Discursos João Paulo II 2002 - Sábado, 14 de setembro de 2002

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


À SUPERIORA-GERAL DO INSTITUTO


DAS IRMÃS MÍNIMAS DE


NOSSA SENHORA DO SUFRÁGIO








À Reverenda Madre Fabíola DETOMI
Superiora-Geral do Instituto das Irmãs Mínimas de Nossa Senhora do Sufrágio


1. Desejo, antes de mais nada, transmitir-lhe a minha saudação de bons votos por ocasião do Capítulo Geral da Congregação. Dirijo-a, depois, às Irmãs chamadas ao serviço de orientação e de animação da vossa Família religiosa, encorajando-as a desempenhar com generosidade a delicada tarefa de governo que lhes foi confiada. Faço-a também extensiva às Religiosas reunidas em Capítulo, desejando-lhes que a experiência destes intensos dias passados em Roma seja fonte de enriquecimento humano e espiritual. Por fim, o meu pensamento cordial chegue a cada uma das Irmãs Mínimas de Nossa Senhora do Sufrágio que trabalham na Itália, na Argentina, na Colômbia e na Roménia, com a certeza do meu apoio paterno.

A Assembleia capitular constitui uma importante ocasião para reflectir sobre o caminho comunitário até agora percorrido, assim como para elaborar projectos de serviço apostólico, na fidelidade ao carisma originário do Instituto. O tema "Testemunhar Cristo, nossa esperança, num mundo em mudança" está em sintonia com as orientações pastorais do Episcopado italiano para a primeira década do novo século e milénio.

Reverenda Madre, é desejo comum desta Família religiosa retomar as actividades com renovado entusiasmo, depois da pausa do Capítulo, realçando que Cristo, nossa esperança, está na base de tudo e é o fim para o qual tudo está orientado. A sua misteriosa presença mantém viva aquela tensão escatológica, que todos os crentes devem sentir. A vossa Congregação considera esta tensão escatológica da existência como uma das suas características fundamentais, que recebeu em herança do Beato Fundador.

2. A vida do Beato Francisco Faà di Bruno foi imbuída de esperança, o qual tive a alegria de elevar às honras dos altares no dia 25 de Setembro de 1988. Sempre animado pela ansiedade interior de cooperar na salvação dos irmãos, preocupou-se pelo destino final deles. De facto, a meta derradeira do homem é o encontro com Deus, para o qual é preciso preparar-se desde já com um constante empenho ascético, rejeitando o mal e praticando o bem.

Desde jovem, ele sentiu a preocupação de trabalhar pela salvação das almas e por isso quis, ainda antes de fundar a Congregação, constituir em Turim um templo dedicado a Nossa Senhora do Sufrágio. Preocupar-se com o "sufrágio" pelas almas do purgatório: eis, Reverenda Madre e queridas Irmãs, o vosso carisma característico, que vos estimula a uma constante oração por quantos nos precederam. Esta mesma intuição carismática é um estímulo concreto a cumular todos os vossos dias terrenos com os bens que não são passageiros, nem perecem.

Trata-se de uma verdade importante que desejais anunciar com a vossa actividade de evangelização, apoiada pela oração e acompanhada pela aceitação e pela oferenda ao Deus do sofrimento, em união com o sacrifício de Cristo, para que as almas se salvem. A primeira e mais nobre forma de caridade pelos irmãos é a ansiedade pela sua salvação eterna. O amor cristão não conhece confins e elimina até os limites do espaço e do tempo, permitindo-nos amar todos os que já deixaram esta terra.

3. Caríssimas Irmãs em Cristo, mantende íntegro o espírito do Fundador! Apraz-me repetir-vos hoje quanto afirmei por ocasião da sua beatificação. Francisco Faà di Bruno disse nessa ocasião é "um gigante da fé e da caridade", porque a sua mensagem de luz e de amor, "longe de se esgotar, se revela mais actual do que nunca, estimulando à acção todos os que têm a peito os valores evangélicos" (Insegnamenti X/3 [1988], pág. 948).

Seguindo o seu exemplo, prossegui com fidelidade e coragem pelo caminho empreendido, haurindo luz e força do seu ensinamento e tornando viva e actual a sua extraordinária experiência e a sua luminosa herança. Sereis sobretudo incansáveis e alegres anunciadoras de esperança à humanidade do nosso tempo, com muita frequência obscurecida por violências e injustiças e fechada em horizontes meramente terrenos. Imitando o vosso Beato, renovai-vos a vós mesmas primeiro na esperança para poderdes ser, por vossa vez, fecundas portadoras dela na Igreja e no mundo. Tende "sede" de almas para salvar, ajudando cada irmão e irmã a descobrir aquele "ainda não" e aquele "além" eterno, para o qual todos estamos encaminhados. O futuro eterno constrói-se desde agora, no tempo, através da canseira de todos os dias.

Com estes sentimentos e votos, invoco sobre vós, caríssimas Irmãs, sobre a vossa Comunidade e todos os que encontrardes no vosso serviço quotidiano, a celeste intercessão da Virgem do Sufrágio e do Beato Francisco Faà di Bruno, enquanto vos abençoo de coração, juntamente com todas as pessoas que vos são queridas.

Castelgandolfo, 2 de Setembro de 2002.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS ATLETAS DO "CLUBE DE FUTEBOL REAL MADRID"


16 de Setembro de 2002





Senhor Presidente
Senhoras e Senhores

É-me grato receber os membros da Junta Directiva, os técnicos e os desportistas do Clube de Futebol Real Madrid, assim como as pessoas que os acompanham. Agradeço ao Presidente deste Clube as amáveis palavras de saudação, com que quis interpretar os vossos sentimentos.

Como pude realçar durante o Jubileu dos Desportistas (cf. Discurso de 28 de Outubro de 2000), a Igreja considera o desporto como um instrumento de educação, quando fomenta elevados ideais humanos e espirituais, e quando forma de maneira integral os jovens nos valores como a lealdade, a perseverança, a amizade, a solidariedade e a paz. Ultrapassando a diversidade das culturas e das ideologias, o desporto é uma idónea ocasião de diálogo e de entendimento entre os povos, em ordem à construção da desejada civilização do amor.

Portanto, convido-vos a pôr em prática estes valores, assentes na dignidade da pessoa humana, diante dos possíveis interesses que podem ofuscar a nobreza do próprio desporto. Que nisto vos acompanhe sempre a protecção maternal da Virgem da Almudena, Padroeira de Madrid.

Enquanto vos renovo os meus agradecimentos pela vossa visita, concedo-vos com afecto a minha Bênção apostólica, que faço extensiva às vossas famílias.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


À SUPERIORA-GERAL DA CONGREGAÇÃO


DAS IRMÃS MINISTRAS DOS ENFERMOS


DE SÃO CAMILO







Reverenda Madre Tomasina GHEDUZZI
Superiora-Geral da Congregação
das Irmãs Ministras dos Enfermos de São Camilo

1. Por ocasião do Capítulo Geral, que a vê reunida nestes dias com as Irmãs Delegadas, sinto-me feliz por enviar a todas vós uma cordial saudação e a certeza da minha proximidade espiritual.

Provindes de vários países da Europa, da América Latina, da África e do Sudeste asiático: apraz-me saudar em cada uma de vós todas as irmãs de hábito, assim como as comunidades eclesiais em que elas estão empenhadas ao serviço dos doentes e dos que sofrem.

A Assembleia capitular constitui uma ocasião oportuna para rezar e reflectir sobre os desafios que interpelam a Igreja e o mundo neste particular período histórico. Ela oferece-vos também a ocasião para aprofundar, cada vez mais, o carisma que vos distingue, adaptando-o às exigências actuais.

A respeito disto, o pensamento dirige-se ao dia 6 de Maio de 1995, quando tive a alegria de proclamar Beata a vossa Fundadora, Madre Maria Domenica Brun Barbantini. Com profundo prazer tomei conhecimento de que aquele acontecimento de graça constituiu para toda a Congregação um motivo de renovada inspiração, e vos estimulou a aprofundar o conhecimento do vosso carisma e da vossa espiritualidade porque, haurindo dessas raízes a linfa mais genuína, a vivência e as actividades quotidianas continuam a ser por ela vivificadas e iluminadas.

2. É neste contexto que se compreende melhor o tema que escolhestes para o XXXII Capítulo Geral: "Para uma nova regra de vida". A novidade que vos propondes não é sem dúvida um desejo de mudar a orientação original mas, ao contrário, o fruto de uma investigação rigorosa e apaixonada sobre as fontes, um fruto que aspira a ser, se for possível, cada vez mais fiel às suas raízes, isto é, ao dom que o Senhor confiou à Beata Maria Domenica e às suas companheiras, para o bem da Igreja e da humanidade. Do pequeno grupo de mulheres, que com Maria Domenica quiseram chamar-se "oblatas enfermeiras", desenvolveu-se, também graças ao discernimento e ao encorajamento dos Pastores da Igreja, um Instituto hoje presente em nove países de três continentes.

O Espírito Santo, que "tira" sempre das riquezas inexauríveis de Cristo para distribuir na Igreja novos dons de luz e de graça (cf. Jo Jn 16,14), incutiu no coração e na vida da Fundadora uma vocação particular para servir os doentes, à imitação e como prolongamento do próprio ministério de Jesus, que se inclinou sobre todas as enfermidades humanas para as curar com o seu poder divino (cf. Lc Lc 10,30-35 Mt 4,23). Na sua misericórdia transbordante, o Filho de Deus fez-se próximo, tornando-se ele mesmo "servo sofredor" para nos curar a nós. Por isso, ele está presente nos irmãos mais pequeninos em dificuldade e espera que lhe abramos o nosso coração. Se a ele oferecemos o "pouco" que somos e temos, recebemos em troca o "tudo" que Ele é.

3. Como escreveu a Beata Fundadora nas Regras, as Irmãs devem agir com este espírito: elas "servirão nosso Senhor na pessoa das enfermas pobres com generosidade e pureza de intenções, sempre prontas a dar a própria vida por amor a Jesus, morto na cruz por nós" (I, 11). Para poder ser fiel a esta vocação, é indispensável alimentar a própria existência na oração, e de modo especial mediante a participação devota na santíssima Eucaristia, na qual Jesus torna sacramentalmente presente todos os dias o prodígio salvífico da sua paixão, morte e ressurreição. Permanecendo unidas e configuradas com ele, podeis ser para tantos irmãos e irmãs as suas mãos, o seu olhar e o seu coração, segundo o luminoso exemplo de São Camilo de Lélis.

Testemunhar a caridade seja o esforço incessante da vossa Congregação, caríssimas Irmãs, uma caridade que não conhece confins e que fala a língua de cada região do planeta. A humanidade contemporânea, provada por antigas e novas misérias e pobrezas, tem mais do que nunca necessidade de experimentar o amor e a misericórdia de Deus. Precisa de se sentir amada para amar e aceitar a vida. Vós trabalhais onde, infelizmente, não faltam graves atentados à vida por parte de uma cultura de morte, que tende a difundir-se cada vez mais nas sociedades marcadas pelo materialismo e pelo consumismo hedonista. Continuai, queridas Irmãs, a ter a solicitude e a trabalhar generosamente nesta "frente" apostólica. Trata-se de uma urgência pastoral, que pede para ser enfrentada com competência profissional e fervor apostólico.

4. Por conseguinte, para poder desempenhar esta missão exigente é necessário um empenho formativo de grande alcance e, oportunamente, o vosso Capítulo deseja realçar esta prioridade. É necessário promover a vida espiritual e, em sábia harmonia com ela, a dimensão cultural e profissional, a apostólica e a do carisma específico (cf. Exort. apost. Vita consecrata VC 71). Depois, deve prestar-se atenção ao aspecto comunitário: de facto, ele é uma parte integrante e decisiva do testemunho eclesial, muito mais nas comunidades de vida consagrada, chamadas a ser um sinal profético no meio do povo de Deus.

Caríssimas, acompanho estas minhas considerações com a certeza de uma particular recordação na oração, para que desça, serena e corroborante, a luz do Espírito Santo sobre cada uma de vós e os trabalhos do Capítulo.

A Virgem Maria, Saúde dos Enfermos, vos assista, e faça frutificar cada uma das vossas iniciativas. Ela vos dê a alegria e o amor de servir o seu Filho divino no próximo necessitado. Sirva-vos de conforto também a Bênção apostólica, que vos envio a vós e a toda a vossa Família religiosa.

Castelgandolfo, 12 de Setembro de 2002.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS ABADES E ÀS ABADESSAS


DA ORDEM CISTERCIENSE


DE ESTREITA OBSERVÂNCIA (TRAPISTAS)


19 de Setembro de 2002



1. A reunião dos dois Capítulos Gerais da venerável Ordem Cisterciense de Estreita Observância oferece-me a grata oportunidade de me encontrar convosco, queridos abades, abadessas e representantes dos monges e das monjas trapistas.

Obrigado por esta visita, mediante a qual desejais renovar a expressão da vossa fiel adesão ao Sucessor de Pedro. É com afecto que saúdo cada um de vós. Dirijo um pensamento especial e agradecido ao Pe. Bernardo Olivera, que se fez intérprete dos sentimentos de todos, explicando também a finalidade e os objectivos da vossa Assembleia. Através das vossas pessoas, saúdo os irmãos e as irmãs dos vossos respectivos mosteiros, espalhados por todas as regiões do mundo. O Papa agradece-vos porque, do silêncio dos vossos claustros, se eleva ao céu uma oração incessante pelo ministério e pelas intenções e as necessidades de toda a comunidade eclesial.

2. Caríssimos Irmãos e Irmãs! Congregastes-vos durante estes dias para reflectir sobre o modo de fazer com que o património espiritual de todos, conservando inalterado o espírito das origens, corresponda cada vez mais às exigências do momento presente. Também a seguir aos recentes e trágicos acontecimentos, cujo aniversário estamos a recordar precisamente nestes dias, a humanidade parece desorientada, à procura de seguranças: ela aspira à verdade e à paz!

Contudo, onde deverá procurar um refúgio seguro, se não em Deus? Somente na misericórdia divina como recordei na minha recente viagem à Polónia o mundo pode encontrar a paz e o homem consegue achar a felicidade. Deste segredo, escondido aos sábios e aos inteligentes, mas revelado aos pequeninos (cf. Mt Mt 11,25), os vossos mosteiros são testemunhas privilegiadas, desde há séculos.

Com efeito, desde o princípio os cistercienses caracterizaram-se por uma espécie de "paixão mística", mostrando que a procura sincera de Deus, através de um austero itinerário ascético, suscita a inefável alegria do encontro esponsal com Ele, em Cristo. A este respeito, São Bernardo ensina-nos que quem tem sede do Altíssimo não possui mais nada de pessoal, e já tem tudo em comum com Deus. Depois, acrescenta que a alma, nesta situação, "não pede liberdade, nem mercê, nem herança e nem sequer doutrina, mas o ósculo [de Deus], em jeito de esposa castíssima, ardente de santo amor e totalmente incapaz de esconder a chama com que arde" (São Bernardo, Super Cantica canticorum, 7, 2).

3. Esta elevada espiritualidade conserva todo o seu valor de testemunho no contexto cultural contemporâneo que, demasiadas vezes, incentiva o desejo de bens falazes e de paraísos artificiais. Com efeito, caríssimos Irmãos e Irmãs, a vossa vocação consiste em testemunhar, com a existência recolhida na Trapa, o excelso ideal da santidade, resumido no amor incondicional a Deus, Bondade infinita e, como reflexo, no amor que na oração inclui misticamente toda a humanidade.

O estilo de vida que vos caracteriza realça muito bem estes dois aspectos do amor. Vós não viveis como eremitas em comunidade, mas como cenobitas num deserto singular. Deus manifesta-se na vossa solidão pessoal, assim como na solidariedade que vos une aos membros da comunidade. Viveis sozinhos e separados do mundo para percorrer a senda da intimidade divina. Ao mesmo tempo, compartilhais esta experiência espiritual com outros irmãos e irmãs, num equilíbrio constante entre contemplação pessoal e união à liturgia da Igreja.

Conservai inalterado este património carismático! Ele constitui uma riqueza para todo o povo cristão.

4. Hoje, o crescimento da Ordem põe-vos, especialmente no longínquo Oriente, em contacto com diferentes tradições religiosas, com as quais é necessário manter um diálogo sábio e prudente para que brilhe em toda a parte, na pluralidade das culturas, a única luz de Cristo. Jesus é o sol resplandecente, do qual a Igreja deve ser um reflexo fiel, segundo a expressão "mysterium lunae", muito querida à contemplação dos Padres. Esta tarefa, como escrevi na Carta Apostólica Novo millennio ineunte, faz tremer, se tivermos em consideração a fragilidade humana, mas torna-se possível se nos abrirmos à graça renovadora de Deus (cf. n. 55).

Caríssimos Irmãos e Irmãs, não vos desanimem as dificuldades e as provações, por mais dolorosas que sejam. A este propósito, penso nos sete monges de Nossa Senhora de Atlas, em Tibhirine, na Argélia, barbaramente assassinados em Maio de 1996. O seu sangue derramado seja semente de numerosas e santas vocações para os vossos mosteiros na Europa, onde é mais sensível o envelhecimento das comunidades de monges e de monjas, e nas outras regiões do planeta, onde se apresenta outra urgência, ou seja, a de assegurar a formação aos não poucos aspirantes à vida cisterciense. Além disso, formulo votos a fim de que uma coordenação mais orgânica entre os diversos ramos da Ordem torne mais eloquente o testemunho do carisma comunitário.

5. "Duc in altum! (Lc 5,4). Caríssimos Irmãos e Irmãs, dirijo-vos também a vós o convite de Jesus a fazer-vos ao largo; este convite ressoou para todo o povo cristão, no termo do Grande Jubileu do Ano 2000. Progredi sem temor ao longo do caminho empreendido, animados pelo "bom zelo" de que São Bento fala na sua Regra, sem nada antepor a Cristo (cf. cap. LXXII).

Acompanhe-vos vigilante Maria, a Virgem Santa e, juntamente com Ela, protejam-vos os Santos e os Beatos da Ordem. O Papa assegura-vos a lembrança constante na oração e, de coração, vos abençoa a vós aqui presentes, e também as vossas respectivas comunidades monásticas.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


À SUPERIORA-GERAL DA CONGREGAÇÃO


DAS IRMÃS HOSPITALEIRAS DA MISERICÓRDIA


: À Reverenda Madre Aurélia DAMIANI
Superiora-Geral da Congregação das Irmãs Hospitaleiras da Misericórdia


1. Sinto-me feliz por lhe dirigir, bem como às Irmãs de hábito, o meu cordial pensamento por ocasião do XLII Capítulo Geral, que vos vê empenhadas na busca concorde da vontade de Deus a respeito do vosso Instituto, neste particular momento da história, no início de um novo milénio.

Faço extensiva a expressão do meu apreço fraterno a todas as Irmãs Hospitaleiras da Misericórdia, que desempenham a sua missão na Itália e noutras nações. Como é precioso, queridas Irmãs, o serviço que prestais a tantas pessoas necessitadas, com profundo zelo pastoral.

Como é grande o mérito da vossa missão! Empenhando-vos no âmbito hospitalar, levais alívio a doentes e pessoas que sofrem, e dais-lhes o testemunho da providencial misericórdia divina.

Mantende sempre vivo este carisma particular, selado com o vínculo de um voto especial.

2. Todos os dias, à cabeçeira dos doentes e em contacto com os seus familiares e com o pessoal médico, tendes ocasião de dar a todos um eloquente testemunho evangélico, em plena fidelidade ao mandato de Cristo: "Ide, anunciai o Reino de Deus e curai os enfermos" (cf. Lc Lc 5,1-2).

Trata-se de uma das mais urgentes formas de evangelização a que, como tivestes a oportunidade de recordar por ocasião do Grande Jubileu do Ano 2000, e ainda mais neste Capítulo, a vossa Família religiosa deseja dedicar-se, aprofundando o sentido e as modalidades concretas desta vossa tarefa. Exercei assim aquela "fantasia da caridade", da qual falei na Carta apostólica Novo millennio ineunte, admoestando que ela deve alargar-se "não só nem sobretudo na eficácia dos socorros prestados, mas na capacidade de pensar e ser solidário com quem sofre" (n. 50).

Situa-se nesta perspectiva o tema do Capítulo: "Radicadas na caridade, para viver e testemunhar a Misericórdia de Cristo, Bom Samaritano de todos os tempos e de todas as culturas".

Aos irmãos e às irmãs que se encontram em necessidade deveis garantir, com as palavras e os exemplos, que "não existe para o homem outra fonte de esperança, sem a misericórdia de Deus" (João Paulo II, Homilia na consagração do Santuário da Misericórdia Divina em Lagiewniki [Polónia]).

3. De facto, situa-se nesta linha toda a vossa história desde as origens, quando nascestes para cuidar dos enfermos do Estado Pontifício. Reconhecendo a necessidade mais urgente do tempo, a Princesa Teresa Orsini Doria Pamphili, ajudada pelo Cardeal Giuseppe António Sala e com o apoio do Papa Pio VII, deu início à vossa Congregação no Hospital de São João em Roma.

Juntamente convosco, agradeço ao Senhor que, por meio do seu Espírito, fez surgir na Igreja o vosso Instituto para servir Cristo nos doentes, e encorajo-vos de bom grado a nunca faltar a este empenho de amor e de fidelidade a Deus e à Igreja, tornando presente nas situações de hoje o carisma típico que vos distingue e que representa um dom para toda a sociedade.

O desafio da inculturação pede hoje aos crentes que anunciem a Boa Nova com linguagem e modos que sejam compreensíveis aos homens deste tempo. Uma missão urgente e amplas perspectivas apostólicas abrem-se também para vós, queridas Irmãs Hospitaleiras da Misericórdia. De um discernimento atento das modernas realidades sócio-culturais provêm indicações concretas para que a presença do vosso Instituto seja mais incisiva no âmbito da cura da saúde, descobrindo ao mesmo tempo percursos mais adequados para a penetração apostólica.

Tende sempre diante dos vossos olhos o rosto sofredor de Cristo. Voltai a partir dele, todos os dias, com coragem humilde para serdes testemunhas do seu amor misericordioso no vasto campo da doença e do sofrimento. Como escrevi na mencionada Carta Novo millennio ineunte, "não se trata de inventar um programa novo. O programa já existe: é o mesmo de sempre, expresso no Evangelho e na Tradição viva. Concentra-se, em última análise, no próprio Cristo" (n. 29).

4. Sei muito bem, Reverenda Madre, como é preciosa a obra de quantos estão quotidianamente ao serviço dos doentes, e conheço as numerosas dificuldades que se vos apresentam. Encontrareis a força para as superar todas, se vos esforçardes por ver Cristo em cada pessoa. Mas é necessário que nunca falte esta tensão espiritual na vossa difícil actividade apostólica. Por conseguinte, vivificai o vosso dia com uma oração intensa e vigilante.

O modelo em que se inspirar é Maria, Mãe de misericórdia e imagem de profunda adesão à vontade de Deus. Confio-lhe o vosso Capítulo Geral, para que dele provenham escolhas corajosas e sábias para todo o Instituto; escolhas feitas com o olhar sempre fixo no rosto de Cristo.

Com estes sentimentos concedo-lhe de coração, bem como ao seu Conselho, às Capitulares e a todas as Irmãs Hospitaleiras da Misericórdia, uma especial Bênção apostólica.

Castelgandolfo, 14 de Setembro de 2002.





DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS BISPOS DOS REGIONAIS OESTE 1 - 2


DO BRASIL EM VISITA "AD LIMINA APOSTOLORUM"


Sábado, 21 de setembro de 2002





Queridos Irmãos no Episcopado

1. É para mim motivo de alegria receber-vos hoje, Arcebispos e Bispos das Províncias eclesiásticas dos Regionais Oeste 1 e 2, correspondentes respectivamente ao Mato Grosso do Sul e ao Mato Grosso, que viestes a Roma para renovar vossa fé diante do túmulo dos Apóstolos.

Esta é a primeira vez que a Diocese de Juína e a Prelazia de Paranatinga, erigidas no último qüinqüênio, efetuam a Visita ad Limina, com a qual todos os Bispos reafirmam o seu vínculo de comunhão com o Sucessor de Pedro.

Agradeço de coração a D. Bonifácio Piccinini, Arcebispo de Cuiabá, a saudação que me dirigiu em nome de todos e, a cada um de vós, agradeço também a oportunidade que me foi proporcionada, nas entrevistas particulares, de conhecer o sentir das Comunidades a quem servis como Pastores, participando assim no anelo de que vosso rebanho cresça «em todas as coisas [...] nAquele que é a Cabeça, o Cristo» (Ep 4,15).

Com o objetivo de encorajar a vossa solicitude pastoral desejo agora compartilhar convosco algumas reflexões, sugeridas pela situação concreta em que exerceis o ministério de dar a conhecer e «anunciar o Mistério de Cristo» (Col 4,3).

2. A visita ad Limina dos sucessivos e numerosos grupos de Pastores que formam o Episcopado do Brasil vai marcando caminho e realizando uma forte experiência de comunhão, afetiva e efetiva, através de tantos e enriquecedores diálogos, que quis ressaltar no precedente encontro com o grupo amazonense. Constato com satisfação o esforço que estais realizando, tanto de maneira conjunta como nas diversas dioceses, por forjar uma comunidade eclesial repleta de vitalidade e evangelizadora, que vive uma profunda experiência cristã alimentada pela palavra de Deus, pela oração e pelos sacramentos, coerente com os valores evangélicos na sua existência pessoal, familiar e social.

Dentro da vasta e empolgante responsabilidade que vos é própria, quero deter-me hoje sobretudo na colaboração dos fiéis leigos na vida diocesana, mas sobretudo no sagrado ministério dos sacerdotes.

Não é novidade de que vosso País conta o maior número de batizados na Igreja católica em todo o mundo. Na esteira do Concílio Vaticano II, do Sínodo dos Bispos de 1987 e da Exortação Apostólica Christifideles laici, que é o seu fruto, houve um destaque a propósito da identidade dos leigos fundada na «radical novidade que promana do Batismo» (nº 10). A chamada feita a todos os membros do Corpo Místico de Cristo, a participar ativamente na edificação do Povo de Deus, ressoa continuamente nos documentos do Magistério (cf. Lumen gentium LG 3 Decr. Apostolicam actuositatem AA 24).

3. Em 1997 voltou à luz este princípio no qual se reafirmou a identidade própria, na dignidade comum e na diversidade de funções, dos fiéis leigos, dos ministros sagrados e dos consagrados (cf. Instr. sobre a colaboração dos fiéis leigos no sagrado ministério dos sacerdotes, Premissa). É importante refletir sobre esta participação, para realizá-la na maneira mais oportuna, especialmente nas comunidades que normalmente constituem a vida das dioceses e, em torno as quais, seus membros colaboram ativamente.

A Igreja nasce da «disposição totalmente livre e misteriosa da sabedoria e bondade do Pai» (LG 2) de salvar todos os homens através do seu Filho e no Espírito Santo. «De unitate Patris et Filii et Spiritus Sancti plebs adunata»: assim descreve a Igreja o Bispo e mártir S. Cipriano (De Orat. dom. 23; PL 4,553). Cristo, ao fundar a sua Igreja, o faz não como uma simples instituição que se auto-sustentaria juridicamente e na qual se inseririam os homens para alcançar a salvação. Ela é bem mais do que isto. O Pai chamou homens e mulheres, para que constituíssem um Povo de filhos no Filho, em Cristo, mediante a carne imolada do seu Filho feito homem; dito de outro modo, para que fossem Corpo de Cristo.

O Concílio abriu-se a uma visão positiva da índole peculiar dos fiéis leigos, a qual tem como específico «procurar o Reino de Deus tratando das coisas temporais e ordenando-as segundo Deus» (LG 31). Os que vivem no mundo, e dele haurem sua matéria-prima de santificação, procuram transformar as realidades humanas a fim de favorecer o bem comum familiar, social e político, mas sobretudo para elevá-las a Deus, glorificando o Criador e vivendo cristãmente entre os seus semelhantes.

Alguns dos senhores bispos aqui presentes recordarão que, por ocasião do meu Encontro com o Laicato católico de Campo Grande, em 1991, quis recordar as «diversas formas de participação orgânica dos leigos na única missão da Igreja-comunhão», justamente na situação, no lugar que Deus dispôs que estes ocupassem no mundo (nº 1).

A Igreja tem a finalidade de continuar no mundo a missão salvífica de Cristo. Ao longo da história, ela se compromete realizar este mandato com a luz do Espírito Santo mediante a ação dos seus membros, nos limites da função própria que cada qual exerce dentro do Corpo Místico de Cristo.

4. Entre os objetivos da reforma litúrgica, estabelecida pelo Concílio Vaticano II, estava a necessidade de levar «todos fiéis àquela participação nas cerimônias litúrgicas, que exige a mesma natureza da liturgia, e à qual o povo cristão "linhagem escolhida, sacerdócio real, gente santa, povo de conquista" (1P 2,9) tem direito e obrigação em virtude do Batismo» (SC 14).

Na prática, porém, nos anos posteriores ao Concílio, a fim de dar cumprimento a tal desejo, foi-se estendendo arbitrariamente «a confusão de funções naquilo que se refere ao ministério sacerdotal e à função dos leigos: a recitação indiscriminada e comum da oração eucarística, homilias pronunciadas por leigos, distribuição da Comunhão por parte dos leigos, enquanto que os sacerdotes se eximem» (Instr. Inestimabile donum» 3/04/1980, Premissa).

Tais graves abusos práticos tiveram com freqüência sua origem nos erros doutrinais, sobretudo quanto à natureza da Liturgia, do sacerdócio comum dos cristãos, da vocação e missão dos leigos e quanto ao ministério ordenado dos sacerdotes.

Veneráveis Irmãos no Episcopado, o Concílio, como sabem, «considerou a Liturgia como exercício da função sacerdotal de Cristo. Nela, os sinais sensíveis significam e, cada um à sua maneira, realizam a santificação dos homens; nela, o Corpo Místico de Jesus Cristo, Cabeça e membros, presta a Deus o culto público integral» (SC 7).

A Redenção é totalmente realizada por Cristo. No entanto, nesta obra tão grande, pela qual Deus é perfeitamente glorificado e os homens santificados, nosso Salvador associa sempre consigo sua Esposa amadíssima, a Igreja (cf. SC SC 7). Através da Liturgia, o Senhor «continua na sua Igreja, com ela e por ela, a obra da nossa redenção» (Catecismo da Igreja Católica CEC 1069).

A Liturgia é ação de todo o Corpo Místico de Cristo, Cabeça e membros (ib., 1071). É ação de todos os fiéis, porque todos participam do sacerdócio de Cristo (ib., 1141 e 1273). Mas nem todos têm a mesma função, porque nem todos participam do mesmo modo no sacerdócio de Cristo. Pelo Batismo, todos os fiéis participam do sacerdócio de Cristo; é o que veio a chamar-se de "sacerdócio comum dos fiéis". Além deste sacerdócio, e para servi-lo, existe outra participação na missão de Cristo: a do ministério conferido pela Sacramento da Ordem (Catecismo da Igreja Católica CEC 1591), ou seja o "sacerdócio ministerial". «O sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial, embora se diferenciem essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se mutuamente um ao outro; pois um e outro participam, a seu modo do único sacerdócio de Cristo.

Com efeito, o sacerdócio ministerial pelo seu poder sagrado, forma e conduz o povo sacerdotal, realiza o sacrifício eucarístico fazendo as vezes de Cristo e oferece-o a Deus em nome de todo o povo; os fiéis, por sua parte, concorrem para a oblação da Eucaristia em virtude do seu sacerdócio real, que eles exercem na recepção dos sacramentos, na oração e na ação de graças, no testemunho da santidade de vida, na abnegação e na caridade» (LG 10).

5. O prescindir-se desta diferença essencial, e da mútua ordenação entre sacerdócio ministerial e sacerdócio comum dos fiéis, teve repercussões imediatas nas celebrações litúrgicas - ações da Igreja organicamente estruturada.

Quis recordar aquelas declarações do Magistério da Igreja, na certeza de que, mesmo conhecendo-as, possam tornar a expô-las com simplicidade para que os leigos evitem de realizar na liturgia as funções que são de exclusiva competência do sacerdócio ministerial, pois só este age especificamente in persona Christi capitis.

Já tive ocasião de referir-me à confusão e, às vezes, à equiparação entre sacerdócio comum e sacerdócio ministerial; à escassa observância de certas leis e normas eclesiásticas, à interpretação arbitrária do conceito de "suplência"; à tendência da "clericalização" de fiéis leigos, etc..., assinalando a necessidade de que «os pastores estejam vigilantes para que se evite um fácil e abusivo recurso a supostas "situações de emergência" ou de "necessária suplência", alí onde não se verificam objetivamente ou onde é possível solucionar com um programa pastoral mais racional (CfL, 23).

Desejo recordar aqui, que os fiéis não-ordenados podem exercer certas tarefas ou funções de colaboração no serviço pastoral, quando são expressamente habilitados para tanto pelos seus respectivos Pastores sagrados (...) e de acordo com as prescrições do direito (cân. 228,1). Igualmente, não gozam de direito a voz ativa ou passiva no conselho presbiteral os diáconos, os fiéis não ordenados, bem como os presbíteros que tenham perdido o estado clerical ou que, de algum modo, tiverem abandonado o ministério sagrado (Instr. sobre a colaboração dos fiéis leigos no sagrado ministério dos sacerdotes, Art.5).

Enfim, lembro ainda que os componentes do Conselho Pastoral diocesano ou paroquial gozam exclusivamente de voto consultivo, não podendo, por isso, tornar-se deliberativo (ib.). O Bispo ouvirá os fiéis, clérigos e leigos, para formar-se uma opinião, embora estes não possam formular o juízo definitivo da Igreja, que cabe ao Bispo discernir e pronunciar, não por mera questão de consciência, mas como Mestre da Fé (cân. 212 e 512,2). Deste modo, se evitará que o Conselho Pastoral possa ententer-se de modo impositivo como orgão representativo ou porta-voz dos fiéis da Diocese.

6. Dentro de um contexto mais amplo, mas sem querer afastar-me destas considerações que vos venho fazendo, desejo também referir-me ao tema da restauração do Diaconado-permanente para homens casados, que constituiu um importante enriquecimento para a missão da Igreja após o Concílio.

De fato, o Catecismo da Igreja Católica considera sua conveniência «na vida litúrgica e pastoral, e nas obras sociais e caritativas» (1571). A colaboração que o diácono-permanente presta à Igreja, de modo especial onde há falta de presbíteros é, sem dúvida, de grande benefício na vida eclesial. Existe no Brasil a Comissão Nacional dos Diáconos, que tem a função de zelar a fim de que a índole do seu serviço possa atuar, sob a autoridade dos bispos, onde for requerido para o bem do povo fiel. Certamente o serviço do diácono-permanente é e será sempre limitado às prescrições do direito, pois cabe aos presbíteros exercer a plena potestade ministerial; evita-se, desta forma, o risco da ambigüidade que pode confundir os fiéis, sobretudo nas celebrações litúrgicas.

Os pastores devem, porém, sentir a necessidade de estimular a pastoral vocacional de jovens que, por amor a Deus e à sua Igreja, queiram entregar-se no celibato apostólico real e definitivo - com retidão moral e autentica liberdade espiritual - à causa de Deus. A proposta do celibato sacerdotal por parte da Igreja é clara nas suas exigências: abraça a perfeita continência pelo Reino dos Céus.

7. Ao terminar este encontro, peço-vos encarecidamente que sejais portadores da minha cordial lembrança aos vossos diocesanos matogrossenses. Tenho especialmente presente os jovens no início da sua caminhada eclesial. Tornai-vos participantes da experiência daquelas comunidades diocesanas mais antigas e animai-vos a viver com alegria a fé em Cristo, nosso Salvador.

Confio vossos propósitos e projetos pastorais à proteção materna da Virgem Maria, que com tanto fervor é sempre invocada no Brasil como a Senhora Aparecida. Aproveito também para saudar, por vosso intermédio, os presbíteros e todos os ministros da Igreja, os diáconos-permanentes, as comunidades de consagrados, as paróquias, as Associações cristãs, as famílias, os anciãos e os que sofrem todo tipo de penas físicas ou morais; lembro também com alegria dos jovens e das crianças, objeto das minhas grandes esperanças; enfim, a todos os queridos diocesanos do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, desejo que levem a certeza do meu afeto e o meu encorajamento a viverem a própria vocação cristã em união com Deus Nosso Senhor e com o Sucessor de Pedro, com a ampla Bênção Apostólica que lhes dou de todo o coração.






Discursos João Paulo II 2002 - Sábado, 14 de setembro de 2002