AUDIÊNCIAS 1980 - AUDIÊNCIA GERAL
Quarta-feira, 6 de Fevereiro de 1980
A troca do dom do corpo cria autêntica comunhão
1. Prossigamos o exame daquele «princípio», para que Jesus apelou na conversa com os fariseus sobre o assunto do matrimónio. Esta reflexão exige de nós ultrapassarmos o limiar da história do homem e chegarmos até ao estado de inocência original. Para atingirmos o significado de tal inocência, baseamo-nos, em certo modo, na experiência do homem «histórico», no testemunho do seu coração, da sua consciência.
2. Seguindo a linha do «a posteriori histórico», tentemos reconstruir a peculiaridade da inocência original, encerrada na experiência recíproca do corpo e do seu significado esponsal, segundo o que atesta Génesis 2, 23-25. A situação aqui descrita revela a experiência beatificante do significado do corpo que, no âmbito do mistério da criação, o homem atinge, por assim dizer, na complementaridade do que é masculino e feminino. Todavia, nas raízes desta experiência deve haver a liberdade interior do dom, unida sobretudo à inocência; a vontade humana é originariamente inocente e, deste modo, é facilitada a reciprocidade e troca do dom do corpo, segundo a sua masculinidade e feminilidade, como dom da pessoa. Consequentemente, a inocência atestada em Génesis 2, 25 pode definir-se como inocência da experiência recíproca do corpo. A frase «estavam ambos nus, tanto o homem como a mulher, mas não sentiam vergonha», exprime exactamente esta inocência na recíproca «experiência do corpo», inocência que inspirava a interior troca do dom da pessoa, que, na relação recíproca, realiza em concreto o significado esponsal da masculinidade e da feminilidade. Assim, portanto, para compreender a inocência da mútua experiência do corpo, devemos procurar esclarecer em que coisa consiste a inocência interior na troca do dom da pessoa. Tal troca constitui, de facto, a verdadeira fonte da experiência da inocência.
3. Podemos dizer que a inocência interior (isto é, a rectidão de intenção) na troca do dom consiste numa recíproca «aceitação» do outro, a corresponder à essência mesma do dom; deste modo, a doação recíproca cria a comunhão das pessoas. Trata-se, por isso, de «acolher» o outro ser humano e de «aceitá-lo», exactamente porque nesta relação mútua, de que fala Génesis 2, 23-25, o homem e a mulher se tornam dom um para o outro, mediante toda a verdade e a evidência do seu próprio corpo, na sua masculinidade e feminilidade. Trata-se, portanto, de tal «aceitação» ou «acolhimento» que exprima e sustente na recíproca nudez o significado do dom e por isso aprofunde a dignidade recíproca dele. Tal dignidade corresponde profundamente a ter o Criador querido (e continuamente quer) o ser humano, masculino e feminino, «para si mesmo». A inocência «do coração», e, por conseguinte, a inocência da experiência significa participação moral no eterno e permanente acto da vontade de Deus.
O contrário de tal «acolhimento» ou «aceitação» do outro ser humano, como dom, seria privação do dom mesmo e por isso mudança e até redução do outro a «objecto para mim mesmo» (objecto de concupiscência, de «apropriação indevida», etc.). Não trataremos agora, de modo particularizado, desta multiforme e presumível antítese do dom. É preciso, contudo, já aqui, no contexto de Génesis 2, 23-25, verificar que esse extorquir ao outro ser humano o seu dom (à mulher por parte do homem e vice-versa) e reduzi-lo interiormente a puro «objecto para mim», deveria mesmo assinalar o princípio da vergonha. Esta, na verdade, corresponde a uma ameaça feita ao dom na sua pessoal intimidade, e testemunha o desabar interior da inocência na experiência recíproca.
4. Segundo Génesis, 2, 25, «o homem e a mulher não sentiam vergonha». Isto permite-nos chegar à conclusão que a troca do dom, na qual participa toda a humanidade deles — alma e corpo, feminilidade e masculinidade — se realiza conservando a característica interior (isto é precisamente a inocência) da doação de si e da aceitação do outro como dom. Estas duas funções da mútua troca estão profundamente ligadas dentro de todo o processo do «dom de si»: o dar e o aceitar o dom compenetram-se: de maneira que o dar mesmo, torna-se aceitar; e o aceitar, transforma-se em dar.
5. Génesis 2, 23-25 permite-nos deduzir que a mulher, que no mistério da criação «é dada» ao homem pelo Criador, graças à inocência original é «acolhida», ou seja, aceite por ele como dom. O texto bíblico neste ponto é de todo claro e límpido. Simultaneamente, a aceitação da mulher por parte do homem e o modo mesmo de aceitá-la tornam-se quase uma primeira doação, de modo que a mulher dando-se (desde o primeiro momento em que no mistério da criação foi «dada» ao homem por parte do Criador), «descobre-se» ao mesmo tempo «a si mesma», graças a ter sido aceite e acolhida e graças ao modo como foi recebida pelo homem. Ela encontra-se portanto a si mesma no próprio dar-se («por meio de um dom sincero de si» [Gaudium et Spes, 24], quando é aceite assim como a quis o Criador, isto é «para si mesma», através da sua humanidade e feminilidade; quando nesta aceitação é assegurada toda a dignidade do dom, mediante a oferta do que ela é em toda a verdade da sua humanidade e em toda a realidade do seu corpo e sexo, da sua feminilidade, ela chega à íntima profundidade da sua pessoa e à plena posse de si. Acrescentemos que este encontrarem-se a si mesmos no próprio dom se torna fonte de novo dom de si, que aumenta devido à interior disposição à troca do dom e na medida em que encontra uma mesma e até mesmo mais profunda aceitação e acolhimento, como fruto de uma cada vez mais intensa consciência do dom em si.
6. Parece que a segunda narrativa da criação marcou «desde o princípio» ao homem a função de quem sobretudo recebe o dom (Cfr. especialmente Gn 2). A mulher é «desde o princípio» confiada aos seus olhos, à sua consciência, à sua sensibilidade e ao seu «coração» ele, pelo contrário, deve, em certo sentido, assegurar o processo da troca do dom, a recíproca compenetração do dar e receber como dom, a qual, precisamente através da reciprocidade, cria autêntica comunhão de pessoas.
Se a mulher, no mistério da criação, é aquela que foi «dada» ao homem, este, por seu lado, recebendo-a como dom na plena verdade da sua pessoa e feminilidade, por isso mesmo enriquece-a e ao mesmo tempo também ele, nesta relação recíproca, fica enriquecido. O homem enriquece não só por meio dela, que lhe dá a sua pessoa e feminilidade, mas também por meio da doação de si mesmo. A doação por parte do homem, em resposta à da mulher, é para ele mesmo enriquecimento; de facto, nela manifesta-se quase a essência específica da sua masculinidade que, por meio da realidade do corpo e do sexo, atinge a íntima profundidade da «posse de si», graças à qual é capaz tanto de dar-se como de receber o dom do outro. O homem, portanto, não só aceita o dom, mas ao mesmo tempo é acolhido como dom pela mulher, ao revelar-se a interior essência espiritual da sua masculinidade, juntamente com toda a verdade do seu corpo e sexo. Assim aceite, ele, por esta aceitação e este acolhimento do dom da própria masculinidade, enriquece. Em seguida, tal aceitação, em que o homem se encontra a si mesmo por meio do «dom sincero de si», torna-se nele fonte de novo e mais profundo enriquecimento da mulher consigo mesmo. A troca é mútua, e nela revelam-se e crescem os efeitos recíprocos do «dom sincero» e do «encontro de si».
Deste modo, seguindo os vestígios do «a posteriori histórico» — e sobretudo seguindo os vestígios dos corações humanos — podemos reproduzir e quase reconstruir aquela recíproca troca do dom da pessoa, que foi descrito no antigo texto, tão rico e profundo, do Livro do Génesis.
Saudações
A grupos provenientes da Áustria
Uma saudação especialmente cordial dirijo aos austríacos aqui presentes: ao grupo da diocese de Eisenstad, que participa num curso de renovação religiosa no Centro Internacional "Mundo Melhor", e aos peregrinos do Movimento familiar "Kana-Kongregation". Hoje desejo propor a todos vós, de modo particular, como tema da vossa preocupação e da vossa oração, o tema da família. E o tema do próximo Sínodo dos Bispos; e o vosso país declarou também o ano de 1980 "Ano da Família". Quem protege e promove a família, trabalha pela renovação da Igreja e da sociedade, das quais ela é a célula e o gérmen originário. O Concílio denomina a família uma "espécie de igreja doméstica", na qual "os pais devem ser para os seus filhos os primeiros pregadores da fé, mediante a palavra e o exemplo" (Lumen Gentium LG 11). Oxalá a preocupação pela consolidação e promoção da família cristã constitua este ano uma premente tarefa. Para isso concedo-vos de coração a minha Bênção Apostólica.
A três grupos de Religiosas
Tenho o prazer de saudar o grupo das Mestras de Noviças, pertencentes às Franciscanas Missionárias de Maria, vindas a Roma para um curso de formação e desejosas de receber do Papa uma palavra de conforto e encorajamento. Caríssimas filhas, tudo o que descobristes. nas vossas reuniões, servir-vos-á certamente de ajuda na vossa difícil tarefa, mas a arte de persuadir descobri-la-eis plenamente nos exemplos e nos ensinamentos do Divino Mestre. Ele que perscruta as mentes e os corações e os torna atentos à voz do Espírito Santo, indicar-vos-á o modo de atrair a plena confiança das Noviças para lhes temperar o carácter e prepará-las para o apostolado eclesial e missionário. E a vossa obra educadora será tanto mais eficaz, quanta mais autêntico for também o vosso testemunho de consagração a Deus e à Igreja. A minha Bênção Apostólica vos acompanhe na vossa actividade, e seja extensiva âs vossas Comunidades.
Uma saudação para vós, "Pie Madri della Nigrizia", difusão florescente do empenho missionário do grande apóstolo da Africa, Monsenhor Comboni. Também vós estais a preparar-vos espiritualmente para a oferta total e definitiva de vós mesmas ao ideal missionário. O Senhor ilumine, apoie e corrobore a vossa dedicação e seja para vós íntima e inestimável fonte de consolação e de alegria. O Papa está junto de vós no vosso itinerário de fé e de caridade com a Sua Bênção Apostólica.
Sede bem-vindas também vós, Irmãzinhas dos Pobres, provenientes de alguns países mediterrânicos e reunidas aqui no centro da catolicidade, para aprofundar os motivos da vossa consagração religiosa para o bem da Igreja e das almas, e de alívio de tantas misérias que atingem os mais humildes e os menos abastados. Trazei sempre em vós a imagem de Cristo doce e humilde de coração, do bom Samaritano sempre rico de sensibilidade tão humana para todos os sofrimentos: levai para cada encontro a sua alegria e a sua consolação. A Bênção Apostólica do Papa vos acompanhe, assim como as vossas Irmãs de hábito e as respectivas famílias.
Aos membros do Centro Nacional dos Ecónomos de Comunidades
Uma particular saudação vai agora para o numeroso grupo de membros do Centro Nacional dos Ecónomos de Comunidades, que se une à Consulta Geral do Apostolado dos Leigos, cujo Décimo Congresso Nacional decorre nestes dias, no Vigésimo Aniversário da sua instituição.
Caríssimos Filhos, a minha palavra que a vós dirijo não pode deixar de ser de cordial encorajamento, a fim de que opereis cada vez mais e melhor para o bem das instituições religiosas e eclesiásticas, confiadas ao vosso cuidado. A importância da vossa tarefa está só a par da sua delicadeza: daqui a vossa responsabilidade, que se exercerá tanto mais positivamente quanto mais vivo for em vós o sentido da Igreja e do seu serviço ao Senhor e aos homens.
Recebei a minha Bênção como penhor da particular assistência divina sobre a vossa preciosa actividade.
Aos Jovens
Saúdo agora cordialmente todos os grupos de jovens, entre os quais os jovens do Movimento GEN, reunidos no Centro Mariapoli para um Congresso.
Caríssimos Jovens!
Sábado passado, celebrando a festa da Apresentação do Senhor no Templo, fomos convidados pela Liturgia a ir ao encontro de Jesus, "Luz que ilumina as gentes" (Lc 2,32). Seja, pois, Jesus a luz dos vossos olhos interiores, o guia dos vossos passos, o critério das vossas escolhas, aquele que alegra a vossa juventude e a enche de esperança, de coragem e de felicidade. Então as vossas obras serão luminosas e "tudo aquilo que é verdadeiro, nobre e justo... será objecto dos vossos pensamentos" (cfr. Flp Ph 4,8).
Desejo, depois, saudar em particular as várias peregrinações escolares aqui presentes.
Falando-vos, queridos jovens, penso, neste momento, nos vossos conterrâneos, vítimas de sequestros, entre os quais também o pequeno Giovanni Furci, de Locri, de nove anos, raptado há dias quando estava na escola, com imensa ânsia dos pais e dos irmãozinhos. Dirijo o meu caloroso apelo a fim de que os raptores escutem o impulso interior da bondade, da honestidade e da compreensão, e restituam o pequenito ao amor da sua família para a qual vai toda a minha solidariedade, a minha trepidação, a minha oração e os meus votos por que possa reabraçar quanto antes o seu querido filho.
Aos Doentes
Queridos Doentes aqui presentes e todos os que, mesmo longe, sofreis no corpo e no espírito. O Papa olha para vós com predilecção porque vós, trazendo a imagem de Cristo que sofre, sois chamados a oferecer um testemunho muito especial de adesão à vontade do Pai Celeste, de fé dócil e serena nos seus misteriosos desígnios e de comunhão com Jesus.
Coragem na vossa enfermidade! Tende confiança, sede fortes na esperança, e o Senhor tirará do sofrimento uma imensa riqueza, para vós e para os outros. Rezo por isto e acompanho-vos no vosso caminho de fé com a minha Bênção Apostólica.
Aos jovens Casais
E agora, a minha saudação de felicidades aos jovens Casais. Caríssimos, o Senhor abençoou o vosso amor, por Ele mesmo inspirado e tornado santo, e deu-lhe a garantia e o sigilo indefectível da sua graça, mediante o "grande sacramento" do matrimónio.
Sede fiéis à graça de tal sacramento, mediante a oração, cultivando pensamentos de honestidade e de respeito mútuo, afastando todas as tentações do egoísmo. Recomendai o vosso amor à Santíssima Virgem, presente, como em Caná, também nas vossas bodas. Oxalá Ela obtenha graças contínuas tanto para vós como para todas as famílias cristãs! Abençoo-vos de coração.
Quarta-feira, 13 de Fevereiro de 1980
(Antes da Catequese de 13 de Fevereiro Papa recebeu os jovens na Sala das Bênçãos)
A inocência original e o estado histórico do homem
1. A meditação de hoje pressupõe tudo quanto foi já conseguido nas várias análises feitas até agora. Estas brotaram da resposta dada por Jesus aos seus interlocutores (Evangelho de S. Mateus Mt 19,3-9 São Mc 10,1-12), que lhe tinham feito uma pergunta sobre o matrimónio, sobre a indissolubilidade e a unidade. O Mestre tinha-lhes recomendado considerassem atentamente o que era «desde o princípio». Exactamente por isto, no ciclo das nossas meditações até agora, procurámos descrever dalgum modo a realidade da união, ou melhor, da comunhão das pessoas, vivida «desde o princípio» pelo homem e pela mulher. Em seguida, tentámos penetrar no conteúdo do versículo conciso 25, de Génesis 2: «Estavam ambos nus, tanto o homem como a mulher, mas não sentiam vergonha».
Estas palavras fazem referência ao dom da inocência original, revelando-lhe o carácter de modo, por assim dizer, sintético. A teologia construiu sobre esta base a imagem global da inocência e da justiça original do homem, antes do pecado original, aplicando o método da objectivação, característico da metafísica e da antropologia metafísica. Na presente análise procuramos sobretudo tomar em consideração o aspecto da subjectividade humana; esta parece, aliás, encontrar-se mais perto dos textos originais, especialmente da segunda narrativa da criação, isto é, do texto javista.
2. Independentemente de certa diversidade de interpretação, parece bastante claro que a «experiência do corpo», como a podemos ir buscar ao texto arcaico de Gén. 2, 23 e mais ainda de Gén. 2, 25, indica um grau de «espiritualização» do homem, diverso daquele que significa o mesmo texto depois do pecado original (Gn 3) e nós conhecemos valendo-nos da experiência do homem «histórico». É diversa medida de «espiritualização» que encerra outra composição das forças interiores no próprio homem, quase outra relação corpo-alma, outras proporções internas entre sensibilidade, espiritualidade e afectividade, isto é, outro grau de sensibilidade interior perante os dons do Espírito Santo. Tudo isso condiciona o estado de inocência original do homem e ao mesmo tempo determina-o, permitindo-nos também compreender a narrativa do Génesis. A teologia e, também, o magistério da Igreja deram a estas verdades fundamentais forma própria (*).
3. Realizando a análise do «princípio» segundo a dimensão da teologia do corpo, fazemo-lo baseando-nos nas palavras de Cristo, com que Ele mesmo se referiu àquele «princípio». Quando disse Não lestes que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher? (Mt 19,4), ordenou-nos e sempre nos ordena que voltemos à profundidade do mistério da criação. E nós fazemo-lo, tendo plena consciência do dom da inocência original, própria do homem antes do pecado original. Embora uma intransponível barreira nos separe do que foi o homem então, como varão e mulher, mediante o dom da graça unida ao mistério da criação, e nos separe daquilo que ambos foram um para o outro, como dom recíproco, todavia procuramos compreender aquele estado de inocência original na sua ligação com o estado «histórico» do homem depois do pecado original: «Status naturae lapsae simul et redemptae».
Por meio da categoria do «a posteriori histórico», procuramos atingir o sentido original do corpo e alcançar o laço existente entre ele e a índole da inocência original na «experiência do corpo», tal como ela se põe em evidência, de modo tão significativo, na narrativa do Livro do Génesis. Chegamos à conclusão que é importante e essencial precisar este laço, não só em relação com a «pré-história teológica» do homem, em que a convivência do homem e da mulher era quase completamente penetrada pela graça da inocência original, mas também em relação com a sua possibilidade de revelar-nos as raízes permanentes do aspecto humano e sobretudo teológico do ethos do corpo.
4. O homem entra no mundo e quase na mais íntima trama do seu futuro e da sua história, com a consciência do estado esponsal do próprio corpo, da própria masculinidade e feminilidade. A inocência original diz que essa significação é condicionada «eticamente» e além disso que, por seu lado, constitui o futuro do ethos humano. Isto é muito importante para a teologia do corpo: é a razão por que devemos construir esta teologia «desde o princípio», seguindo cuidadosamente a indicação das palavras de Cristo.
No mistério da criação, o homem e a mulher foram «dados» pelo Criador, de modo particular, um ao outro, isto não só na dimensão daquele primeiro casal humano e daquela primeira comunhão de pessoas, mas em toda a perspectiva da existência do género humano e da família humana. O facto fundamental desta existência do homem em todas as etapas da sua história é que Deus «os criou homem e mulher»; de facto, sempre os cria deste modo e sempre assim são. A compreensão dos significados fundamentais, encerrados no mistério mesmo da criação, como o significado esponsal do corpo (e dos fundamentais condiciona-mentos de tal significado), é importante e indispensável para conhecer quem é o homem e quem deve ser, e portanto como deveria modelar a própria actividade. A coisa é essencial e importante para o futuro do ethos humano.
5. Génesis 2, 24 verifica que os dois , homem e mulher, foram criados para o matrimónio: «Por este motivo, o homem deixará o pai e a mãe para se unir a sua mulher; e os dois serão uma só carne». Deste modo abre-se grande perspectiva criadora: que é exactamente a perspectiva da existência do homem, a qual se renova continuamente por meio da «procriação» (poder-se-ia dizer da «autoprodução»). Tal perspectiva está profundamente radicada na consciência da humanidade (Cfr. Gén Gn 2,23) e também na particular consciência do significado esponsal do corpo (Gn 2,25). O homem e a mulher, antes de se tornarem marido e esposa (disso falará seguidamente em concreto Gn 4,1), emergem do mistério da criação, primeiro, como irmão e irmã na mesma humanidade. A compreensão do significado esponsal do corpo, na sua masculinidade e feminilidade, revela o íntimo da sua liberdade, que é liberdade de dom. Daqui principia aquela comunhão de pessoas, em que ambos se encontram e se dão reciprocamente, na plenitude da sua subjectividade. Assim crescem ambos como pessoas-sujeitos, e crescem reciprocamente um para o outro também através dos corpos e através daquela «nudez» isenta de vergonha. Naquela comunhão de pessoas está profundamente assegurada toda a profundidade da solidão original do homem (do primeiro e de todos) e, ao mesmo tempo, tal solidão fica de modo maravilhoso penetrada e alargada pelo dom do «outro». Se o homem e a mulher deixam de ser reciprocamente dom desinteressado, como o eram um para o outro no mistério da. criação, então reconhecem «estar nus» (Cfr. Gén Gn 3 Gén ). E então nascer-lhes-á no coração a vergonha daquela nudez, que não tinha sentido no estado de inocência original.
A inocência original manifesta e ao mesmo tempo constitui o ethos perfeito do dom.
A este assunto voltaremos ainda.
*. «Si quis non confitetur primum hominem Adam,cum mandatum Dei in paradiso fuisset transgressus, statim sanctitatem et iustitiam in qua constitutus fuerat amisisse... anathema sit».
(Conc. Trident., Sess. V. can. 1, 2; DB.788, 789).
«Protoparentes in statu sanctitatis et iustitiae constituti fuerunt. (...) Status iustitiae originalis, protoparentibus collatus, erat gratuitus et vere supernaturalis. (...) Protoparentes constituti sunt in statu naturae integrae, id est, immunes a concupiscentia, ignorantia, dolore et morte... singularique felicitate gaudebant. (...) Dona integritatis protoparentibus collata erant gratuita et supernaturalia». (A. Tanquerey, Svnopsis Theologiae Dogmaticae, Parisiis 1943, p. 534-549).
Saudações
A um grupo de Bispos
Hoje, estou muito contente por dirigir uma particular saudação aos Bispos, que participam numa reunião de reflexão e de renovação espiritual no centro Mariapolis de Rocca di Papa. Tenho muitas vezes a ocasião de receber aqui os numerosos jovens do movimento dos Focolarinos que se dedicam à vida de caridade. Não podemos pregar aos jovens a união fraterna se não procurarmos vivê-la a todos os níveis da Igreja. E especialmente importante para os Bispos; o Concílio insistiu na sua solidariedade na colegialidade: colegialidade efectiva, nas responsabilidades pastorais que devem convergir numa mesma preocupação de autenticidade da Igreja,, e de evangelização; colegialidade afectiva também, que estabelece uma comunhão de sentimentos fraternais, entre eles e com o Sucessor de Pedro, segundo o mandamento do amor do Senhor: "É por isto que todos saberão que sois Meus discípulos" (Jn 13,35). Sim, esta comunhão é o nosso testemunho capital: salientámo-lo bem no recente encontro dos Bispos holandeses. Regozijo-me da espiritualidade que hoje vos ajuda a realizá-la cada vez mais. Que o Senhor vos abençoe!
A uma peregrinação da Paróquia de Porto Santo Stefano (Itália)
Tenho o prazer de dirigir cordiais boas-vindas à numerosa peregrinação da Paróquia de Porto Santo Stefano, acompanhada pelo Administrador Apostólico, D. Giovanni D'Ascenzi, e que aqui se encontra por ocasião do 2500 aniversário da construção da primeira igreja ali dedicada ao Protomártir, e também do 30° aniversário da reconstrução do templo destruído pelo bombardeamento.
Exprimo-vos o meu sincero apreço, caríssimos irmãos e irmãs, pelo testemunho de fé em Cristo, que trazeis na vossa vida quotidiana, feita de fadigas e de laboriosidade generosa; e aprecio também a vossa devoção a Nossa Senhora que vos inspirou a erecção de uma igreja dedicada ao mistério da sua imaculada Conceição; e estou-vos grato pelo afecto que demonstrais pela minha pessoa. Tenho conhecimento do empenho religioso com o qual atendeis à vossa formação religiosa, moral e intelectual, correspondendo às exigências e às necessidades do tempo presente, representadas de modo particular pelas gerações jovens; e isso para serdes portadores e transmissores de Cristo vivo num contexto social palpitante de vida.
Desejando que este testemunho seja cada vez mais perspicaz e cheio de boa vontade, concedo-vos de coração a Bênção Apostólica, extensiva às vossas famílias.
A vários grupos de peregrinos
Entre os vários grupos de língua italiana, presentes neste encontro, desejo mencionar alguns dentre os mais numerosos e significativos.
— Saúdo a peregrinação da Polícia Urbana, dos Ferroviários e dos Doadores de sangue da "Avis"' da cidade de Viterbo, acompanhados pelo Bispo D. Luigi Boccadoro. De coração faço-lhes votos por que realizem sempre generosamente o seu precioso serviço social.
— Aos dirigentes e aos operadores de "TeleRadioCentroltalia" desejo um empenho verdadeiramente construtivo no seu contacto quotidiano com os teleouvintes.
— Aos expositores da "Exposição de Alvarás e Invenções" da "Feira de Roma" exprimo o meu apreço pelo seu génio ao serviço da utilidade comum.
— Aos rapazes da "Orquestra Nova" de Rapallo, na província de Génova, asseguro o meu afecto e o meu encorajamento a fim de que cultivem bem a sua nobre arte.
— E por fim aos componentes do Coro da República de São Marino exprimo o meu cordial agradecimento pela execução que nos ofereceram, ao mesmo tempo que faço votos por que toda a sua vida seja um canto ao Senhor.
Para todos, com sincero afecto. vai a minha cordial Bênção.
Aos Doentes
O meu pensamento dirige-se, depois, aos doentes que honram com a sua presença a Audiência desta manhã. Caríssimos Filhos, o Papa estima-vos muito e agradece-vos o contributo importantíssimo que cada um de vós dá, com o próprio sofrimento, à vida da Igreja. Tende coragem: o sofrer passa, o ter sofrido permanece como título imperecível de mérito perante Deus e os irmãos. A minha Bênção Apostólica vos conforte.
Aos jovens Casais
Estão também presentes na Audiência numerosos jovens Casais. Ao dirigir-vos a minha saudação, filhos caríssimos, exprimo votos por que possa actuar-se na vossa vida o projecto divino, que o Livro do Génesis descreve de modo tão sugestivo. Que o vosso amor, remido por Cristo, saiba realizar a total doação recíproca que, fundindo as vossas existências numa autêntica comunhão de pessoas, aberta responsavelmente à geração de novos seres humanos, consinta a cada um "encontrar" no outro a mais profunda verdade de si mesmo. Com a minha Bênção :Apostólica.
Em recordação do Prof. Bachelet
Não posso deixar passar em silêncio o horrível e indigno atentado que veio juntar-se à trágica corrente de delitos cruéis que estão desde há muito tempo ensanguentando a Itália: como sabeis, ontem foi assassinado barbaramente aqui em Roma, o Professor Vittorio Bachelet, Vice-Presidente do Supremo Conselho da Magistratura e já por longos anos membro activo da Acção Católica Italiana, da qual foi também Presidente Nacional.
Tive ocasião de conhecer pessoalmente o Professor Bachelet colaborando com ele no Pontifício Conselho para os Leigos desde 1967. Conheci, também, nesse período, a sua família: a Esposa e os Filhos. Perante este terrível sofrimento que os atingiu, deponho hoje, nas suas mãos, a expressão da minha viva participação e dos meus sentidos pêsames. Ao mesmo tempo exprimo-o meu profundo pesar a toda a Nação Italiana. Sei, de facto, qual era a estatura deste homem que agora caiu sob a violência de mãos assassinas. Ele foi vítima da acção destruidora do terrorismo: tenho consciência disso. E disso é também consciente a Santa Mãe Igreja, ligada desde há 2.000 anos à história desta Terra e deste Povo.
Pelo sangue desta nova vítima, a Igreja eleva a sua voz a fim de que os homens se descubram a si mesmos e, com empenho renovado. ajam para a salvação da Pátria.
Queridos Jovens, rapazes e meninas
Os aplausos e o acolhimento festoso que quisestes reservar-me quando entrava nesta Sala, atravessando os vossos grupos, diferentes pelas idades e pelas classes escolares a que pertenceis, mas unânimes pelo entusiasmo, revelam já de per si o ânimo sincero, o interesse que pondes nas manifestações de fé, e o afecto que nutris pela Igreja e pelo Papa, seu Chefe visível.
Saúdo-vos a todos cordialmente e agradeço a alegria que proporcionais com a vossa significativa presença. Em primeiro lugar vós, que viestes aqui juntamente com os vossos pais, os vossos professores e os vossos párocos ao terminardes o curso de catecismo que vos preparou para receberdes com devoção e com fruto os Sacramentos da Primeira Comunhão e da Crisma; e depois saúdo todos os outros provenientes das escolas primárias, médias e superiores, entre os quais cito com satisfação dois Institutos romanos: o Liceu Linguístico do Sagrado Coração, à Trindade dos Montes, e o Liceu-Ginásio "Virgílio".
O meu pensamento dirige-se, em primeiro lugar, para os vossos educadores pelos incessantes cuidados que eles dedicam a vós, jovens, nos diversos ambientes da vossa vida familiar, escolar e recreativa, pela obra que eles realizam, com sabedoria e amor, a fim de vos fazer crescer como Jesus menino, "em sabedoria, em estatura e em graça diante de Deus e dos homens" (Lc 2,52).
Certamente nem a vós passa despercebida a importância que o próprio Jesus deu às crianças, as quais se tornaram muitas vezes protagonistas de algumas páginas do Evangelho e foram até apontadas como modelo para os grandes: "Se não voltardes a ser como as criancinhas. não podereis entrar no reino dos Céus" (Mt 18,3 Mc 10,15 Lc 18,17 Jn 3,3). Elas são o objecto de um tão terno acolhimento que poderia até parecer inconcebível com a altura misteriosa da sua personalidade, se não fossem os factos que no-lo asseguram. Não foi acaso Ele que disse aos seus discípulos: "Deixai vir a Mim as criancinhas" (Mc 10,14 Mt 19,14 Lc 18,16)?
Perante tanta predilecção, não só as crianças das escolas primárias, mas também os que cresceram e frequentam as escolas secundárias devem adquirir estímulo para amar cada vez mais a Jesus, para O conhecer e seguir sem nunca se cansarem nem recuarem. Escolhei Cristo como supremo Mestre e Salvador. Ele livrar-vos-á das paixões egoístas, das modas arbitrárias e do mimetismo de massa. Quantos jovens crêem ser livres porque se subtraíram à autoridade dos pais e dos educadores, sem contudo repararem que se tornaram vítimas do arbítrio de um grupo!
Tende confiança em Cristo e na Igreja que vo-1'O apresenta. Tende a coragem de demonstrar com os factos a força libertadora da sua caridade e do seu ensinamento. Contribuireis assim para tornar o mundo melhor, mais justo e mais fraterno, num momento em que a violência do ódio ensanguenta as ruas das nossas cidades. Isto será para vós uma experiência forte que vos requererá sacrifício e talvez também heroísmo, mas a vitória será nossa porque o Senhor repete-vos o mesmo que já um dia disse aos Pescadores da Galileia: "Tranquilizai-vos, sou Eu, não tenhais medo" (Lc 6,50).
Com estes pensamentos e com estes votos de todo o coração invoco sobre vós e sobre os vossos amigos a constante protecção do Senhor e a plenitude das suas bênçãos.
Quarta-feira, 20 de Fevereiro de 1980
(Antes da Catequese de 20 de Fevereiro Papa recebeu os jovens na Sala das Bênçãos)
Com o "sacramento do corpo" o homem sente-se sujeito de santidade
1. O Livro do Génesis faz notar que o homem e a mulher foram criados para o matrimónio:... O homem deixará o pai e a mãe para se unir à sua mulher; e os dois serão uma só carne (Gn 2,24). Deste modo se abre a grande perspectiva criadora da existência humana, que sempre se renova mediante a «procriação» que é «auto-produção». Tal perspectiva está radicada na consciência da humanidade e também na particular compreensão do significado esponsal do corpo, com a sua masculinidade e feminilidade. Homem e mulher, no mistério da criação, constituem dom recíproco. A inocência original manifesta , e ao mesmo tempo determina, o ethos perfeito do dom.
Disto falámos durante o precedente encontro. Por meio do ethos do dom é delineado em parte o problema da «subjectividade» do homem, que é sujeito criado à imagem e semelhança de Deus. Na narrativa da criação (espécialmente em Gn 2,23-25), «a mulher» certamente não é só «objecto» para o homem, permanecendo embora ambos, um diante da outra, em toda a plenitude da própria objectividade de criaturas, como «carne da minha carne e osso dos meus ossos», como varão e mulher, ambos nus. Só a nudez, que torna «objecto» a mulher para o homem ou vice-versa, é fonte de vergonha. «Não sentiam vergonha», quer dizer que a mulher não era para o homem «objecto» nem ele para ela. A inocência interior como «pureza de coração», em certo modo, tornava impossível que dalguma maneira um fosse baixado pelo outro ao nível de mero objecto. Se «não sentiam vergonha», quer dizer que estavam unidos pela consciência do dom, tinham recíproca consciência do significado esponsal dos seus corpos, em que se exprimia a liberdade do dom e se manifestava toda a interior riqueza da pessoa como sujeito. Esta recíproca compenetração do «eu» das pessoas humanas, do homem e da mulher, parece excluir subjectivamente qualquer «redução a objecto». Revela-se nisto o perfil subjectivo daquele amor, do qual por outro lado se pode dizer que «é objecto» até ao fundo, uma vez que se alimenta da mesma «objectividade» recíproca do dom.
2. O homem e a mulher, depois do pecado de origem, perderão a graça da inocência original. A descoberta do significado esponsal do corpo deixará de ser para eles simples realidade da revelação e da graça. Todavia, esse significado ficará como dever imposto ao homem pelo ethos do dom, inscrito no fundo do coração humano, como eco longínquo da inocência original. Desse significado esponsal formar-se-á o amor humano na sua verdade interior e na sua autenticidade subjectiva. E o homem — mesmo através do véu da vergonha — nele se descobrirá continuamente a si mesmo como guarda do mistério do sujeito, isto é, da liberdade do dom, de tal maneira que a defenderá de qualquer redução a posições de puro objecto.
3. Por agora, todavia, encontramo-nos diante do limiar da história terrestre do homem. O homem e a mulher não o transpuseram ainda no sentido da consciência do bem e do mal. Estão mergulhados no mistério mesmo da criação, e a profundidade deste mistério, oculto no coração deles, é a inocência, a graça, o amor e a justiça; Deus, vendo toda a Sua obra, considerou-a muito boa (Gn 1 Gn 31). O homem aparece no mundo visível como a mais alta expressão do dom divino, pois inclui em si a dimensão interior do dom. E com esta traz ao mundo a sua particular semelhança com Deus, graças à qual ele transcende e domina também a sua «visibilidade» no mundo, a sua corporeidade, a sua masculinidade ou feminilidade, e a sua nudez. Reflexo desta semelhança é também a consciência primordial do significado esponsal do corpo, consciência penetrada pelo mistério da inocência original.
4. Assim, nesta dimensão, constitui-se um primordial sacramento, entendido como sinal que transmite eficazmente ao mundo visível o mistério invisível oculto em Deus desde a eternidade. E este é o mistério da Verdade e do Amor, o mistério da vida divina, da qual o homem participa realmente. Na história do homem, é a inocência original que inicia esta participação e é também fonte de felicidade original. O sacramento, como sinal visível, constitui-se com o homem, enquanto «corpo», mediante a sua «visível» masculinidade e feminilidade. O corpo, de facto, e só ele, é capaz de tornar visível o que é invisível: o espiritual e o divino. Foi criado para transferir para a realidade visível do mundo o mistério oculto desde a eternidade em Deus, e assim ser sinal d'Ele.
5. Portanto, no homem criado à imagem de Deus foi revelada, em certo sentido, a sacramentalidade mesma da criação, a sacramentalidade do mundo. O homem, com efeito, mediante a sua corporeidade, a masculinidade e feminilidade, torna-se sinal visível da economia da Verdade e do Amor, que tem a fonte no próprio Deus e foi revelada já no mistério da criação. Sobre este fundo extenso compreendemos plenamente as palavras constitutivas do sacramento do matrimónio, presentes em Génesis 2, 24: «O homem deixará o pai e a mãe para se unir à sua mulher; e os dois serão uma só carne». Sobre este fundo extenso, compreendemos, além disso, que as palavras de Génesis 2, 25 «Estavam ambos nus, tanto o homem como a mulher, mas não sentiam vergonha», mediante toda a profundidade do significado antropológico que abraçam, exprimem o facto de, juntamente com o homem, ter entrado a santidade no mundo visível, criado para ele. O sacramento do mundo, e o sacramento do homem no mundo, provém da fonte divina da santidade, e ao mesmo tempo é instituído para a santidade. A inocência original, ligada à experiência do significado esponsal do corpo, é a santidade mesma que permite ao homem exprimir-se de modo profundo com o próprio corpo, isto precisamente mediante o «dom sincero» de si mesmo. A consciência do dom condiciona, neste caso, «o sacramento do corpo»: o homem sente-se, no seu corpo de varão e de mulher, sujeito de santidade.
6. Com tal consciência do significado do próprio corpo, o homem, como varão e mulher, entra no mundo como sujeito de verdade e amor. Pode afirmar-se que Génesis 2, 23-25 narra, por assim dizer, a primeira festa da humanidade, em toda a plenitude original da experiência do significado esponsal do corpo: e é uma festa da humanidade, que se origina nas fontes divinas da Verdade e do Amor, no mistério mesmo da criação. Embora bem depressa, sobre aquela festa original, se venha a desdobrar o horizonte do pecado e da morte (Gn 3), todavia já desde o mistério da criação chegamos a uma primeira esperança: isto é, de que o fruto da economia divina da verdade e do amor, que se revelou «ao princípio», é não a Morte, mas a Vida, e não tanto a destruição do corpo do homem criado «à imagem de Deus», quanto de preferência a «chamada para a glória» (Cfr. Rom Rm 8,30).
Saudações
Aos voluntários do Movimento dos Focolarinos
Uma especial saudação desejo reservar ao grupo dos voluntários dos Focolares, que se encontram nesta Audiência, vindos do Centro Mariopoli de Rocca di Papa, onde se reuniram para o seu Congresso anual, durante o qual meditaram sobre o tema: "A caridade como ideal".
Caríssimos, sinto grande satisfação por vos ver em tão grande número e cheios de entusiasmo, e faço votos por que leveis por toda a parte, com santa e serena alegria, o fogo e o ideal da caridade. O próprio Jesus fez da caridade o imperativo categórico para cada cristão: "Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; assim como Eu vos amei, vós também vos deveis amar uns aos outros" (Jn 13,34).
A caridade deve verdadeiramente ser o ideal do cristão, sempre, mas sobretudo na nossa sociedade moderna que tanta necessidade tem de bondade, compreensão, misericórdia, paciência, perdão e doação. Vivei, pois, corn grande alegria o ideal da caridade! A minha particular Bênção vos ajude também.
Aos participantes no Curso-Base para Casais animadores
da pastoral familiar
Dirijo agora as minhas boas-vindas aos participantes no Curso-Base para casais animadores da Pastoral Familiar, organizado pela Acção Católica Italiana e subordinado ao tema: "Noivos e Esposos na Comunidade".
Caríssimos, aprecio vivamente o vosso empenho em aprofundar que só Jesus Cristo, autenticamente conhecido, amado seguido e testemunhado, é a salvação também da família e sobretudo dos jovens que se preparam para o matrimónio. E exorto-vos a colaborardes generosamente com o vosso Pároco para a actuação das suas directrizes e dos seus programas de actividade nos vários campos do apostolado. A minha reconhecida e afectuosa Bênção vos acompanhe!
Ao Coro "Fischer" e à Orquestra sinfónica de Stuttgart (Alemanha)
Renovo com prazer ao "Coro Fischer" e à Orquestra sinfónica de Stuttgart a minha cordial saudação de boas-vindas à Cidade Eterna e ao Vaticano. Agradeço ao director e a todos os cantores o programa musical com que quisestes honrar-me a mim e a todos os participantes nesta Audiência. Vós planejastes não só esta viagem a Roma, mas também toda a múltipla e artística actividade do vosso coro, dentro e fora do vosso país, como um contributo à compreensão dos povos e à paz no mundo. A música e o canto coral são especialmente idóneos para unir os homens e fazer surgir uma comunidade, ainda que existam diferenças linguísticas e étnicas. Desejo de coração um grande êxito no vosso louvável esforço, e, por isso, peço a Deus que vos proteja e vos abençoe.
A um grupo de doentes de Innsbruck (Áustria)
Em nome de todos os presentes saúdo também muito cordialmente o grupo de jovens doentes de Innsbruck e aqueles que dos mesmos tomaram cuidado. A vossa presença é-me especialmente agradável porque vós, com a cruz dos vossos sofrimentos, estais unidos a Cristo de modo particular. A vossa doença, aceita e suportada a exemplo e com a força de Cristo que sofre, será para vós mesmos e para a Igreja unia preciosa fonte de consolação, de purificação e de fortaleza no mais profundo do ser humano. Oxalá seja isto o que Deus vos conceda com a sua graça e mediante a minha Bênção Apostólica.
Aos Doentes
Aos Doentes aqui presentes quero dirigir uma saudação muito particular. Caríssimos, sabei que o Papa está junto de vós. Sede fortes na fé e tende sempre diante dos olhos Jesus crucificado, conformando-vos a ele não só no facto de suportar pacientemente o sofrimento, mas também compreendendo quanto ele possa ser fecundo para vós e para os outros. Faço votos por que também vós possais repetir com São Paulo: "Alegro-me nos sofrimentos suportados por vossa causa e completo na minha carne o que falta aos sofrimentos de Cristo pelo Seu Corpo, que é a Igreja" (Col 1,24). E a minha Bênção cordial seja penhor da corroborante graça divina sobre vós e sobre aqueles que vos são queridos.
Aos jovens Casais
Uma afectuosa saudação dirijo, por fim, aos jovens Casais. Meus queridos, o matrimónio que contraístes é coisa tão grande que, como sabeis, os antigos Profetas e depois São Paulo vos consideraram um sinal da união entre Deus e o seu povo. Desejo-vos e peço ao Senhor que estejais sempre à altura desta nobreza, mediante um amor indefectível, que se exprima como uma constante doação recíproca numa comunhão total de pessoas, e seja fecundo de vida. Só sob esta luz podereis também enfrentar e superar as inevitáveis dificuldades que, longe de atenuar a vossa dedicação mútua, a consolidarão cada vez mais, segundo o texto do Cântico dos Cânticos: "As muitas águas não poderiam extinguir o amor, nem os rios o poderiam submergir" (Ct 8,7).
Assim seja com o auxílio da graça de Deus, que invoco em abundância sobre vós, ao conceder-vos também a minha Bênção.
AUDIÊNCIAS 1980 - AUDIÊNCIA GERAL