. De facto, é neles que se desenvolvem sentimentos que podem alimentá-la ou, ao contrário, ameaçá-la, enfraquecê-la, sufocá-la" (Mensagem para o XX aniversário do encontro inter-religioso em Assis, 2 de Setembro de 2006). Alegrando-me pelos passos dados, convido o seu país a prosseguir resolutamente os seus esforços a fim de contribuir para o restabelecimento de uma paz justa e estável no mundo, sobretudo no Extremo Oriente. Na crise que esta região actualmente conhece, a Santa Sé encoraja as negociações bilaterais e multilaterais, convicta de que a solução deve ser procurada através de meios pacíficos e no respeito pelos compromissos assumidos por todas as partes em causa, para alcançar a desnuclearização da península coreana.

Nesta mesma perspectiva, desejo vivamente que a comunidade internacional prossiga e intensifique a sua ajuda humanitária às populações mais vulneráveis, sobretudo na Coreia do Norte, a fim de que a sua eventual interrupção não cause graves consequências aos civis.

Por outro lado, Senhor Embaixador, congratulo-me pela generosa contribuição dada pelo seu país à assistência aos países mais pobres. De facto, é necessário que os vínculos de interdependência entre os povos, que se desenvolvem cada vez mais, sejam acompanhados por um compromisso intenso para que as consequências nefastas das grandes desigualdades que persistem entre os países desenvolvidos e os países em vias de desenvolvimento não se agravem, estimulando o crescimento económico e social dos países mais pobres.

Alegro-me pelo respeito do qual a Igreja católica goza no Japão. Por seu intermédio, Senhor Embaixador, gostaria de saudar calorosamente os Bispos e todos os Diocesanos, encorajando-os a viver cada vez mais firmemente na comunhão da fé e a prosseguir o seu compromisso em favor da paz e da reconciliação entre os povos da região, numa colaboração generosa com todos os seus compatriotas.

No momento em que começa a sua missão junto da Sé Apostólica, apresento-lhe os meus melhores votos pelo seu cumprimento. Desejo garantir-lhe que encontrará sempre o apoio cordial e atento dos meus colaboradores.

Sobre Sua Majestade o Imperador Akihito e sobre a família imperial, sobre o povo japonês e seus dirigentes, assim como sobre Vossa Excelência, seus colaboradores e família, invoco de coração a abundância das Bênçãos divinas.




AOS PARTICIPANTES NA SESSÃO PLENÁRIA DO PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A PROMOÇÃO DA UNIDADE DOS CRISTÃOS Sexta-feira, 17 de Novembro de 2006


Senhor Cardeal
Venerados Irmãos
no Episcopado e no Sacerdócio
Estimados Irmãos e Irmãs

325 "Graça e paz vos sejam dadas da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo" (Rm 1,7). É com estes bons votos de São Paulo aos Romanos que me dirijo a vós, que dedicais a vossa inteligência, o vosso amor e o vosso zelo à promoção da plena comunhão de todos os cristãos, em conformidade com a vontade do próprio Senhor, que rezou por esta unidade nas vésperas da sua paixão, morte e ressurreição. Agradeço em primeiro lugar ao vosso Presidente, Senhor Cardeal Walter Kasper, a sua saudação e o denso resumo do trabalho da vossa Sessão Plenária, e estou grato a todos vós que trouxestes a este encontro a vossa experiência e a vossa esperança, comprometendo-vos na busca de respostas adequadas para uma situação que está a mudar. É precisamente nisto que se concentra o tema que escolhestes e estudastes: "A situação ecuménica em mudança". Estamos a viver hoje um período de grandes transformações em quase todos os sectores da vida; portanto, não nos podemos admirar se isto incide também sobre a vida da Igreja e sobre os relacionamentos entre os cristãos.

Todavia, é necessário reconhecer desde o princípio que, apesar da presença de mudanças de situações, de sensibilidades e de problemáticas, contudo a finalidade do movimento ecuménico permanece imutável: a unidade visível da Igreja. Como se sabe, o Concílio Vaticano II considerou como uma das suas principais intenções o restabelecimento da plena unidade entre todos os cristãos (cf. Unitatis redintegratio UR 1). Também eu tenho esta intenção. É de bom grado que aproveito esta oportunidade para reiterar e confirmar, com renovada convicção, aquilo que já afirmei no início do meu ministério sobre a Cátedra de Pedro: "O seu [de Pedro] sucessor actual disse então assume como compromisso prioritário, o de trabalhar sem poupar energias pela reconstituição da unidade plena e visível de todos os seguidores de Cristo. Esta é a sua ambição, este é o seu dever urgente". Sucessivamente, acrescentei: "O actual sucessor de Pedro deixa-se interpelar pessoalmente por esta interrogação e está disposto a fazer tudo o que puder para promover a causa fundamental do ecumenismo" (Insegnamenti, vol. I, 2005, pág. 11).

Na verdade, desde o Concílio Vaticano II até hoje deram-se muitos passos rumo à plena comunhão. Tenho diante dos meus olhos a imagem da Sala do Concílio, onde os Observadores delegados das outras Igrejas e Comunidades eclesiais estavam atentos, mas silenciosos. Nas décadas sucessivas, esta imagem cedeu lugar à realidade de uma Igreja em diálogo com todas as Igrejas e Comunidades eclesiais do Oriente e do Ocidente. O silêncio transformou-se em palavras de comunhão. Um trabalho enorme realizou-se tanto a nível universal como local. A fraternidade entre todos os cristãos foi redescoberta e restabelecida como condição de diálogo, de cooperação, de oração comum e de solidariedade. É quanto o meu Predecessor Papa João Paulo II, de feliz memória, pôs em evidência na Carta Encíclica sobre o compromisso ecuménico onde, entre outras coisas, afirmou de maneira explícita que o "fruto precioso das relações entre os cristãos e do diálogo teológico que eles realizam, é o crescimento da comunhão. De facto, tais iniciativas tornaram os cristãos conscientes dos elementos de fé que têm em comum" (Ut unum sint UUS 49). Esta Encíclica ressaltava os frutos positivos das realizações ecuménicas entre os cristãos, tanto do Oriente como do Ocidente. Como posso deixar de recordar, neste contexto, a experiência de comunhão vivida com os representantes das outras Igrejas e Comunidades eclesiais, provenientes de todos os continentes para participar no funeral do inesquecível Papa João Paulo II e também na inauguração do meu Pontificado? A partilha da dor e da alegria é um sinal visível da nova situação criada entre os cristãos. Por isso, bendito seja Deus! Também a minha iminente visita a Sua Santidade Bartolomeu I e ao Patriarcado Ecuménico constituirá mais um sinal de consideração para as Igrejas ortodoxas, e agirá como um estímulo esta é a nossa esperança para apressar o passo rumo ao restabelecimento da plena comunhão.

Todavia, na realidade temos que reconhecer que ainda há um longo caminho a percorrer. Sob muitos aspectos, a situação mudou desde o Concílio Vaticano II, e o Card. Kasper descreveu-nos tais mudanças em grandes linhas. As rápidas transformações no mundo tiveram as suas repercussões também sobre o ecumenismo. Na época do Concílio, muitas das veneradas Igrejas do Oriente viviam em condições de opressão, perpetrada por regimes ditatoriais. Hoje, elas recuperaram a liberdade e estão comprometidas num vasto processo de reorganização e de revitalização. Estamos próximos delas através dos nossos sentimentos e da nossa oração. A parte oriental e a parte ocidental da Europa estão a aproximar-se; isto estimula as Igrejas a coordenarem os seus esforços relativos à salvaguarda da tradição cristã e do anúncio do Evangelho às novas gerações. Tal colaboração torna-se particularmente urgente em virtude da situação de avançada secularização, sobretudo do mundo ocidental. Felizmente, depois de um período de diversificadas dificuldades, o diálogo teológico entre a Igreja católica e as Igrejas ortodoxas adquiriu um renovado impulso. A Comissão mista internacional de diálogo pôde encontrar-se positivamente em Belgrado, onde foi hospedada com generosidade pela Igreja ortodoxa da Sérvia. Nutrimos grande esperança pelo caminho futuro, que será percorrido no respeito pelas legítimas variedades teológicas, litúrgicas e disciplinares, em vista de alcançar uma comunhão cada vez mais completa, de fé e de amor, em que seja possível um intercâmbio cada vez mais profundo entre as riquezas espirituais de todas as Igrejas.

Também com as Comunidades eclesiais do Ocidente mantemos vários diálogos bilaterais, abertos e amistosos, que denotam progressos no conhecimento recíproco, na superação de preconceitos, na confirmação de algumas convergências e na própria identificação mais específica das autênticas divergências. Gostaria de mencionar, sobretudo, a "Declaração conjunta sobre a doutrina da justificação", alcançada no diálogo com a Federação Luterana Mundial, e o facto de que a esta Declaração o Conselho Metodista Mundial por sua vez deu o próprio consentimento. Entretanto, surgiram várias importantes problemáticas, que exigem um aprofundamento e um acordo. Subsiste, acima de tudo, a dificuldade de encontrar uma concepção comum sobre a relação entre o Evangelho e a Igreja e, a este propósito, sobre o mistério da Igreja e da sua unidade, assim como sobre a questão do ministério da Igreja. Sucessivamente, manifestaram-se outras dificuldades no campo ético, com a consequência que as diferentes posições assumidas pelas Confissões cristãs, sobre as correntes problemáticas, reduziram a sua incidência orientativa diante da opinião pública. Precisamente deste ponto de vista, é necessário um aprofundado diálogo sobre a antropologia cristã, mas também acerca da interpretação do Evangelho e da sua aplicação concreta.

De qualquer maneira, o que deve ser promovido prioritariamente é o ecumenismo do amor, que deriva de forma directa do novo mandamento legado por Jesus aos seus discípulos. Acompanhado por gestos coerentes, o amor suscita a confiança, fazendo abrir os corações e os olhos. Por sua própria natureza, o diálogo da caridade promove e ilumina o diálogo da verdade: com efeito, é na verdade completa que se realizará o encontro definitivo, ao qual conduz o Espírito de Cristo. Sem dúvida, não é o relativismo ou o fácil e falso irenismo que resolve a investigação ecuménica. Pelo contrário, eles deturpam-na e desorientam-na. Além disso, é preciso intensificar a formação ecuménica, partindo dos fundamentos da fé cristã, ou seja, do anúncio do amor de Deus, que se revelou no rosto de Jesus Cristo e, contemporaneamente, em Cristo também desvelou o homem ao próprio homem, levando-o a compreender a sua excelsa vocação (cf. Gaudium et spes GS 22). Estas duas dimensões essenciais são sustentadas pela colaboração concreta entre os cristãos, que "exprime vivamente aquela união que já existe entre eles, e põe em luz mais plena a face de Jesus Cristo [servo]" (Unitatis redintegratio UR 12).

Para concluir estas minhas palavras, desejo confirmar a importância totalmente especial do ecumenismo espiritual. Portanto, justamente o Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos compromete-se em tal ecumenismo, alicerçando-se na oração, na caridade e na conversão do coração, tendo em vista uma renovação pessoal e comunitária. Exorto-vos a continuar ao longo deste caminho, que já deu numerosos frutos e há-de dar ainda mais. Quanto a mim, asseguro-vos a assistência das minhas orações enquanto, como penhor da minha confiança e do meu carinho, a todos concedo uma especial Bênção Apostólica.





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