Discursos Bento XVI 30521

À PRIMEIRA ASSEMBLEIA PLENÁRIA DO PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A PROMOÇÃO DA NOVA EVANGELIZAÇÃO Segunda-feira, 30 de Maio de 2011

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Sala Clementina


Senhores Cardeais
Venerados irmãos no Episcopado e no Sacerdócio
Queridos Irmãos e Irmãs!

Quando no dia 28 de Junho do ano passado, nas Primeiras Vésperas da Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, anunciei que queria instituir um Dicastério para a promoção da nova evangelização, eu dava uma saída concreta à reflexão que tinha feito há muito tempo sobre a necessidade de oferecer uma resposta particular ao momento de crise da vida cristã, que se está a verificar em tantos países, sobretudo de antiga tradição cristã. Hoje, com este encontro, posso constatar com prazer que o novo Pontifício Conselho se tornou uma realidade. Agradeço a D. Salvatore Fisichella as palavras que me dirigiu, introduzindo-me nos trabalhos da vossa primeira Plenária. Uma saudação cordial a todos vós, com o encorajamento pela contribuição que dareis ao trabalho do novo Conselho, sobretudo em vista da XIII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos que, em Outubro de 2012, enfrentará precisamente o tema Nova Evangelização e transmissão da fé cristã.

A expressão «nova evangelização» recorda a exigência de uma renovada modalidade de anúncio, sobretudo para quantos vivem num contexto como o actual, no qual o andamento da secularização deixou pesados vestígios também em países de tradição cristã. O Evangelho é o anúncio sempre novo da salvação realizada por Cristo para tornar a humanidade partícipe do mistério de Deus e da sua vida de amor e abri-la a um futuro de esperança certa e forte. Ressaltar que neste momento da história a Igreja está chamada a realizar uma novaevangelização, significa intensificar a acção missionária para corresponder plenamente ao mandato do Senhor. O Concílio Vaticano II recordava que «os grupos entre os quais a Igreja se encontra, muitas vezes, por várias razões, mudam radicalmente, de modo que podem brotar situações totalmente novas» (Decr. Ad gentes
AGD 6). Com olhar clarividente, os Padres conciliares viram no horizonte a mudança cultural que hoje é facilmente verificável. Precisamente esta mudada situação, que criou uma condição inesperada para os crentes, exige uma atenção particular para o anúncio do Evangelho, para dizer a razão da própria fé em situações diferentes do passado. A crise que se experimenta tem em si as características da exclusão de Deus da vida das pessoas, de uma indiferença generalizada em relação à própria fé cristã, até à tentativa de a marginalizar da vida pública. Nos decénios passados ainda era possível reencontrar um sentido geral cristão que unificava o sentir comum de gerações inteiras, crescidas à sombra da fé que tinha plasmado a cultura. Hoje, infelizmente, assiste-se ao drama da fragmentação que já não permite ter uma referência unificadora; além disso, verifica-se com frequência o fenómeno de pessoas que desejam pertencer à Igreja, mas são fortemente plasmadas por uma visão da vida em contraste com a fé.

Anunciar Jesus Cristo, único Salvador do mundo, hoje parece ser mais complexo do que no passado; mas a nossa tarefa permanece idêntica como no alvorecer da nossa história. A missão não mudou, assim como não devem mudar o entusiasmo e a coragem que moveram os Apóstolos e os primeiros discípulos. O Espírito Santo, que os estimulou a abrir as portas do cenáculo, constituindo-os evangelizadores (cf. Ac 2,1-4), é o mesmo Espírito que move hoje a Igreja para um renovado anúncio de esperança aos homens do nosso tempo. Santo Agostinho afirma que não se deve pensar que a graça da evangelização se expandiu até aos Apóstolos e que, com eles, aquela fonte de graça esgotou, mas «esta nascente manifesta-se quando flui, não quando deixa de derramar. E foi desta forma que a graça através dos Apóstolos alcançou também outros, que foram enviados a anunciar o Evangelho... aliás, continuou a chamar até estes últimos dias todo o corpo do seu Filho Unigénito, ou seja, a sua Igreja difundida em toda a terra» (Sermo 239). A graça da missão precisa sempre de novos evangelizadores capazes de a acolher, para que o anúncio salvífico da Palavra de Deus nunca venha a faltar, nas condições mutáveis da história.

Existe uma continuidade dinâmica entre o anúncio dos primeiros discípulos e o nosso. Ao longo dos séculos a Igreja nunca deixou de proclamar o mistério salvífico da morte e ressurreição de Jesus Cristo, mas hoje o mesmo anúncio precisa de um renovado vigor para convencer o homem contemporâneo, muitas vezes distraído e insensível. Por isso, a nova evangelização deverá procurar encontrar caminhos para tornar ainda mais eficaz o anúncio da salvação, sem o qual a existência pessoal permanece na sua contraditoriedade e desprovida do essencial. Também a quem permanece ligado às raízes cristãs, mas vive a difícil relação com a modernidade, é importante fazer compreender que o ser cristão não é uma espécie de hábito para vestir em privado ou em ocasiões particulares, mas algo vivo e global, capaz de assumir tudo o que existe de bom na modernidade. Faço votos por que no trabalho destes dias possais traçar um projecto capaz de ajudar toda a Igreja e as diferentes Igrejas particulares, no compromisso da nova evangelização; um projecto no qual a urgência por um renovado anúncio se torne cheio da formação, sobretudo para as novas gerações, e seja conjugado com a proposta de sinais concretos, capazes de tornar evidente a resposta que a Igreja pretende oferecer neste momento particular. Se, por um lado, toda a comunidade está chamada a fortalecer o espírito missionário para dar o anúncio novo que os homens do nosso tempo esperam, não se poderá esquecer que o estilo de vida dos crentes tem necessidade de uma credibilidade genuína, tanto mais convincente quanto mais dramática é a condição daqueles aos quais se dirige. É por isto que desejamos fazer nossas as palavras do Servo de Deus Papa Paulo vi, quando disse em relação à evangelização: «É através do seu comportamento, da sua vida, que a Igreja evangelizará antes de tudo o mundo, ou seja, através do seu testemunho vivo de fidelidade ao Senhor Jesus, de pobreza e de desapego, de liberdade perante os poderes deste mundo, numa palavra, de santidade» (Exort. ap. Evangelii nuntiandi, 41).

Queridos amigos, ao invocar a intercessão de Maria, Estrela da evangelização, para que acompanhe os portadores do Evangelho e abra os corações de quantos o ouvem, garanto-vos a minha oração pelo vosso serviço eclesial e concedo a todos vós a Bênção Apostólica.



NO ENCERRAMENTO DO MÊS MARIANO NA GRUTA DE NOSSA SENHORA DE LOURDES Terça-feira, 31 de Maio de 2011

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NOS JARDINS DO VATICANO


Prezados irmãos e irmãs

É com prazer que me uno a vós em oração, aos pés da Virgem Santa, que hoje contemplamos na Festa da Visitação. Saúdo e agradeço ao Senhor Cardeal Angelo Comastri, Arcipreste daBasílica de São Pedro, aos Purpurados e aos Bispos presentes, assim como a todos vós que estais aqui congregados esta tarde. No encerramento do mês de Maio, queremos unir a nossa voz à de Maria, no seu próprio cântico de louvor; juntamente com Ela, queremos magnificar o Senhor pelas maravilhas que Ele continua a realizar na vida da Igreja e de cada um de nós. De modo particular, foi e permanece para todos um motivo de grande alegria e gratidão o facto de termos iniciado este mês mariano com a memorável Beatificação de João Paulo II. Que grandiosa dádiva de graça foi, para a Igreja inteira, a vida deste grande Papa! O seu testemunho continua a iluminar as nossas existências e serve-nos de estímulo para ser discípulos do Senhor, a segui-lo com a coragem da fé, a amá-lo com o mesmo entusiasmo com que ele lhe entregou a sua própria vida.

Meditando hoje a Visitação de Maria, somos levados a ponderar precisamente sobre esta coragem da fé. Aquela que Isabel recebe na sua casa é a Virgem, que «acreditou» no anúncio do Anjo e respondeu com fé, aceitando de modo intrépido o desígnio de Deus para a sua vida e acolhendo desta forma a Palavra eterna do Altíssimo. Como já ressaltava o meu Beato Predecessor, na Encíclica Redemptoris Mater, foi mediante a fé que Maria pronunciou o seufiat, que «se abandonou a Deus sem reservas e “se consagrou totalmente a si mesma como serva do Senhor, à pessoa e à obra do seu Filho”» (n. 13; cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm. Lumen gentium
LG 56). Por isso ao saudá-la, Isabel exclama: «Bem-aventurada és tu que creste, dado que se hão-de cumprir as coisas que te foram ditas da parte do Senhor» (Lc 1,45). Maria verdadeiramente acreditou que «a Deus nada é impossível» (v. 37) e, fortalecida por esta confiança, deixou-se guiar pelo Espírito Santo na obediência quotidiana aos seus desígnios. Como não desejar, para a nossa vida, o mesmo abandono confiante? Como poderíamos eximir-nos daquela bem-aventurança, que nasce de uma familiaridade tão íntima e profunda com Jesus? Por isso, dirigindo-nos hoje à «cheia de graça», peçamos-lhe que nos conceda também a nós, da Providência divina, poder pronunciar todos os dias o nosso «sim» aos desígnios de Deus, com a mesma fé humilde e simples com que Ela o pronunciou. Ela que, acolhendo em si mesma a Palavra de Deus, se abandonou a Ele sem reservas, nos oriente para uma resposta cada vez mais generosa e incondicional aos seus desígnios, mesmo quando neles somos chamados a abraçar a Cruz.

Neste tempo pascal, enquanto invocamos do Ressuscitado o dom do seu Espírito, confiemos a Igreja e o mundo inteiro à intercessão materna de Nossa Senhora. Maria Santíssima, que no Cenáculo invocou juntamente com os Apóstolos o Consolador, obtenha para cada baptizado a graça de uma vida iluminada pelo mistério do Deus crucificado e ressuscitado, o dom de saber aceitar sempre na própria existência o senhorio daquele que, mediante a sua Ressurreição, derrotou a morte. Estimados amigos, concedo de coração a Bênção Apóstolica a cada um de vós, aos vossos entes queridos e, de maneira particular, àqueles que sofrem.






VIAGEM APOSTÓLICA À CROÁCIA

(4-5 DE JUNHO DE 2011)


ENTREVISTA AOS JORNALISTAS DURANTE A VIAGEM PARA A CROÁCIA Sábado, 7 de Junho de 2011

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Pergunta: Vossa Santidade já esteve outras vezes na Croácia e o seu predecessor realizou três viagens a este país. Poder-se-ia falar de uma relação particular entre a Santa Sé e a Croácia? Quais são os motivos e os aspectos mais significativos desta relação e desta viagem?

Resposta: Pessoalmente, estive na Croácia em duas ocasiões. A primeira vez para o funeral do cardeal Šeper — meu predecessor na Doutrina da Fé — que era um meu grande amigo, pois era presidente também da Comissão Teológica, da qual fui membro. Portanto, conheci a sua bondade, inteligência, discernimento e alegria. E isto deu-me uma ideia da própria Croácia, porque era um bom croata e um grande europeu. Depois, fui convidado mais uma vez pelo seu secretário particular Capek, também ele um homem de grande alegria e bondade, para um simpósio e uma celebração num santuário mariano. Ali vivi a piedade popular, que é muito semelhante à da minha terra, devo dizer. E fiquei muito feliz por ver tal encarnação da fé: uma fé vivida com o coração, onde o sobrenatural se torna natural e o natural é iluminado pelo sobrenatural. E assim vi e vivi esta Croácia, com a sua história católica milenar, sempre muito próxima da Santa Sé e, naturalmente, com a precedente história da Igreja antiga. Vi que existe uma fraternidade muito profunda na fé, na vontade de servir a Deus pelo homem e no humanismo cristão. Neste sentido, parece-me, existe um vínculo natural nesta catolicidade verdadeira, que está aberta a todos e transforma o mundo ou quer transformá-lo segundo as ideias do Criador.

Pergunta: Santo Padre, a Croácia em breve deverá unir-se às 27 nações que fazem parte da União Europeia: todavia, nos últimos tempos, no povo croata aumentou um determinado cepticismo em relação à União. Nesta situação, Vossa Santidade oferecerá uma mensagem de encorajamento aos croatas, a fim de que olhem para a Europa numa perspectiva não só económica mas também cultural e com os valores cristãos?

Resposta: Acredito que a maioria dos croatas pense substancialmente com grande alegria neste momento no qual se unirá à União europeia, pois é um povo profundamente europeu. Os cardeais Šeper, Kuharic e Bozanic, sempre me diziam: «Nós não somos Balcãs mas Europa central». Por conseguinte, é um povo que está no centro da Europa, da sua história e cultura. Neste sentido — penso — é lógico, justo e necessário que entre. Penso também que o sentimento predominante é a alegria de estar onde histórica e culturalmente a Croácia sempre esteve. Pode-se compreender também o cepticismo de um povo numericamente pequeno que entra nesta Europa já feita e construída. Pode-se entender que talvez haja o temor de uma burocracia centralista demasiado forte, de uma cultura racionalista, que não considera suficientemente a história e a sua riqueza e inclusive a riqueza da diversidade histórica. Parece-me que exactamente esta pode ser a missão deste povo, que entra agora: renovar a diversidade na unidade. A identidade europeia é precisamente a riqueza das diversas culturas, que convergem na fé cristã e nos grandes valores cristãos. Parece-me que, para que isto se torne de novo visível e eficiente, reforçar a historicidade das nossas culturas e a diversidade, que é a nossa riqueza, contra um certo racionalismo abstracto, seja a missão dos croatas que entram agora. Neste sentido, encorajo-os: o processo de quem entra na Europa é recíproco: dar e receber. Também a Croácia contribui com a sua história, com a sua capacidade humana e económica, e naturalmente recebe, alargando dessa forma o horizonte e vivendo neste grande comércio não só económico mas sobretudo cultural e espiritual.

Pergunta: Muitos croatas esperavam que por ocasião da sua viagem se celebrasse a canonização do beato cardeal Stepinac: qual é a importância actual desta figura?

Resposta: O cardeal era um grande pastor e um magnífico cristão e desse modo também homem de um humanismo exemplar. Diria que foi destino do cardeal Stepinac ter que viver em duas ditaduras contrastantes, mas ambas anti-humanistas: primeiramente o regime ustashe, que parecia realizar o sonho da autonomia e da independência mas que na realidade era uma autonomia falsa porque instrumentalizada por Hitler para as suas finalidades. O cardeal Stepinac entendeu muito bem isto e defendeu o humanismo verdadeiro contra este regime, apoiando sérvios, judeus, ciganos; ofereceu — digamos — a força de um humanismo autêntico, inclusive sofrendo. Depois, houve a ditadura contrária ao comunismo, onde ele novamente lutou pela fé, pela presença de Deus no mundo, pelo humanismo verdadeiro que depende da presença de Deus: só o homem é imagem de Deus e o humanismo floresce. Assim, digamos, foi o seu destino: lutar em duas batalhas diversas e contrastantes e, exactamente, nesta decisão pela verdade contra o espírito dos tempos, por este humanismo autêntico que vem da fé cristã, é um grande exemplo não só para os croatas, mas para todos nós.



CERIMÓNIA DE BOAS-VINDAS Aeroporto Internacional de Zagreb Pleso Sábado, 4 de Junho de 2011

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Senhor Presidente da República,
Venerados Irmãos no episcopado,
Ilustres Autoridades,
Amados irmãos e irmãs!

Com profunda alegria venho até ao meio de vós como peregrino, em nome de Jesus Cristo. Dirijo a minha saudação mais cordial à querida terra croata e, como sucessor do apóstolo Pedro, estreito num grande abraço todos os seus habitantes. De modo particular saúdo a Comunidade católica: os Bispos, os sacerdotes, os religiosos e as religiosas, os fiéis leigos, especialmente as famílias desta terra, fecundada pelo anúncio do Evangelho, esperança de vida e salvação para todo o homem. Dirijo uma deferente saudação a Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, e demais Autoridades civis e militares aqui reunidas. Agradeço-lhe, Senhor Presidente, as amáveis palavras que me dirigiu, e formulo os melhores votos para o alto cargo que lhe foi confiado e pela paz e prosperidade da Nação inteira.

Neste momento, desejo idealmente ligar-me às três visitas pastorais à Croácia feitas pelo meu amado predecessor, o Beato Papa João Paulo II, e agradecer ao Senhor pela longa história de fidelidade que une o vosso país à Santa Sé. É possível contar mais de treze séculos de laços fortes e especiais, experimentados e consolidados em situações por vezes difíceis e dolorosas. Esta história é um testemunho eloquente do amor do vosso povo ao Evangelho e à Igreja. Desde as suas origens, a vossa Nação pertence à Europa, e para ela contribui, de modo peculiar, com os valores espirituais e morais que plasmaram, ao longo dos séculos, a vida diária e a identidade pessoal e nacional dos seus filhos. Os desafios, que derivam da cultura contemporânea – caracterizada pelo desnivelamento social e reduzida estabilidade e marcada pelo individualismo que favorece uma visão da vida sem obrigações na busca contínua de «espaço privado» –, exigem convicto testemunho e arrojado dinamismo na promoção dos valores morais fundamentais que estão na raiz da vida social e da identidade do velho Continente. Vinte anos depois da proclamação da independência e nas proximidades da plena integração da Croácia na União Europeia, a história passada e recente deste vosso país pode constituir um motivo de reflexão para todos os outros povos do Continente, ajudando cada um deles, e a União inteira, a conservar e reanimar o património comum inestimável de valores humanos e cristãos. Forte assim da sua rica tradição, possa esta querida Nação contribuir para fazer com que a União Europeia valorize plenamente tal riqueza espiritual e cultural.

Sob o lema «Juntos em Cristo», venho ter convosco, amados irmãos e irmãs, para celebrar a I Jornada Nacional das Famílias Católicas Croatas. Que esta ocasião se revele um momento importante para repropor os valores da vida familiar e do bem comum, para reforçar a unidade, reanimar a esperança e conduzir à comunhão com Deus, fundamento de partilha fraterna e solidariedade social. Desde já agradeço sentidamente a quantos colaboraram na preparação e organização desta minha Visita. Perante os desafios que interpelam hoje a Igreja e a sociedade civil, invoco sobre esta terra e quantos nela habitam a intercessão e a ajuda do Beato Aloísio Stepinac, Pastor amado e venerado pelo vosso povo. Possa ele acompanhar as jovens gerações na vivência daquela caridade que levou o Senhor Jesus Cristo a dar a vida por todos os homens. Que São José, guarda solícito do Redentor e Padroeiro celeste da vossa Nação, juntamente com a Virgem Maria, Fidelissima Advocata Croatiae, vos obtenham hoje e sempre a paz e a salvação. Obrigado!


ENCONTRO COM EXPOENTES DA SOCIEDADE CIVIL, DO MUNDO POLÍTICO, ACADÉMICO, CULTURAL E EMPRESARIAL, COM O CORPO DIPLOMÁTICO E COM OS LÍDERES RELIGIOSOS

Teatro Nacional Croata - Zagreb Sábado, 4 de Junho de 2011

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Senhor Presidente,
Senhores Cardeais,
Ilustres Senhores e Senhoras,
Amados irmãos e irmãs!

Estou muito feliz por poder começar a minha visita encontrando-vos, a vós que representais âmbitos qualificados da sociedade croata e o Corpo Diplomático. Dirijo a minha saudação cordial a cada um de vós pessoalmente e também às realidades vitais a que pertenceis: às comunidades religiosas, às instituições políticas, científicas e culturais, aos sectores artístico, económico e desportivo. Agradeço sentidamente a Mons. Puljic e ao Prof. Zurak as amáveis palavras que me dirigiram, bem como aos artistas que me acolheram com a linguagem universal da música. A dimensão da universalidade, que caracteriza a arte e a cultura, é conatural de um modo particular ao cristianismo e à Igreja Católica. Cristo é plenamente homem, e tudo aquilo que é humano encontra n’Ele e na sua Palavra plenitude de vida e de significado.

Este Teatro esplêndido é um lugar simbólico, que exprime a vossa identidade nacional e cultural. O facto de vos poder encontrar aqui, todos juntos, é mais um motivo de alegria do espírito, porque a Igreja é um mistério de comunhão e rejubila sempre com a comunhão na riqueza das diversidades. A participação dos Representantes das outras Igrejas e Comunidades cristãs, bem como das religiões hebraica e muçulmana, contribui para nos lembrar que a religião não é uma realidade aparte relativamente à sociedade: pelo contrário, é uma sua componente conatural, que evoca constantemente a dimensão vertical, a escuta de Deus como condição para a busca do bem comum, da justiça e da reconciliação na verdade. A religião coloca o homem em relação com Deus, Criador e Pai de todos, e, por conseguinte, deve ser uma força de paz. As religiões sempre se devem purificar segundo esta sua verdadeira essência, para corresponderem à sua genuína missão.

E aqui queria introduzir o tema central desta minha breve reflexão: a consciência. Transversal aos diferentes campos onde estais empenhados, este tema é fundamental para uma sociedade livre e justa, tanto a nível nacional como supranacional. Aqui penso naturalmente na Europa, de que a Croácia faz parte desde sempre no plano histórico-cultural, ao passo que, no plano político-institucional, está em vias de entrar na União. Pois bem, as grandes conquistas da idade moderna, ou seja, o reconhecimento e a garantia da liberdade de consciência, dos direitos humanos, da liberdade da ciência e, consequentemente, de uma sociedade livre, há que confirmá-las e desenvolvê-las mas mantendo a racionalidade e a liberdade abertas ao seu fundamento transcendente, para evitar que tais conquistas se auto-destruam, como infelizmente temos de constatar em não poucos casos. A qualidade da vida social e civil, a qualidade da democracia dependem em grande parte deste ponto «crítico» que é a consciência, de como a mesma é entendida e de quanto se investe na sua formação. Se a consciência se reduz, segundo o pensamento moderno predominante, ao âmbito da subjectividade, para o qual se relegam a religião e a moral, a crise do Ocidente não tem remédio e a Europa está destinada à involução. Pelo contrário, se a consciência é descoberta novamente como lugar da escuta da verdade e do bem, lugar da responsabilidade diante de Deus e dos irmãos em humanidade – que é a força contra toda a ditadura – então há esperança para o futuro.

Estou grato ao Prof. Zurak por ter lembrado as raízes cristãs de numerosas instituições culturais e científicas deste país, como aliás aconteceu em todo o continente europeu. O lembrar estas origens é necessário inclusive para a verdade histórica, mas é importante saber lê-las em profundidade a fim de que possam animar também os dias de hoje. Por outras palavras, é decisivo captar o dinamismo que está dentro do acontecimento, por exemplo, da criação duma universidade, ou dum movimento artístico, ou dum hospital. É preciso compreender o porquê e o como de isso ter acontecido, para se valorizar nos dias de hoje tal dinamismo, que é uma realidade espiritual que se torna cultural e, consequentemente, social. Na base de tudo, encontram-se homens e mulheres, encontram-se pessoas, consciências, movidas pela força da verdade e do bem. Foram citados alguns dos filhos ilustres desta terra. Gostaria de deter-me no Padre jesuíta Ruder Josip Boškovic, que nasceu em Dubrovnik há trezentos anos, no dia 18 de Maio de 1711. Ele personifica muito bem o consórcio feliz entre a fé e a ciência, que se estimulam reciprocamente a uma pesquisa ao mesmo tempo aberta, diversificada e capaz de síntese. A sua obra mais importante, Theoria philosophiae naturalis, publicada em Viena e depois em Veneza a meados do século XVIII, tem um subtítulo muito significativo: redacta ad unicam legem virium in natura existentium, ou seja, «segundo a única lei das forças existentes na natureza». Em Boškovic, temos a análise, o estudo de múltiplos ramos do saber, mas temos também a paixão pela unidade. E isto é típico da cultura católica. Por isso, é sinal de esperança a fundação de uma Universidade Católica na Croácia. Espero que esta contribua para criar unidade entre os diversos âmbitos da cultura contemporânea, os valores e a identidade do vosso povo, dando continuidade à fecunda contribuição da Igreja para a história da nobre Nação croata. Voltando ao Padre Boškovic, dizem os peritos que a sua teoria da «continuidade», válida tanto nas ciências naturais como na geometria, concorda magnificamente com algumas das grandes descobertas da física contemporânea. Que podemos dizer? Prestemos homenagem ao croata ilustre, mas também ao jesuíta autêntico; prestemos homenagem ao cultor da verdade que está bem ciente de quanto esta o supere, mas sabe também, à luz da verdade, empenhar profundamente os recursos da razão que o próprio Deus lhe concedeu.

Contudo, para além da homenagem, é preciso aproveitar o método, a abertura mental destes grandes homens. Voltemos, pois, à consciência como chave mestra para a elaboração cultural e a construção do bem comum. É na formação das consciências que a Igreja oferece à sociedade a sua contribuição mais específica e preciosa. Uma contribuição que começa na família e que encontra um reforço importante na paróquia, onde as crianças e adolescentes e, depois, os jovens aprendem a aprofundar as Sagradas Escrituras, que são o «grande códice» da cultura europeia; e, ao mesmo tempo, aprendem o sentido da comunidade fundada no dom: não no interesse económico ou na ideologia, mas no amor, que é «a força propulsora principal para o verdadeiro desenvolvimento de cada pessoa e da humanidade inteira» (Caritas in veritate ). Aprendida na infância e na adolescência, esta lógica da gratuidade é, depois, vivida nos diversos âmbitos, no jogo e no desporto, nas relações interpessoais, na arte, no serviço voluntário aos pobres e aos doentes, e, uma vez assimilada, pode-se concretizar nos âmbitos mais complexos da política e da economia, colaborando para uma polis que seja acolhedora e hospitaleira, e que ao mesmo tempo não seja vazia, nem falsamente neutra, mas rica de conteúdos humanos, com uma forte consistência ética. É aqui que os christifideles laici estão chamados a fazer render generosamente a sua formação, guiados pelos princípios da Doutrina Social da Igreja, por uma autêntica laicidade, a justiça social, a defesa da vida e da família, a liberdade religiosa e educativa.

Ilustres amigos, a vossa presença e a tradição cultural croata sugeriram-me estas breves reflexões. Deixo-vo-las como sinal da minha estima e sobretudo da vontade que tem a Igreja de caminhar com a luz do Evangelho no meio deste povo. Agradeço-vos pela vossa atenção e de coração abençoo a todos vós, os vossos entes queridos e as vossas actividades!



VIGÍLIA DE ORAÇÃO COM OS JOVENS Praça Bano Josip Jelacic - Zagreb Sábado, 4 de Junho de 2011

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Queridos jovens,

A minha saudação afectuosa para todos vós! Sinto-me particularmente feliz por estar convosco, nesta praça histórica que representa o coração da cidade de Zagrábia. Um lugar de encontros e de comunicação, onde normalmente reina o rumor e a agitação da vida diária. Agora, a vossa presença transforma-a quase num «templo», cuja abóbada é o próprio céu, que nesta noite parece debruçar-se sobre nós. No silêncio, queremos acolher a Palavra de Deus proclamada, para que ilumine as nossas mentes e aqueça os nossos corações.

Agradeço vivamente a Mons. Srakic, Presidente da Conferência Episcopal, as palavras com que introduziu o nosso encontro; e, de modo particular, saúdo e agradeço aos dois jovens que nos ofereceram os seus belos testemunhos. A experiência vivida por Daniel lembra a de Santo Agostinho: é a experiência de procurar o amor «fora», para depois descobrir que me é mais íntimo do que o sou eu mesmo, que me «toca» profundamente e me purifica... Mateja, por sua vez, falou-nos da beleza da comunidade, que abre o coração, a mente o carácter... Obrigado a ambos!

São Paulo, na leitura que foi proclamada, convidou-nos a permanecer «sempre alegres no Senhor» (
Ph 4,4). É um convite que faz vibrar a alma, sabendo nós que o Apóstolo das Gentes escreve esta Carta aos cristãos de Filipos quando se encontra na prisão, à espera de ser julgado. Está preso, mas o anúncio e o testemunho do Evangelho não podem ser acorrentados. A experiência de São Paulo revela como é possível, no nosso caminho, conservar a alegria mesmo nos momentos escuros. A que alegria se refere ele? Todos nós sabemos que, no coração de cada um, habita um intenso desejo de felicidade. Cada acção, cada decisão, cada intenção traz nela escondida esta exigência íntima e natural. Muitas vezes, porém, damo-nos conta de ter colocado a nossa confiança em realidades que não satisfazem tal desejo, antes, fazem-nos ver toda a sua precariedade. E é em tais momentos que se sente necessidade de algo que chegue «mais além», que dê sentido ao viver quotidiano.

Queridos amigos, a juventude é um tempo que o Senhor vos dá, para poderdes descobrir o significado da vida! É o tempo dos grandes horizontes, dos sentimentos vividos com intensidade, mas também dos medos de decisões que comprometem para sempre, das dificuldades no estudo e no trabalho, das questões levantadas pelo mistério da dor e do sofrimento. Mais ainda, este tempo estupendo da vossa vida traz consigo um anseio profundo, que não anula tudo o resto, mas eleva-o para lhe dar plenitude. No Evangelho de João, Jesus, dirigindo-Se aos seus primeiros discípulos, pergunta: «Que procurais?» (Jn 1,38). Queridos jovens, esta palavra, esta pergunta atravessa o tempo e o espaço, interpelando cada homem e cada mulher que se abre para a vida e procura o caminho justo... E - coisa surpreendente! - a voz de Cristo repete também a vós: «Que procurais?». Jesus fala-vos hoje: por meio do Evangelho e do Espírito Santo, Ele torna-Se vosso contemporâneo. É Ele que vos procura, ainda antes de O procurardes vós! Respeitando plenamente a vossa liberdade, aproxima-Se de cada um de vós e propõe-Se a Si mesmo como a resposta autêntica e decisiva para aquele anseio que habita no vosso ser, para o desejo de uma vida que valha a pena ser vivida. Deixai que Ele vos tome pela mão! Deixai-O entrar cada vez mais como amigo e companheiro do vosso caminho! Confiai n’Ele, não vos desiludirá jamais. Jesus faz-vos conhecer de perto o amor de Deus-Pai, faz-vos compreender que a vossa felicidade se realiza na amizade com Ele, na comunhão com Ele, porque fomos criados e salvos por amor e, só no amor – um amor que quer e procura o bem do outro –, experimentamos verdadeiramente o sentido da vida e sentimo-nos contentes de viver, mesmo no meio das canseiras, das provas, das desilusões, mesmo indo contra corrente.

Queridos jovens, enraizados em Cristo, podereis viver em plenitude aquilo que sois. Como sabeis, sobre este tema elaborei a minha Mensagem para a próxima Jornada Mundial da Juventude, que nos verá reunidos no mês de Agosto em Madrid e para a qual nos encaminhamos. Parti desta expressão incisiva de São Paulo: «Enraizados e edificados em Cristo, firmes na fé» (Col 2,7). Crescendo na amizade com o Senhor, através da sua Palavra, da Eucaristia e da pertença à Igreja, com a ajuda dos vossos sacerdotes, podereis testemunhar a todos a alegria de ter encontrado Aquele que sempre vos acompanha e chama a viver cheios de confiança e esperança. O Senhor Jesus não é um Mestre que ilude os seus discípulos: diz claramente que caminhar com Ele requer o compromisso e o sacrifício pessoal, mas vale a pena! Queridos jovens, não vos deixeis desorientar por sedutoras promessas de sucesso fácil, de estilos de vida que privilegiam a fachada em detrimento da interioridade. Não cedais à tentação de depositar absoluta confiança no ter, nas coisas materiais, renunciando a enxergar a verdade que está mais além, como uma estrela alta no céu, para onde Cristo vos quer conduzir. Deixai-vos guiar para as alturas de Deus!

Na estação da vossa juventude, ampara-vos o testemunho de muitos discípulos do Senhor que viveram o seu tempo levando no coração a novidade do Evangelho. Pensai em Francisco e Clara de Assis, em Rosa de Viterbo, em Teresa do Menino Jesus, em Domingos Sávio: quantos jovens santos e santas na grande companhia da Igreja! Mas aqui, na Croácia, não podemos, eu e vós, deixar de pensar no Beato Ivan Merz. Um jovem brilhante, inserido a todos os títulos na vida social, que, após a morte da jovem Greta – o seu primeiro amor –, empreende o caminho universitário. Durante os anos da primeira guerra mundial, encontra-se face a face com a destruição e a morte, mas tudo isto o molda e forja, fazendo-lhe superar momentos de crise e de luta espiritual. A fé de Ivan reforça-se de tal modo que se dedica ao estudo da liturgia e começa um intenso apostolado entre os próprios jovens. Descobre a beleza da fé católica, e compreende que a vocação da sua vida é viver e fazer viver a amizade com Cristo. O seu caminho está cheio de inúmeros gestos de caridade, de bondade que nos deixam maravilhados e comovidos. Morre a 10 de Maio de 1928, tendo apenas 32 anos, depois de alguns meses de doença, oferecendo a sua vida pela Igreja e pelos jovens.

Esta vida jovem, entregue por amor, contém o perfume de Cristo e é, para todos, um convite a não ter medo de se entregar ao Senhor, tal como contemplamos de modo particular na Virgem Maria, a Mãe da Igreja, aqui venerada e amada com o título de Majka Božja od Kamenutih vrata [«Mãe de Deus da Porta de Pedra»]. Nesta noite, quero confiar-Lhe cada um de vós, para que vos acompanhe com a sua protecção e sobretudo vos ajude a encontrar o Senhor e, n’Ele, achar o significado pleno da vossa vida. Maria não teve medo de Se entregar com todo o seu ser ao projecto de Deus; n’Ela, vemos a meta a que somos chamados: a plena comunhão com o Senhor. Toda a nossa vida é um caminho rumo à Unidade e Trindade de Amor que é Deus; podemos viver com a certeza de que jamais seremos abandonados. Queridos jovens croatas, a todos vos abraço como filhos! Levo-vos no coração e deixo-vos a minha Bênção. «Permanecei sempre alegres no Senhor!» A sua alegria, a alegria do amor verdadeiro, seja a vossa força. Amen. Sejam louvados Jesus e Maria!




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