DIscursos João Paulo II 2003

MENSAGEM DO COLÉGIO CARDINALÍCIO


APRESENTADA PELO CARDEAL JOSEPH RATZINGER


DECANO DO COLÉGIO




Caríssimos Irmãos!

Reunimo-nos para dar graças pelos 25 anos de Pontificado do nosso venerado e amado Santo Padre João Paulo II. Estamos gratos ao Senhor por nos ter dado este pastor que, numa época cheia de confusão e de perigos, nos confirma a nós, seus irmãos, na fé (cf. Lc Lc 22,32). Num momento em que muitos não querem seguir mais o Senhor porque a Sua palavra lhes parece demasiado severa, ele, com as palavras de Pedro, diz-nos a todos: "Senhor, para quem havemos nós de ir? Tu tens palavras de vida eterna; e nós acreditamos e sabemos que és o Santo de Deus" (Jn 6,68 s.). Todo o Pontificado do nosso Santo Padre parece ser uma grande acção desempenhada para tornar presentes e eficazes entre nós estas palavras e esta decisão. Por conseguinte, o nosso agradecimento não pode dirigir-se apenas ao passado. Do mesmo modo em que os outros onze apóstolos reconheceram nas palavras de Pedro a expressão da sua fé, pondo-se de novo com ele no seguimento de Cristo, assim a palavra do Santo Padre nos pode indicar o caminho para encontrar, com renovada alegria em Cristo, as palavras de vida eterna e o caminho que conduz à salvação.

A primeira forma do nosso agradecimento é a oração, a acção de graças manifestada a Deus no santo sacrifício. Mas deve ser acompanhado pela escuta da mensagem e pelo pôr-se a caminho em companhia de Cristo. Por isso pensámos que uma renovada escuta de alguns elementos pudesse ser uma forma adequada de agradecimento.

Sem dúvida, a riqueza da mensagem que o Santo Padre nos ofereceu neste quarto de século faz com que seja impossível tratar completamente, em dois dias, mesmo só mencionando, tudo o que ele nos ofereceu em termos de doutrina e de indicações concretas. É suficiente pensar nas 14 encíclicas, que começam com um tríptico trinitário e desenvolvem depois os grandes temas da Igreja, da missão, da mariologia, da mensagem social da fé, do diálogo entre Igreja e mundo, entre fé e razão. Pensemos nas exortações pós-sinodais que derivam dos sínodos dos bispos como testemunho da união do colégio episcopal com o Papa.

Basta recordar os dois maravilhosos documentos doutrinais escritos no findar do milénio, "Tertio millennio adveniente" e "Novo millennio ineunte". Poderíamos prosseguir este elenco, mencionando as homilias pronunciadas por ocasião das viagens apostólicas, etc. Na escolha dos temas, tivemos que omitir tantas coisas muito significativas. Por outro lado, estes dias podem ser apenas um convite a ler de novo os grandes textos deste pontificado, e a transformá-los, com renovado impulso, em acção pastoral.

Não resta senão agradecer aos venerados irmãos do colégio cardinalício que nos falarão, em seis conferências, de temas fundamentais deste Pontificado, assim como a todos vós que viestes, muitos de longe, para participar neste nosso comum agradecimento e reflexão.

Que o Senhor abençoe estes dias!



SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE UM ÁGAPE FRATERNO


NA "DOMUS SANCTAE MARTHAE"


18 de Outubro de 2003

Senhores Cardeais

Estimados Irmãos no Episcopado

1. Conservo na alma a comovida recordação da solene Celebração eucarística de quinta-feira passada, que me fez reviver aquilo que aconteceu há vinte e cinco anos. Com alegria e gratidão, compartilho convosco este ágape fraterno. Assim, prolonga-se a experiência de intensa comunhão, vivida durante a interessante Assembleia promovida pelo Colégio cardinalício.

Agradeço de coração a cada um de vós, venerados Irmãos, a afectuosa proximidade de que me dais testemunho em todas as ocasiões. Dirijo o meu agradecimento de modo particular ao Cardeal Secretário de Estado, que se fez intérprete dos sentimentos de todos, e a todo o Colégio Cardinalício pela generosa oferta que me apresentou. Esta oferta será destinada às Comunidades cristãs da Terra Santa, tão duramente provadas.

2. Continuaremos a encontrar-nos nos próximos dias, primeiro por ocasião da Beatificação de Madre Teresa e depois na circunstância do Consistório. São dias repletos de significado, que põem em evidência a unidade e a vitalidade da Igreja.

Dirijo o meu pensamento reconhecido ao Director e aos funcionários desta casa, acolhedora e funcional, que nos hospeda, assim como a todos os que prepararam a nossa mesa.

3. Uma vez mais, obrigado, obrigado a todos vós pela vossa presença e pelo amor que nutris pela Igreja. Quando regressardes às vossas sedes, levai a minha saudação às vossas Comunidades eclesiais e assegurai aos vossos fiéis que o Papa os ama. Agradecei-lhes, de modo especial, as orações e a proximidade espiritual, que nestes dias eles demonstraram à minha pessoa. Com grande afecto, concedo-vos agora, a vós e às vossas comunidades, a minha Bênção.



SAUDAÇÃO DO PAPA JOÃO PAULO II


NO FINAL DO ESPECTÁCULO DE FOGOS DE ARTIFÍCIO


OFERECIDO PELA CIDADE DE ROMA


NO XXV ANO DE PONTIFICADO


Domingo, 19 de Outubro de 2003



"O espectáculo de fogos de artifício foi muito bonito.

Agradeço ao Presidente da Câmara Municipal de Roma esta iniciativa.

Agradeço-te de maneira particular a ti, querida Cidade de Roma, a mensagem de afecto, que quiseste manifestar-me também desta forma.

Que o Senhor te abençoe, a ti e a todos os teus habitantes!

Desejo uma boa noite a todos vós!".



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PEREGRINOS VINDOS A ROMA PARA


A BEATIFICAÇÃO DE MADRE TERESA DE CALCUTÁ


Segunda-feira, 20 de Outubro de 2003







Venerados Irmãos no Episcopado
Queridos Missionários
e Missionárias da Caridade
Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Saúdo-vos cordialmente e uno-me à vossa acção de graças a Deus com alegria pela beatificação de Madre Teresa de Calcutá. Sentia-me ligado a ela por uma grande estima e sincero afecto. Por isto sinto-me particularmente feliz por me encontrar convosco, suas filhas e filhos espirituais. Saúdo de modo especial a Irmã Nírmala, recordando o dia em que Madre Teresa veio a Roma para a apresentar pessoalmente. Faço o meu pensamento extensivo a todas as pessoas que pertencem à grande família espiritual desta nova Beata.

2. "Missionária da Caridade: Madre Teresa foi precisamente isto, de nome e de facto". Repito hoje comovido estas palavras, que pronunciei no dia seguinte à sua morte (Angelus de 7.9.1997).
Antes de mais, missionária. Não há dúvida de que a nova Beata foi uma das maiores missionárias do século XX. Desta mulher simples, proveniente de uma das áreas mais pobres da Europa, o Senhor fez um instrumento eleito (cf. Act Ac 9,15) para anunciar o Evangelho a todo o mundo não com a pregação, mas com gestos quotidianos de amor em benefício dos mais pobres. Missionária com a linguagem mais universal: a linguagem da caridade sem limites nem exclusões, sem preferências, a não ser em relação aos mais abandonados.

Missionária da caridade. Missionária de Deus que é caridade, que prefere os pequeninos e os humildes, que se inclina sobre o homem ferido no corpo e no espírito e derrama nas suas chagas "o óleo do conforto e o vinho da esperança". Deus realizou isto na Pessoa do seu Filho feito homem, Jesus Cristo, bom Samaritano da humanidade. Ele continua a fazê-lo na Igreja, sobretudo através dos Santos da caridade. Madre Teresa brilha de modo especial no meio desta multidão.

3. Onde foi que Madre Teresa encontrou a força para se dedicar completamente ao serviço do próximo? Encontrou-a na oração e na contemplação silenciosa de Jesus Cristo, do seu Santo Rosto, do seu Sagrado Coração. Ela mesma o disse: "O fruto do silêncio é a oração; o fruto da oração é a fé; o fruto da fé é o amor; o fruto do amor é o serviço, o fruto do serviço é a paz". A paz, mesmo ao lado dos moribundos, nas nações em guerra, na presença de ataques e de críticas hostis. Era uma oração que enchia o seu coração com a paz de Cristo e lhe permitia irradiar essa paz aos outros.

4. Missionária da caridade, missionária da paz, missionária da vida. Madre Teresa era tudo isto. Teresa era todas estas coisas. Pronunciava-se sempre em defesa da vida humana, mesmo quando a sua mensagem não agradava. Toda a existência de Madre Teresa foi um hino à vida. Os seus encontros quotidianos com a morte, a lepra, a Sida e todos os géneros de sofrimento humano fizeram com que ela fosse uma testemunha válida do Evangelho da Vida. Até o seu sorriso era um "sim" à vida, um "sim" jubiloso, que surgia da fé e do amor profundos, um "sim" todas as manhãs, em união com Maria, aos pés da Cruz de Cristo. A "sede" de Jesus crucificado tornou-se a própria sede de Madre Teresa e a inspiração do seu caminho de santidade.

5. Teresa de Calcutá foi realmente Mãe. Mãe dos pobres, mãe das crianças. Mãe de tanta juventude que a teve como guia espiritual e partilhou a sua missão. De uma pequena semente, o Senhor fez crescer uma árvore frondosa e rica de frutos (cf. Mt Mt 13,31-32). E precisamente vós, filhas e filhos de Madre Teresa, sois os sinais mais eloquentes desta fecundidade profética. Mantende o seu carisma inalterado e segui os seus exemplos, e ela do Céu não deixará de vos apoiar no caminho diário.

A mensagem de Madre Teresa, agora mais do que nunca, mostra-se contudo como um convite dirigido a todos. Toda a sua existência nos recorda que ser cristãos significa ser testemunhas da caridade. Eis a recomendação da nova Beata. Fazendo eco às suas palavras, exorto cada um de vós a seguir com generosidade e coragem os passos desta autêntica discípula de Cristo. Madre Teresa caminha ao vosso lado pelas sendas da caridade.

Concedo de coração a vós e aos vossos entes queridos a Bênção apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


DURANTE O ENCONTRO COM OS PEREGRINOS


VINDOS A ROMA PARA PARTICIPAR NO CONSISTÓRIO


Quinta-feira, 23 de Outubro de 2003






Venerados Irmãos Cardeais
Caríssimos Irmãos e Irmãs

1. Depois das solenes celebrações de terça-feira passada e de ontem, apraz-me encontrar-me convosco também no dia de hoje.

Saúdo-vos antes de tudo a vós, venerados Cardeais italianos. Juntamente convosco, desejo saudar os vossos familiares, amigos e diocesanos, que vos rodeiam. Estou persuadido de que eles continuarão a acompanhar-vos com a sua oração e também o seu apoio afectuoso.

Saúdo com afecto os novos Cardeais de língua francesa e os peregrinos francófonos, vindos para os acompanhar por ocasião do Consistório da sua criação.
Concedo-vos a todos a minha Bênção apostólica.

Quero saudar os novos Cardeais de expressão inglesa, juntamente com os peregrinos que os acompanharam a Roma. Que a vossa permanência na Cidade dos Apóstolos vos confirme na fé, na esperança e no amor.

Abençoo-vos cordialmente a todos.

É com afecto que saúdo os novos Cardeais de língua espanhola, assim como as pessoas que os acompanham. Abençoo-vos a todos, de coração.

Saúdo com afeto o novo Cardeal da Arquidiocese do Rio de Janeiro e os peregrinos do Brasil que o acompanham. Sobre todos desça a minha Bênção.

Saúdo cordialmente os Padres Dehonianos e todos aqueles que, nestes dias, acompanham o Cardeal Stanislaw. Juntamente convosco, estou grato a Deus por ter podido conferir esta dignidade a um sacerdote zeloso, cientista famoso e amigo fiel. Peço a Deus a bênção para ele e para todos vós.

2. Venerados e queridos Irmãos! Ao renovar-vos a minha saudação fraternal e os meus ardentes votos para a missão que vos foi confiada, ao serviço de toda a Igreja, desejo confiar as vossas pessoas e o vosso ministério à protecção celestial da Virgem Santa. Intercedam por vós também os Santos Pedro e Paulo.

Com estes sentimentos, é de coração que renovo a minha Bênção a vós e a quantos vos rodeiam com alegria e afecto, assim como a quantos encontrardes no vosso ministério pastoral.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS MEMBROS DA CONFERÊNCIA EPISCOPAL


DA INGLATERRA E DO PAÍS DE GALES


23 de Outubro de 2003



Eminência
Caros Irmãos Bispos

1. "Graça, misericórdia e paz, da parte de Deus Pai e de nosso Senhor Jesus Cristo" (1Tm 1,2). Com estas palavras de saudação apresento-vos as minhas cordiais saudações, Bispos da Inglaterra e do País de Gales. Agradeço ao Cardeal Murphy-O'Connor os bons votos e os amáveis sentimentos expressos em vosso nome. Retribuo-os cordialmente e asseguro-vos as minhas orações por vós e pelas pessoas que foram confiadas ao vosso cuidado pastoral. Ao virdes aqui para "visitar Cefas" (cf. Gl Ga 1,18), vós revigorais na fé, na esperança e na caridade os vossos vínculos de comunhão com o Bispo de Roma. A vossa primeira visita ad limina Apostolorum, neste novo milénio, constitui uma ocasião para afirmar o vosso compromisso a tornar o rosto de Jesus Cristo cada vez mais visível na Igreja e na sociedade, através de um testemunho constante do Evangelho, que é o próprio Jesus Cristo (cf. Ecclesia in Europa, 6).

2. Apesar da sua grande herança cristã, hoje em dia a Inglaterra e o País de Gales encontram-se a enfrentar uma difusão invasiva do secularismo. Na base desta situação está a tentativa de promover uma visão da humanidade desapegada de Deus e distante de Cristo. Trata-se de uma mentalidade que exaspera o individualismo, que interrompe o vínculo fundamental entre a liberdade e a verdade e que, por conseguinte, desfaz os laços recíprocos que definem a vida social. Esta perda do sentido de Deus é sentida com frequência como um "abandono do homem" (cf. ibid., n. 9). A desagregação social, as ameaças contra a vida familiar e os terríveis espectros da intolerância racial e da guerra fazem com que numerosos homens e mulheres, sobretudo entre os jovens, se sintam desorientados e por vezes até mesmo desprovidos de esperança. Portanto, não é somente a Igreja que sofre em virtude dos efeitos preocupantes do secularismo, mas também a vida cívica é atingida.

Jesus Cristo, vivo na sua Igreja, permite-nos ultrapassar as perplexidades do nosso tempo. Como Bispos, somos todos chamados a permanecer vigilantes no nosso dever de proclamar com certeza clarividente e fervorosa que Jesus Cristo é a fonte da esperança, uma esperança que não desilude (cf. Rm Rm 5,5). Os fiéis da Inglaterra e do País de Gales olham para vós com grandes expectativas, para que pregueis e ensineis o Evangelho, que faz esvaecer as trevas e ilumina o caminho da vida. A proclamação quotidiana do Evangelho e uma vida de santidade são a vocação da Igreja em todo o tempo e lugar. Este mandato, que exprime a identidade mais profunda da Igreja, exige a máxima solicitude. Os fenómenos do secularismo e da difundida indiferença religiosa, a diminuição das vocações ao sacerdócio e à vida religiosa, assim como as grandes dificuldades experimentadas pelos pais, na tentativa de ensinar os seus filhos, dão testemunho da necessidade urgente de que os Bispos assumam a sua missão fundamental de ser autênticos e autorizados anunciadores da Palavra (cf. Pastores gregis ). E para que isto aconteça, os Bispos, chamados por Cristo a ser mestres da verdade, "devem promover e defender a unidade da fé e a disciplina comum de toda a Igreja" (Lumen gentium, LG 23). É na fidelidade ao Magistério ordinário da Igreja, com adesão estreita à disciplina da Igreja universal e com declarações positivas que instruam claramente os fiéis, que o Bispo pode salvaguardar o povo de Deus contra os desvios e as hesitações, assegurando-lhe a possibilidade objectiva de professar sem equívocos a fé autêntica (cf. Catecismo da Igreja Católica, CEC 890).


3. Estimados Irmãos, os vossos relatórios indicam claramente que tomastes a peito a minha profunda convicção de que o novo milénio exige "um novo impulso para a vida cristã" (Novo millennio ineunte NM 29). Se a Igreja quiser saciar a sede que os homens e as mulheres têm, de verdade e de valores autênticos, sobre os quais poder construir a sua própria vida, não se poderá renunciar a qualquer esforço em ordem a promover iniciativas pastorais eficazes para fazer com que Jesus seja realmente conhecido.

No meio dos reiterados impulsos de divisão, suspeita e hostilidade, o grande desafio que devemos enfrentar agora consiste em fazer da Igreja a casa e a escola da comunhão (cf. ibid., n. 43), reconhecendo que ela é "um povo congregado pela unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo" (Lumen gentium, LG 4). Por conseguinte, é muito importante que os programas de catequese e de educação religiosa, por vós introduzidos, continuem a tornar mais profundos, nos fiéis, a compreensão e o amor por Cristo e pela sua Igreja. A pedagogia autêntica da oração, a catequese convincente sobre o significado da liturgia e sobre a importância da Eucaristia dominical e a promoção da prática frequente do Sacramento da Reconciliação (cf. Congregação para o Clero, Instrução sobre o presbítero, pastor e guia da comunidade paroquial, n. 27) poderão ser de grande ajuda para alcançar esta finalidade pastoral e para despertar no coração dos vossos fiéis a alegria e a paz que derivam da participação na vida e na missão da Igreja.

4. O papel do ministério sacerdotal é fundamental para o bom êxito dos vossos programas de renovação pastoral. A Igreja tem necessidade de sacerdotes humildes e santos, cujo caminho de conversão quotidiano inspire todo o povo de Deus à santidade, para a qual ele é chamado (cf. Lumen gentium, LG 9). Solidamente arraigado numa relação pessoal de profunda comunhão e amizade com Jesus, Bom Pastor, o sacerdote não só encontrará a santificação para si mesmo, mas poderá tornar-se um modelo de santidade para as pessoas que ele é chamado a servir. Assegurai aos vossos sacerdotes que os fiéis cristãos, e também a sociedade no seu conjunto, dependem deles e que lhes são muito reconhecidos. A este propósito, estou persuadido de que lhes manifestareis o vosso afecto especial, acompanhando-os como pais e irmãos em todas as fases da sua vida ministerial (cf. Pastores gregis ).

Analogamente, os sacerdotes religiosos, os frades e as religiosas devem ser encorajados, ao procurar enriquecer a comunhão eclesial através da sua presença activa e do seu ministério nas vossas dioceses. Como dádiva à Igreja, a vida consagrada encontra-se no próprio âmago da mesma, manifestando a profunda beleza da vocação cristã ao amor altruísta e sacrifical. As vossas recentes tentativas de promover uma "cultura da vocação" tornar-se-ão, sem dúvida, um sinal positivo da riqueza das diversas condições de vida eclesiástica, que vivem em conjunto "a fim de que o mundo acredite" (Jn 17,21).

Como prioridade na vossa resposta ao apelo em prol de uma nova evangelização, é-me grato tomar conhecimento dos vossos esforços decididos em vista de incutir ainda mais energia ao ministério dos jovens. O crescimento de grupos como Youth 2000 ("Juventude 2000") e o desenvolvimento de programas para capelães universitários constituem um testemunho do desejo que muitos jovens têm de participar na vida da Igreja. Como ministros de esperança, os Bispos devem construir o futuro juntamente com as pessoas às quais é confiado o futuro (cf. Pastores gregis ). Oferecei-lhes uma formação cristã integral e animai-os a seguir Jesus Cristo. Descobrireis que o seu entusiasmo e a sua generosidade são exactamente aquilo que é necessário para promover um espírito de renovação, não apenas entre si, mas em toda a comunidade cristã.

5. A evangelização da cultura constitui um aspecto central da nova evangelização, porque "no centro de cada cultura está a atitude que o homem assume diante do maior mistério: o mistério de Deus" (Centesimus annus CA 24). Como Bispos, vós justamente procurais encontrar formas para que seja dada à verdade acerca de Deus a devida consideração no âmbito público. A este propósito, reconheço o válido contributo das vossas cartas pastorais e das vossas declarações sobre questões que dizem respeito à vossa sociedade. Exorto-vos a continuar a garantir que tais declarações exprimam de modo íntegro e clarividente todo o conjunto do ensinamento do magistério da Igreja. É particularmente importante a necessidade de defender a unicidade do matrimónio, como união por toda a vida entre um homem e uma mulher em que, como marido e esposa, eles participem na obra amorosa da criação de Deus. A equiparação do matrimónio a outras formas de convivência ofusca a sacralidade do matrimónio e viola o seu profundo valor no desígnio de Deus para os homens (cf. Familiaris consortio FC 3).

Não há qualquer dúvida de que um dos principais factores na formação da cultura contemporânea é representado pelos meios de comunicação social. O requisito moral fundamental de qualquer comunicação é que ela deve respeitar e servir a verdade. São dignos de elogio os vossos esforços em ordem a ajudar quantos trabalham neste campo, a assumirem a responsabilidade que lhes compete. Embora tais esforços às vezes possam encontrar uma certa resistência, encorajo-vos a procurar trabalhar juntamente com os homens e as mulheres dos meios de comunicação. Convidai-os a unir-se a vós para derrubar as barreiras da desconfiança e para procurar reunir os povos na compreensão e no respeito.

6. Por fim, no contexto da evangelização da cultura, desejo exprimir o meu reconhecimento pela válida contribuição que é oferecida pelas vossas escolas católicas, tanto no enriquecimento da fé da comunidade católica, como na promoção da excelência na vida cívica em geral. Reconhecendo as profundas transformações relativas ao mundo da educação, encorajo os professores, leigos e religiosos, na sua missão fundamental de assegurar que quantos receberam o baptismo "adquiram uma consciência cada vez maior do dom da fé que receberam" (Gravissimum educationis, GE 2). Enquanto a educação religiosa que é o cerne de toda a escola católica representa hoje um desafio e um compromisso para o apostolado, existem muitos sinais do desejo que os jovens sentem de aprofundar a fé e de a praticar de maneira vigorosa. Se quisermos que este despertar da fé aumente, são necessários professores que tenham uma compreensão clarividente e específica da natureza específica e do papel da educação católica. É preciso que ela seja organizada a todos os níveis, se desejarmos que os nossos jovens e as suas famílias experimentem a harmonia entre a fé, a vida e a cultura (cf. Congregação para a Educação Católica, As pessoas consagradas e a sua missão na escola, n. 6). A este propósito, desejo dirigir um apelo especial aos vossos religiosos, a fim de que não abandonem o apostolado escolar (cf. Pastores gregis ) e, pelo contrário, renovem o seu compromisso a servir as escolas localizadas nas regiões mais pobres. Onde são numerosas as situações que afastam os jovens do caminho da verdade e da liberdade autênticas, o testemunho dos conselhos evangélicos por parte das pessoas consagradas constitui uma dádiva insubstituível.

7. Prezados Irmãos, é com afecto fraterno que compartilho convosco estas reflexões, enquanto vos asseguro as minhas preces ao procurardes tornar o rosto de Jesus Cristo cada vez mais reconhecível no seio das vossas comunidades. A mensagem de esperança que vós proclamais não deixará de suscitar um novo ardor e um renovado compromisso em favor da vida cristã. Unidos no nosso amor pelo Senhor e inspirados pelo exemplo de Madre Teresa de Calcutá, há pouco beatificada, continuemos pelo caminho da esperança! É com estes sentimentos que vos confio a Maria, Estrela da Nova Evangelização, a fim de que vos ajude na vossa sabedoria pastoral, vos revigore na fortaleza e acenda o amor e a compaixão nos vossos corações. A vós, aos sacerdotes, aos religiosos e aos fiéis leigos das vossas dioceses, concedo cordialmente a minha Bênção apostólica.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

POR OCASIÃO DO IV CENTENÁRIO DO NASCIMENTO

DE SÃO JOSÉ DE CUPERTINO


Sábado, 25 de Outubro de 2003



Caríssimos Irmãos e Irmãs!

1. Sinto-me feliz por apresentar as minhas cordiais boas-vindas a todos vós, que viestes a Roma por ocasião das solenes celebrações do quarto centenário do nascimento da São José de Cupertino. Saúdo em primeiro lugar os queridos Frades Menores Conventuais, acompanhados pelo seu Ministro-Geral, Pe. Joachim Giermek, a quem agradeço as gentis palavras que me dirigiu em nome de todos os presentes. Dirijo um pensamento especial ao Cardeal Sérgio Sebastiani e aos Pastores das Comunidades eclesiais que participam na peregrinação que hoje fazeis aos Túmulos dos Apóstolos. Por fim, saúdo-vos a vós, caríssimos peregrinos vindos da Púglia, da Úmbria e das Marcas, lugares particularmente ligados à passagem terrena e à memória do "Santo dos voos".

Como indiquei na Mensagem publicada no passado mês de Fevereiro, José de Cupertino continua a ser um Santo de extraordinária actualidade, porque "espiritualmente próximo dos homens do nosso tempo", aos quais ensina "a percorrer o caminho que conduz para uma santidade "diária", caracterizada pelo cumprimento fiel do nosso próprio dever quotidiano" (n. 9).

2. Com efeito, São José é antes de mais mestre de oração. Colocava no centro dos seus dias a celebração da Santa Missa, à qual se seguiam longas horas de adoração diante do tabernáculo. Segundo a mais genuína tradição franciscana, ele sentia-se fascinado e comovido pelos mistérios da Encarnação e da Paixão do Senhor. São José de Cupertino viveu em profunda união com o Espírito Santo; estava totalmente imbuído do Espírito, do qual aprendia as coisas de Deus para depois as transpor numa linguagem simples e compreensível a todos. Quem o encontrava ouvia de boa vontade as suas palavras porque, como nos é transmitido pelos biógrafos, mesmo não sendo muito culto na linguagem e escrevendo com dificuldade, quando falava de Deus transformava-se.

3. Em segundo lugar, o Santo de Cupertino continua a falar aos jovens e, em particular, aos estudantes, que o veneram como seu padroerio. Ele estimula-os a apaixonarem-se pelo Evangelho, a "fazer-se ao largo" no vasto oceano do mundo e da história, permanecendo firmemente ancorados na contemplação do Rosto de Cristo.

Os meus votos são por que vós, queridos jovens e estudantes, assim como também vós, que estais empenhados no âmbito cultural e formativo, sigais o exemplo de São José, comprometendo-vos a conjugar a sabedoria da fé com o método rigoroso da ciência, para que o saber humano, sempre aberto à transcendência, progrida com firmeza para um conhecimento da verdade cada vez mais pleno.

4. Por fim, São José de Cupertino resplandece como modelo exemplar de santidade para os seus Irmãos da Ordem Franciscana dos Frades Menores Conventuais. A tensão constante para pertencer unicamente a Cristo faz dele um ícone do frade "menor", que, na escola do Pobrezinho de Assis, assume Cristo como centro de toda a sua existência. Torna-se eloquente o seu compromisso decidido para orientar constantemente o coração para Deus, para que nada o separe do "seu" Jesus, amado acima de qualquer coisa ou pessoa.

O testemunho deste grande Santo, que resplandece de luz singular nesta data centenária, constitui uma mensagem de vida evangélica encorajadora. Para todos os que abraçaram os ideais da vida de consagração, ela representa uma forte chamada a viver tendendo sempre para os valores do espírito, totalmente consagrados ao Senhor e a um necessário serviço de caridade para os irmãos.


5. Como todos os Santos, José de Cupertino está sempre na moda! Depois de quatro séculos, o seu testemunho continua a representar para todos um convite a ser santos. Mesmo pertencendo a uma época que, em certos aspectos, é bastante diferente da nossa, ele indica um percurso de espiritualidade válido para todos os tempos; recorda a primazia de Deus, a necessidade da oração e da contemplação, a adesão fervorosa e confiante a Cristo, o compromisso do anúncio missionário, o amor à Cruz.

Ao renovar os votos de que as celebrações centenárias contribuam para fazer conhecer melhor o "Santo dos voos", invoco sobre quantos as promoveram e nelas participam a celeste protecção da Virgem Maria.

Com estes sentimentos e votos, concedo de coração a Bênção apostólica a vós aqui presentes, às vossas Comunidades e aos numerosos devotos do Santo de Cupertino da Itália e do mundo.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO PRESIDENTE DO PONTIFÍCIO COMITÉ


DAS CIÊNCIAS HISTÓRICAS






Ao Rev.mo Mons. Walter BRANDMÜLLER
Presidente do Pontifício Comité das Ciências Históricas

1. Em vista do 14° centenário da morte do meu predecessor, São Gregório Magno, a Academia Nacional dos "Lincei" e o Pontifício Comité das Ciências Históricas pretendem conjuntamente celebrar a memória desta eminente figura do sucessor de Pedro, a quem foi reservado com justiça o apelativo "Grande". Reinvocando personagens e acontecimentos do passado que deixaram um sinal significativo no seu tempo, a historiografia presta um válido serviço às futuras gerações, porque realça modelos humanos portadores de valores universais válidos como tais para cada época. É o caso de São Gregório Magno, de cuja personalidade quero aqui sublinhar, pelo menos alguns aspectos que considero particularmente relevantes.

2. Filho de antiga família romana de longa tradição cristã, Gregório, graças ao clima da casa paterna e à formação escolar que recebeu, pôde familiarizar-se com o património das ciências e da literatura antiga.

Atento pesquisador da verdade, intuiu que o património da antiguidade clássica, além da cristã, constituía uma preciosa base para cada sucessivo desenvolvimento científico e humano. Trata-se de uma intuição, que conserva ainda hoje todo o seu valor em vista do futuro da humanidade e sobretudo da Europa. Não se pode, de facto, construir o futuro prescindindo do passado. Eis porque em diversas ocasiões exortei as Autoridades competentes a valorizar plenamente as ricas "raízes" clássicas e cristãs da civilização europeia, para transmitir a sua linfa às novas gerações.

Outra característica significativa de São Gregório foi o seu esforço em vista de realizar a primazia da pessoa humana, considerada não apenas nas suas dimensões física, psicológica e social, mas também na constante referência ao seu destino eterno. É esta a verdade à qual o mundo de hoje deve estar novamente mais atento, se quiser construir um mundo mais respeitoso das multíplices exigências de cada ser humano.

3. Não raramente São Gregório Magno é chamado "o último dos Romanos". De facto, ele estava profundamente enraizado na Urbe, no seu povo, nas suas tradições. Como Sumo Pontífice teve sempre como objectivo todo o Orbis Romanus. Interessou-se não apenas pela parte oriental do Império Romano, Bizâncio, que conhecia bem devido à sua longa permanência em Constantinopla, mas estendeu o seu cuidado pastoral à Hispânia, à Gália, à Germânia e à Britânia, que então faziam parte do Império Romano.

Motivado por um zelo exemplar pela difusão do Evangelho, promoveu uma intensa actividade missionária, na qual encontrava expressão uma romanidade purificada e inspirada no Evangelho; uma romanidade cristã, já não orientada em vista de um poder político, mas desejosa de difundir a mensagem salvífica de Cristo a todos os povos.

Esta disposição interior do grande Pontífice emerge nas directrizes que se desvelou em conceder ao abade Agostinho, enviado à Britânia: a ele pediu explicitamente para respeitar os costumes daqueles povos, por não estar em oposição com a fé crista. De tal modo, Gregório Magno, além de cultivar o anseio missionário inerente ao seu ministério, oferecia uma decisiva contribuição para uma harmoniosa integração dos diversos povos da cristandade ocidental.


DIscursos João Paulo II 2003