Discursos Bento XVI 8122

ATO DE VENERAÇÃO À MARIA IMACULADA NA PRAÇA DE ESPANHA

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Solenidade da Imaculada Conceição da Bem-Aventurada Virgem Maria

Sábado, 8 de Dezembro de 2012





Caros irmãos e irmãs

É sempre uma alegria especial reunir-nos aqui, na Piazza di Spagna, na festa de Maria Imaculada. Encontrarmo-nos juntos — romanos, peregrinos e visitantes — aos pés da estátua da nossa Mãe espiritual, faz-nos sentir unidos no sinal da fé. Apraz-me ressaltá-lo neste Ano da fé, que a Igreja inteira está a viver. Saúdo-vos com grande afecto e gostaria de compartilhar convosco alguns pensamentos simples, sugeridos pelo Evangelho desta solenidade: o Evangelho da Anunciação.

Antes de tudo, surpreende-nos sempre, e faz-nos meditar, o facto de que aquele momento decisivo para o destino da humanidade, o instante em que Deus se fez homem, está envolvido por um grande silêncio. O encontro entre o mensageiro divino e a Virgem Imaculada passa totalmente inobservado: ninguém sabe, ninguém fala dele. É um acontecimento que, se se verificasse nos nossos tempos, não deixaria vestígios nos jornais e nas revistas, porque é um mistério que se verifica no silêncio. O que é verdadeiramente grande passa muitas vezes inobservado, e o silêncio calmo revela-se mais fecundo do que o agitar-se frenético que caracteriza as nossas cidades, mas que — com as devidas proporções — já se vivia em cidades importantes, como a Jerusalém dessa época. Aquele activismo que nos torna incapazes de parar, de estar tranquilos, de ouvir o silêncio em que o Senhor faz ouvir a sua voz discreta. No dia em que recebeu o anúncio do Anjo, Maria estava totalmente recolhida e ao mesmo tempo aberta à escuta de Deus. Nela não há obstáculo nem defesa, nada que a separe de Deus. Este é o significado do seu ser sem pecado original: a sua relação com Deus está livre da mais insignificante imperfeição; não há separação, nem sombra de egoísmo, mas uma sintonia perfeita: o seu pequeno coração humano está perfeitamente «centrado» no grande Coração de Deus. Eis, queridos irmãos, que o facto de vir aqui, junto deste monumento a Maria no centro de Roma, nos recorda antes de tudo que a voz de Deus não se reconhece no ruído e na agitação; o seu desígnio sobre a nossa vida pessoal e social não se compreende, permanecendo na superfície, mas descendo a um nível mais profundo, onde as forças que agem não são económicas nem políticas, mas morais e espirituais. É ali que Maria nos convida a descer e a sintonizar-nos com a obra de Deus.

Há uma segunda coisa, ainda mais importante, que a Imaculada nos diz quando vimos aqui, e é que a salvação do mundo não é obra do homem — da ciência, da técnica, da ideologia — mas vem da Graça. O que significa esta palavra? Graça quer dizer o Amor na sua pureza e beleza, é o próprio Deus, do modo como se revelou na história salvífica narrada na Bíblia e completamente em Jesus Cristo. Maria é chamada a «cheia de graça» (
Lc 1,28) e com esta sua identidade recorda-nos o primado de Deus na nossa vida e na história do mundo; recorda-nos que o poder de amor de Deus é mais forte do que o mal, pode preencher os vazios que o egoísmo provoca na história das pessoas, das famílias, das nações e do mundo. Estes vazios podem tornar-se infernos, onde a vida humana é como que arrastada para baixo, para o nada, perdendo o sentido e a luz. Os remédios falsos que o mundo propõe preenchem estes vazios — emblemática é a droga — mas na realidade alargam o abismo. Só o amor pode salvar desta queda, mas não um amor qualquer: um amor que tenha em si a pureza da Graça — de Deus que transforma e renova — e que assim possa introduzir nos pulmões intoxicados novo oxigénio, ar puro, renovada energia de vida. Maria diz-nos que, por mais em baixo que o homem possa cair, nunca é demasiado baixo para Deus, o Qual desceu até à mansão dos mortos; por mais que o nosso coração se tenha desviado, Deus é sempre «maior do que o nosso coração» (1Jn 3,20). O sopro suave da Graça pode dissipar as nuvens mais obscuras, pode tornar a vida bela e rica de significado até nas situações mais desumanas.

E daqui provém a terceira coisa que Maria Imaculada nos diz: Ela fala-nos da alegria, daquele júbilo autêntico que se difunde no coração livre do pecado. O pecado traz consigo uma tristeza negativa, que induz a fechar-se em si mesmo. A Graça traz a alegria genuína, que não depende da posse dos bens, mas está arraigada no íntimo, no profundo da pessoa, e que nada e ninguém podem tirar. O Cristianismo é, essencialmente, um «evangelho», uma «notícia alegre», enquanto alguns pensam que é um obstáculo para a alegria, porque vêem nele um conjunto de proibições e de regras. Na realidade, o Cristianismo é o anúncio da vitória da Graça sobre o pecado, da vida sobre a morte. E se comporta renúncias e uma disciplina da mente, do coração e do comportamento, é precisamente porque no homem existe a raiz venenosa do egoísmo, que faz mal a si mesmo e ao próximo. Portanto, é necessário aprender a dizer não à voz do egoísmo e a dizer sim à voz do amor autêntico. A alegria de Maria é completa, porque no seu coração não há sombra de pecado. Esta alegria coincide com a presença de Jesus na sua vida: Jesus concebido e levado no seu ventre, depois menino confiado aos seus cuidados maternos, e enfim adolescente, jovem e homem maduro; Jesus visto partir de casa, seguido à distância com fé, até à Cruz e à Ressurreição: Jesus é a alegria de Maria, a alegria da Igreja e de todos nós.

Neste tempo de Advento, Maria Imaculada ensina-nos a ouvir a voz de Deus que fala no silêncio; a acolher a sua Graça, que nos liberta do pecado e de todo o egoísmo, para assim saborearmos a alegria verdadeira. Maria, cheia de graça, roga por nós!





AOS PARTICIPANTES NO CONGRESSO INTERNACIONAL «ECCLESIA IN AMERICA» 9 de Dezembro de 2012

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Basílica Vaticana
Domingo 9 de Dezembro de 2012




Senhores Cardeais
Queridos Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio
Estimados Cavaleiros de Colombo

Agradeço vivamente as palavras do Senhor Cardeal Marc Ouellet, Presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, e alegra-me que, juntamente com os Cavaleiros de Colombo, tenha querido promover um Congresso internacional para aprofundar a consideração e projecção da Exortação apostólica pós-sinodal Ecclesia in America, do beato João Paulo II, e que recolhe as contribuições da Assembleia especial do Sínodo dos Bispos para a América. Saúdo cordialmente os Senhores Cardeais, Bispos, sacerdotes e pessoas consagradas, bem como os numerosos leigos que vieram para participar nesta importante iniciativa. Os vossos rostos trazem-me de novo à mente e ao coração as palpitações do Continente americano, tão presente na oração do Papa, e cuja devoção à Sé Apostólica pude experimentar com muita gratidão, não só durante as minhas visitas pastorais a alguns dos seus países, mas também todas as vezes que encontro aqui pastores e fiéis dessas queridas terras.

O meu venerado Predecessor, o beato João Paulo II, teve a intuição clarividente de incrementar as relações de cooperação entre as Igrejas particulares de toda a América, do Norte, do Centro e do Sul, e ao mesmo tempo, de suscitar uma maior solidariedade entre as suas nações. Hoje estes propósitos merecem ser retomados a fim de que a mensagem redentora de Cristo seja posta em prática com mais perseverança e produza abundantes frutos de santidade e de renovação eclesial.

O tema que guiou as reflexões daquela Assembleia sinodal pode servir também de inspiração para os trabalhos destes dias: «O encontro com Jesus Cristo vivo, caminho para a conversão, a comunhão e a solidariedade na América». De facto, o amor ao Senhor Jesus e o poder da sua graça devem arraigar-se cada vez mais intensamente no coração das pessoas, das famílias e das comunidades cristãs das vossas nações, para que nelas se prossiga com dinamismo pelas sendas da concórdia e do progresso justo. Por isso, é um dom da Providência que o vosso Congresso se realize pouco depois do início do Ano da fé e da Assembleia geral do Sínodo dos Bispos dedicada à nova evangelização, pois as vossas deliberações contribuirão valiosamente para a difícil e urgente tarefa de fazer ressoar o Evangelho de Cristo com clareza e audácia.

A citada Exortação apostólica já indicava os desafios e dificuldades que no momento actual ainda persistem com características singulares e complexas. De facto, o secularismo e diferentes grupos religiosos expandem-se por todas as latitudes, dando lugar a numerosas problemáticas. A educação e promoção de uma cultura da vida é uma urgência fundamental face à difusão de uma mentalidade que atenta contra a dignidade da pessoa e não favorece nem tutela a instituição matrimonial e familiar. Como não se preocupar pelas dolorosas situações de emigração, desarraigamento ou violência, sobretudo causadas pela delinquência organizada, o narcotráfico, a corrupção ou o comércio de armas? E que dizer das dilacerantes desigualdades e das bolsas de pobreza provocadas por medidas económicas, políticas e sociais questionáveis?

Todas estas importantes questões exigem um estudo esmerado. Sem dúvida, além da sua avaliação técnica, a Igreja católica tem a convicção de que a luz para uma solução adequada só pode provir do encontro com Jesus Cristo vivo que suscita atitudes e comportamentos cimentados no amor e na verdade. Esta é a força decisiva para a transformação do Continente americano.

Queridos amigos, o amor de Cristo impele-nos a dedicar-nos sem hesitações à proclamação do seu Nome em todos os recantos da América, levando-o com liberdade e entusiasmo aos corações de todos os seus habitantes. Não há obra mais gratificante nem benéfica do que esta. Não há maior serviço que possamos prestar aos nossos irmãos. Eles têm sede de Deus. Por isso é preciso assumir este compromisso com convicção e entrega jubilosa, animando os sacerdotes, os diáconos, os consagrados e os agentes da pastoral a purificar e revigorar cada vez mais a sua vida interior através do relacionamento sincero com o Senhor e a participação digna e assídua nos sacramentos. Para isto contribuirá uma catequese adequada e uma formação doutrinal recta e constante, em fidelidade total à Palavra de Deus e ao Magistério da Igreja e procurando responder às questões e anseios que o homem traz no coração. Deste modo, o testemunho da vossa fé será mais eloquente e incisivo, e incrementareis a unidade no desempenho do vosso apostolado. Um renovado espírito missionário e o fervor e generosidade do vosso compromisso serão uma contribuição insubstituível que a Igreja universal espera e precisa da Igreja na América.

Como modelo de abertura à graça divina e de total solicitude pelos demais, resplandece nesse Continente a figura de Maria Santíssima, Estrela da nova evangelização, a qual é invocada em toda a América sob o glorioso título de Nossa Senhora de Guadalupe. Ao recomendar este Congresso à sua protecção materna e amorosa, concedo aos seus organizadores e participantes a Bênção Apostólica, penhor de abundantes graças divinas.





A SEIS NOVOS EMBAIXADORES ACREDITADOS JUNTO DA SANTA SÉ 13 de Dezembro de 2012

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Sala Clementina
Quinta-feira, 13 de Dezembro de 2012




Senhora e Senhores Embaixadores!

É com prazer que vos recebo por ocasião da apresentação das Cartas que vos acreditam como embaixadores extraordinários e plenipotenciários dos vossos países junto da Santa Sé: República da Guiné, São Vicente e Granadinas, Níger, Zâmbia, Tailândia e Sri Lanka. Agradeço-vos as amáveis palavras assim como as saudações que me transmitistes da parte dos vossos respectivos chefes de Estado. Ficar-vos-ia grato se lhes transmitísseis os meus melhores votos pelas suas pessoas e pelo cumprimento do seu cargo ao serviço dos seus povos. Rezo a Deus para que conceda a todos os vossos compatriotas levar uma vida pacífica e digna, na concórdia e na unidade.

Ao perscrutar os numerosos desafios da nossa época, podemos verificar que a educação ocupa um lugar de primeiro plano. Hoje em dia ela realiza-se em contextos nos quais a evolução dos modos de vida e de conhecimento cria rupturas humanas, culturais, sociais e espirituais inéditas na história da humanidade. As redes sociais, outra novidade, tendem a substituir os espaços naturais de sociedade e de comunicação, tornando-se com frequência o único ponto de referência da informação e do conhecimento. A família e a escola já não parecem ser o primeiro e natural terreno fértil ao qual as jovens gerações vão buscar a seiva que alimenta a sua existência. Por outro lado, nos âmbitos escolar e académico, a autoridade dos professores e dos docentes é posta em causa e, infelizmente, a competência de alguns deles não está isenta de parcialidade cognitiva e de carência antropológica, excluindo assim a verdade sobre a pessoa humana. Ela é um ser integral e não uma soma de elementos que se podem isolar e manipular a seu bel-prazer. A escola e a universidade parecem ter-se tornado incapazes de projectos criadores que incluem uma teologia transcendental apta a conquistar os jovens no seu ser profundo, a ponto que eles, contudo preocupados pelo seu futuro, são tentados pelo esforço menor, pelo mínimo suficiente e pelo sucesso fácil, utilizando por vezes de modo impróprio as possibilidades oferecidas pela tecnologia contemporânea. Muitos desejam o sucesso e um rápido estatuto social e profissional importante desprezando a formação, as competências e a experiência exigidas. O mundo actual e os adultos responsáveis não lhes souberam dar os pontos de referência necessários. Pode porventura ser explicada a disfunção de certas instituições e de alguns serviços públicos e privados com uma educação mal garantida e impropriamente assumida?

Fazendo minhas as palavras do meu predecessor, o Papa Leão XIII, estou certo de que «a verdadeira dignidade do homem e a sua excelência residem nos seus costumes, ou seja, nas suas virtudes; as virtudes são o património comum dos mortais, ao alcance de todos, dos pequenos e dos grandes, dos pobres e dos ricos» (Rerum novarum, 20). Por conseguinte, convido os vossos governantes a contribuir com coragem para o progresso da nossa humanidade, favorecendo a educação das novas gerações, através da promoção de uma antropologia sadia, que é a base indispensável para qualquer educação autêntica, e está em conformidade com o património natural comum. Esta tarefa poderia passar antes de tudo por uma reflexão séria sobre as diferentes problemáticas que existem nos vossos respectivos países, nos quais determinadas opções políticas ou económicas podem debelar dissimuladamente os vossos patrimónios antropológicos e espirituais. Eles sobreviveram ao crivo dos séculos e constituíram-se pacientemente sobre bases que respeitam a essência da pessoa humana na sua realidade plural, permanecendo contudo em perfeita sintonia com o conjunto dos costumes. Convido ainda os vossos governantes a terem a coragem de trabalhar para a consolidação da autoridade moral — entendida como apelo a uma coerência de vida — necessária para uma educação verdadeira e sadia das jovens gerações.

O direito a uma educação nos justos valores nunca deve ser negado nem esquecido. O dever de educar nestes valores nunca deve ser omitido nem debilitado por qualquer interesse político nacional ou supranacional. Eis por que é necessário educar na verdade e para a verdade. Mas «o que é a verdade?» (
Jn 18,38), perguntara Pilatos que era um governador. Nos nossos dias, dizer a verdade tornou-se suspeito, desejar viver na verdade parece antiquado, e promovê-la parece ser um esforço vão. Por conseguinte, o futuro da humanidade encontra-se igualmente na relação das crianças e dos jovens com a verdade: a verdade acerca do homem, da criação, das instituições, etc. Juntamente com a educação na rectidão do coração e do pensamento, os jovens precisam também, hoje mais do que nunca, de ser educados para o sentido do sacrifício e da perseverança nas dificuldades. É necessário ensinar-lhes que qualquer acção da pessoa humana deve ser responsável e coerente com o seu desejo infinito, e que esta acção acompanha o seu crescimento em vista da formação para uma humanidade cada vez mais fraterna e livre das tentações individualistas e materialistas.

Permiti que eu saúde, por vosso intermédio, os Bispos e os fiéis das comunidades católicas presentes nos vossos países. A Igreja desempenha a sua missão em fidelidade ao seu Senhor e com o desejo fervoroso de dar a sua contribuição específica para a promoção integral dos vossos compatriotas, sobretudo mediante a educação das crianças e dos jovens. Ela participa diariamente dos esforços comuns pelo desenvolvimento espiritual e humano de todos, com as suas estruturas educativas, caritativas e de assistência à saúde, tendo a preocupação de despertar as consciências para o respeito recíproco e para a responsabilidade. Neste sentido, encorajo os vossos governantes a continuar a permitir que a Igreja se ocupe livremente destes âmbitos de actividades tradicionais as quais, como sabeis, contribuem para o desenvolvimento dos vossos países e para o bem comum.

Senhora e Senhores Embaixadores, no momento em que iniciais oficialmente a vossa missão junto da Santa Sé, apresento-vos os meus melhores votos, garantindo-vos o apoio dos diversos serviços da Cúria Romana para o cumprimento da vossa função. Para esta finalidade, invoco de bom grado sobre vós e sobre as vossas famílias, assim como sobre os vossos colaboradores a abundância das Bênçãos divinas.




AOS FIÉIS DO MUNICÍPIO DE PESCOPENNATARO POR OCASIÃO DA OFERTA DO PINHEIRO DE NATAL PARA A PRAÇA DE SÃO PEDRO 14 de Dezembro de 2012

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Sala Clementina
Sexta-feira, 14 de Dezembro de 2012




Estimados irmãos e irmãs

É-me grato receber-vos no dia em que é apresentada a árvore de Natal da praça de São Pedro, um pinheiro que este ano provém de Pescopennataro, na Província de Isernia, na Região de Molise. Penso que hoje, aqui, está toda a população do município! Dirijo a cada um a minha cordial saudação, a começar pelo Presidente da Câmara Municipal, Pompilio Sciulli, a quem agradeço as palavras que há pouco me dirigiu em nome dos presentes. Além disso, saúdo as demais Autoridades civis, com um pensamento particular para o Presidente da Região. Com afecto fraterno, estou feliz por saudar o Bispo de Trivento, D. Domenico Scotti, e o Pároco de Pescopennataro.

Esta tarde, no final da cerimónia de entrega oficial, serão acesas as luzes que ornamentam a árvore. Ela permanecerá ao lado do Presépio até ao fim das festividades natalícias e será admirada pelos numerosos peregrinos, provenientes de todas as partes do mundo. Obrigado por esta homenagem, assim como pelas outras árvores menores, destinadas ao Palácio Apostólico e às salas do Vaticano! A árvore branca que quisestes oferecer-me, amados habitantes de Pescopennataro e de toda a Região de Molise, manifesta também a fé e a religiosidade do povo molisano que, ao longo dos séculos, conservou um importante tesouro espiritual, expresso na cultura, na arte e nas tradições locais. É tarefa de cada um de vós e dos vossos conterrâneos, haurir constantemente deste património e incrementá-lo, para poder enfrentar as novas urgências sociais e os desafios culturais hodiernos no sulco da fidelidade consolidada e fecunda ao Cristianismo.

Faço votos de coração a todos vós aqui presentes, aos vossos concidadãos e a todos os habitantes da vossa Região, a fim de que vivais o Natal do Senhor com serenidade e intensidade. Em conformidade com o célebre oráculo do profeta Isaías, Ele apareceu como uma grande luz para o povo que caminhava nas trevas (cf.
Is 9,1). Deus fez-se homem e veio habitar no meio de nós, para dissipar as trevas do erro e do pecado, transmitindo à humanidade a sua luz divina. Esta luz excelsa, da qual a árvore é sinal e evocação, não só não sofreu diminuição alguma de tensão com o passar dos séculos e dos milénios, mas continua a resplandecer sobre nós e a iluminar cada homem que vem ao mundo, especialmente quando temos que atravessar momentos de incerteza e de dificuldade. O próprio Jesus dirá de si mesmo: «Eu sou a luz do mundo; quem me segue não caminha nas trevas, mas terá a luz da vida» (Jn 8,12).

E quando nas várias épocas somos tentados a apagar a luz de Deus, para acender clarões ilusórios e falazes, abriram-se estações marcadas por violências trágicas contra o homem. Isto porque, quando se procura eliminar o nome de Deus das páginas da história, o resultado é que se traçam linhas tortas, onde até as palavras mais lindas e nobres perdem o seu significado verdadeiro. Pensemos em termos como «liberdade», «bem comum», «justiça»: desprovidos da sua radicação em Deus e do seu amor, no Deus que revelou a sua Face em Jesus Cristo, estas realidades permanecem muitas vezes à mercê dos interesses humanos, perdendo assim a sua ligação com as exigências da verdade e da responsabilidade civil.

Queridos amigos, agradeço-vos mais uma vez de coração o gesto que realizastes. A vossa é a Árvore do Ano da fé: queira o Senhor recompensar o vosso dom, revigorando a fé em vós e nas vossas comunidades! Peço-o por intercessão da Virgem Maria, a Primeira que acolheu e seguiu a Palavra de Deus que se fez homem, enquanto vos concedo a todos, bem como às vossas famílias, a Bênção Apostólica.



AO COMITÉ OLÍMPICO NACIONAL ITALIANO 17 de Dezembro de 2012

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Sala Clementina

Segunda-feira, 17 de Dezembro de 2012




Queridos amigos!

Sinto-me muito feliz por vos receber, Dirigentes do Comité Olímpico Nacional Italiano e, sobretudo, a vós atletas que representastes a Itália nas recentes Olimpíadas de Londres. Saúdo-vos com cordialidade profunda, começando pelo Presidente do CONI, Dr. Giovanni Petrucci, ao qual agradeço as gentis palavras que me dirigiu em nome de todos. No Verão passado, participastes no maior evento desportivo internacional; os Jogos Olímpicos. Neste palco confrontastes-vos com outros atletas provenientes de quase todos os países do mundo. Competistes no terreno do agonismo e das habilidades técnicas, mas antes ainda no das qualidades humanas, demonstrando os vossos dotes e capacidades, adquiridas com o compromisso e o rigor na preparação, a constância do treino, a consciência dos vossos limites. Longe dos reflectores submetestes-vos a uma dura disciplina e alguns de vós viram depois premiado o valor alcançado. Parece-me que em Londres conquistastes 28 medalhas, das quais 8 de ouro! Mas a vós, atletas, não vos foi pedido unicamente para competir e obter resultados. Cada actividade desportiva, quer a nível amadorista quer agonístico, exige a lealdade na competição, o respeito do próprio corpo, o sentido de solidariedade e de altruísmo e depois também a alegria, a satisfação e a festa. Tudo isto pressupõe um caminho de autêntica maturação humana, feito de renúncias, de tenacidade, de paciência e sobretudo de humildade, que não é aplaudida mas constitui o segredo da vitória.

Um desporto que pretenda ter um sentido pleno para quem o pratica deve estar sempre ao serviço da pessoa. Não está em jogo só o respeito das regras, mas a visão do homem, do homem que pratica desporto e que, ao mesmo tempo, precisa de educação, de espiritualidade e de valores transcendentes. Com efeito, o desporto é um bem educativo e cultural, capaz de revelar o homem a si mesmo e levá-lo a compreender o valor profundo da sua vida. O Concílio Ecuménico Vaticano II fala do desporto na Constituição pastoral Gaudium et spes, no amplo quadro das relações entre a Igreja e o mundo contemporâneo, e situa-o no sector da cultura, ou seja, no âmbito no qual se evidencia a capacidade interpretativa da vida, da pessoa e das relações. O Concílio deseja que o desporto contribua para afinar o espírito do homem, consinta que as pessoas se enriqueçam com o conhecimento recíproco, ajude a manter o equilíbrio da personalidade, favoreça as relações fraternas entre os homens de todas as condições, de nações e estirpes diversas (cf. n. 61). Em síntese, uma cultura do desporto fundada na primazia da pessoa humana; um desporto ao serviço do homem e não o homem ao serviço do desporto.

A Igreja interessa-se pelo desporto, porque se preocupa pelo homem, por todo o homem, e reconhece que a actividade desportiva incide sobre a educação, formação, relações e a espiritualidade da pessoa. Disto é testemunho a presença de espaços lúdicos e desportivos nos oratórios paroquiais e nos centros juvenis; demonstram-no as associações desportivas de inspiração cristã, que são ginásios de humanidade, lugares de encontro nos quais cultivar também aquele desejo forte de vida e de infinito que há nos adolescentes e nos jovens. O atleta que vive integralmente a própria experiência torna-se atento ao projecto de Deus para a sua vida, aprende a ouvir a sua voz nos longos tempos de treino, a reconhecê-lo no rosto do companheiro, e também do adversário de competição! A experiência desportiva pode «contribuir para responder às perguntas profundas que as novas gerações fazem acerca do sentido da vida, da sua orientação e da sua meta» (João Paulo II, Discurso ao Centro Desportivo Italiano, 26 de Junho de 2004, 2), quando é vivida em plenitude; sabe educar para os valores humanos e ajuda à abertura ao transcendente. Portanto, penso em vós, queridos atletas, como em campeões-testemunhas, com uma missão para cumprir: espero que sejais, para quantos vos admiram, válidos modelos para imitar. Mas também vós, queridos Dirigentes, assim como os treinadores, os diversos agentes desportivos, estais chamados a ser testemunhas de boa humanidade, cooperadores com as famílias e com as instituições formativas na educação dos jovens, mestres de uma prática desportiva que seja sempre leal e transparente. A pressão para obter resultados significativos nunca deve levar a empreender atalhos como acontece no caso do doping. O mesmo espírito de equipe sirva de estímulo para evitar estes becos cegos, mas também de apoio a quem reconhece que errou, de modo que se sinta acolhido e ajudado.

Queridos amigos, neste Ano da fé gostaria de frisar que a actividade desportiva pode educar a pessoa também para o «agonismo» espiritual, ou seja, para viver todos os dias procurando fazer vencer o bem sobre o mal, a verdade sobre a mentira, o amor sobre o ódio, e isto antes de tudo em si mesmos. Pensando depois no compromisso da nova evangelização, também o mundo do desporto pode ser considerado um moderno «átrio dos gentios», ou seja, uma oportunidade preciosa de encontro para todos, crentes e não crentes, no qual experimentar a alegria e também a fadiga de se confrontar com pessoas diversas por cultura, língua e orientação religiosa.

Gostaria de concluir recordando a luminosa figura do beato Pier Giorgio Frassati: um jovem que reunia em si a paixão pelo desporto — gostava sobretudo das escaladas na montanha — e a paixão por Deus. Queridos atletas, convido-vos a ler a sua biografia: o beato Pier Giorgio mostra-nos que ser cristãos significa amar a vida, amar a natureza, mas sobretudo amar o próximo, em particular as pessoas em dificuldade. Desejo também que cada um de vós saboreie a maior alegria: a de vos melhorardes dia após dia, conseguindo amar sempre um pouco mais. Pedimos isto como dom ao Senhor Jesus para este Natal. Agradeço-vos por terdes vindo e abençoo de coração a todos vós e aos vossos familiares.



ARTIGO PARA O JORNAL INGLÊS «FINANCIAL TIMES» 20 de Dezembro de 2012

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«Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus» foi a resposta de Jesus quando lhe perguntaram o que pensava sobre o pagamento dos impostos. Obviamente, os que o interrogavam desejavam preparar-lhe uma armadilha. Queriam obrigá-lo a tomar uma posição no debate político inflamado sobre a dominação romana na terra de Israel. E o que estava em jogo era ainda mais: se Jesus era realmente o Messias esperado, então certamente ter-se-ia oposto aos dominadores romanos. Portanto, a pergunta era calculada para o desmascarar como uma ameaça para o regime ou como um impostor. A resposta de Jesus leva habilmente a questão a um nível superior, atestando com fineza contra a politização da religião e a deificação do poder temporal, e contra a incansável busca da riqueza. Os seus interlocutores deviam entender que o Messias não era César, e que César não era Deus. O reino que Jesus vinha instaurar era de uma dimensão absolutamente superior. Como respondeu a Pôncio Pilatos: «O meu reino não é deste mundo».

As narrações de Natal do Novo Testamento têm a finalidade de expressar uma mensagem semelhante. Jesus nasceu durante um «recenseamento do mundo inteiro», desejado por César Augusto, o imperador famoso por ter levado a Pax Romana a todas as terras submetidas ao domínio romano. E no entanto, este menino, nascido num obscuro e distante recanto do império, estava para oferecer ao mundo uma paz muito maior, verdadeiramente universal nas suas finalidades e para além de qualquer limite de espaço e de tempo.

Jesus é-nos apresentado como herdeiro do rei David, mas a libertação que ele trouxe ao próprio povo não dizia respeito à vigilância dos exércitos inimigos; ao contrário, tratava-se de vencer o pecado e a morte para sempre. O Menino Jesus, vulnerável e débil em termos mundanos, tão diverso dos dominadores terrenos, é o verdadeiro rei do céu e da terra.

O nascimento de Cristo desafia-nos a reconsiderar as nossas prioridades e valores, o nosso modo de viver. E enquanto o Natal é sem dúvida um tempo de grande alegria, é também uma ocasião para uma reflexão profunda, aliás, um exame de consciência. No fim de um ano que significou privações económicas para muitos, o que podemos aprender da humildade, da pobreza, da simplicidade da imagem do presépio?

A narração do Natal pode introduzir-nos a Cristo, tão indefeso e tão facilmente abordável. O Natal pode ser o tempo no qual aprendemos a ler o Evangelho, a conhecer Jesus não só como o Menino da manjedoura, mas como aquele no qual reconhecemos o Deus que se fez Homem.

É no Evangelho que os cristãos encontram inspiração para a vida diária e para o seu envolvimento nas questões do mundo — quer isto aconteça no Parlamento quer na Bolsa. Os cristãos não deveriam fugir do mundo; ao contrário, deviam ter zelo por ele. Mas a sua participação na política e na economia deveria transcender qualquer forma de ideologia.

Os cristãos combatem a pobreza porque reconhecem a dignidade suprema de todos os seres humanos, criados à imagem de Deus e destinados à vida eterna. Os cristãos lutam por uma partilha equilibrada dos recursos da terra porque estão convictos de que, como administradores da criação de Deus, temos o dever de zelar pelos mais débeis e vulneráveis, agora e no futuro. Os cristãos opõem-se à avidez e à exploração, convictos de que a generosidade e um amor abnegado, ensinados e vividos por Jesus de Nazaré, são o caminho que leva à plenitude da vida. A fé cristã no destino transcendente de cada ser humano implica a urgência da tarefa de promover a paz e a justiça para todos. Dado que tais fins são partilhados por muitos, é possível uma grande e frutuosa colaboração entre os cristãos e os outros. Todavia, os cristãos dão a César só o que é de César, mas não o que pertence a Deus. Às vezes ao longo da história os cristãos não podiam aceitar as exigências feitas por César. Desde o culto do imperador da antiga Roma até aos regimes totalitários do século que acabou de transcorrer, César procurou ocupar o lugar de Deus. Quando os cristãos rejeitaram ajoelhar-se diante dos falsos deuses propostos nos nossos tempos, não foi porque tinham uma visão antiquada do mundo. Pelo contrário, isto acontece porque estão livres dos vínculos da ideologia e são animados por uma visão tão nobre do destino humano, que não possa aceitar comprometimentos em relação a nada que o possa ameaçar.

Na Itália, muitos presépios são adornados com ruínas dos antigos edifícios romanos como pano de fundo. Isto demonstra que o nascimento do Menino Jesus marcou o fim da antiga ordem, o mundo pagão, no qual as reivindicações de César pareciam impossíveis de desafiar. Agora temos um rei novo, o qual não confia na força das armas, mas no poder do amor. Ele traz esperança a todos os que, como ele mesmo, vivem à margem da sociedade. Traz esperança a quantos são vulneráveis nos destinos mutáveis de um mundo precário. Desde a manjedoura, Cristo chama-nos a viver como cidadãos do seu reino celeste, um reino que cada pessoa de boa vontade pode ajudar a construir aqui na terra.



L'Osservatore Romano, edição em português, n. 51, 22 de Dezembro de 2012




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