Discursos João Paulo II 1997 - 27 de Abril de 1997

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO CONGRESSO EUROPEU SOBRE AS VOCAÇÕES


29 de Abril de 1997



Caríssimos participantes
no Congresso Europeu sobre as Vocações!

1. É-me grato dirigir-vos a minha saudação de bons votos no início dos trabalhos sobre o tema empenhativo: «Novas Vocações para uma nova Europa». O Congresso, precedido por uma preparação cuidadosa, que envolveu muitas pessoas dedicadas à pastoral das vocações, constitui um grande sinal de esperança para as Igrejas do continente europeu e conflui providencialmente para aquele grande rio de experiências de fé, que recordam à Europa as suas raízes cristãs e às Igrejas a missão de anunciar Jesus Cristo às gerações do terceiro milénio.

A próvida iniciativa tem em vista chamar a atenção para a pastoral vocacional, reconhecendo nela um problema vital para o futuro da fé cristã no continente e, como reflexo, para o progresso espiritual dos próprios povos europeus. Não se trata de um aspecto sectorial ou marginal da experiência eclesial, mas sim do próprio modo de viver a fé em Jesus Cristo, único Projecto capaz de satisfazer as aspirações mais profundas do coração humano.

2. A vida tem uma estrutura essencialmente vocacional. O projecto que lhe diz respeito, com efeito, aprofunda as raízes no centro do mistério de Deus: «Foi assim que n’Ele — em Cristo — Deus nos escolheu antes da constituição do mundo, para sermos santos e imaculados diante dos Seus olhos» (Ep 1,4).

A inteira existência humana, portanto, é resposta a Deus, que faz sentir o Seu amor sobretudo nalguns momentos: o chamamento à vida; o ingresso na comunhão de graça da Sua Igreja; o convite a dar na Comunidade eclesial o próprio testemunho de Cristo, segundo um projecto inteiramente pessoal e irrepetível; a convocação à comunhão definitiva com Ele na hora da morte.

Não há dúvida, portanto, de que o empenho da Comunidade eclesial na pastoral vocacional é um dos mais graves e urgentes. Com efeito, cada baptizado deve ser ajudado a descobrir o chamamento que, no projecto de Deus, lhe é dirigido e a tornar-se-lhe disponível. Será assim mais fácil, a quem é destinatário duma vocação particular ao serviço do Reino, reconhecer o seu valor e aceitá-la com generosidade. Não se trata, com efeito, de educar as pessoas para fazerem alguma coisa, mas antes para darem uma orientação radical à própria existência e a fazerem opções que decidem para sempre do próprio futuro.

3. Nessa perspectiva, esse Congresso sobre as vocações ao Sacerdócio e à Vida consagrada na Europa constitui um acto de fé na acção eficaz e constante de Deus; um acto de esperança no futuro da Igreja na Europa; um gesto de amor para com o povo de Deus do «antigo continente», necessitado de pessoas plenamente dedicadas ao anúncio do Evangelho e ao serviço dos irmãos. Vós tendes em vista estabelecer as estratégias oportunas, para ajudar aqueles, que o Senhor escolhe para este empenho total, a descobrirem a própria vocação e a pronunciarem o seu «sim» sem reservas.

A vossa atenção dirige-se sobretudo aos jovens, para que saibam acolher o convite do Mestre a segui-l’O. Ele olhaos com olhar penetrante, de que fala o Evangelho de Marcos (cf. Mc Mc 10,21): um olhar evocativo do mistério de luz e de amor, que envolve e acompanha cada ser humano desde o primeiro instante da sua existência.

São bem conhecidas as dificuldades que hoje tornam difícil a adesão à proposta de Cristo. Entre estas: o consumismo, a visão hedonista da vida, a cultura da evasão, o subjectivismo exasperado, o temor diante dos compromissos definitivos, uma difundida carência de visão projectista.

Como o jovem rico, de que narra o Evangelho (cf. Mc Mc 10,22), não poucos rapazes percebem fortes resistências interiores e exteriores diante do apelo de Cristo e, não raro, retiram-se tristes, cedendo aos condicionamentos que os detêm. A tristeza que se abate no rosto do jovem rico é o risco recorrente de quem não sabe decidir-se para o sim ao chamamento; e a tristeza é só o aspecto daquele vazio de valores, que está no mais íntimo do coração e não raro induz, aquele que dele é vítima, a encaminhar-se pelas veredas de alienação, de violência e de niilismo.

O Congresso, todavia, não pode deter-se a examinar as embora evidentes problemáticas, que marcam o mundo juvenil. Ele tem sobretudo a tarefa de indicar às Comunidades cristãs os recursos, as expectativas, os valores presentes nas novas gerações, oferecendo ao mesmo tempo sugestões concretas para a elaboração, com base nessas premissas, de um sério projecto de vida inspirado no Evangelho. Quem ama os jovens não os pode privar desta nova e exaltante possibilidade de vida, à qual Cristo chama a pessoa em vista duma realização mais plena das próprias pontencialidades, como premissa para uma alegria íntima e duradoura. É preciso, portanto, envidar todos os esforços, para que os jovens cheguem a pôr Cristo no centro da sua busca e a seguir docilmente o seu eventual apelo.

4. Ao vosso Congresso grande luz pode vir das palavras do Apóstolo, que delineiam o estatuto teológico de cada Comunidade eclesial: «Há, pois, diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo; há diversidade de serviços, mas o Senhor é o mesmo; e há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos» (1Co 12,4-6). É nesta perspectiva que as Igrejas particulares devem empenhar-se em sustentar o desenvolvimento dos dons e dos carismas, que o Senhor não cessa de suscitar no Seu povo. Gerar no Espírito novas vocações é possível quando a Comunidade cristã é viva e fiel ao seu Senhor. Esta vitalidade profunda pressupõe um forte clima de fé, a oração capilar e assídua, a atenção à qualidade da vida espiritual, o testemunho de comunhão e de estima em relação aos múltiplos dons do Espírito, a paixão missionária ao serviço do Reino de Deus.

Deve-se, portanto, reafirmar que a pastoral vocacional não se pode exaurir em iniciativas ocasionais e extraordinárias, que se justapõem ao caminho normal da Comunidade eclesial. Deve antes constituir uma das preocupações constantes na pastoral da Igreja local. A respeito disso, o próprio ano litúrgico constitui uma escola permanente de fé, graças à qual cada baptizado é convidado a entrar no vivo do mistério de Deus, para se deixar plasmar à Sua imagem e semelhança.

5. Sabe-se como é urgente, hoje, a atenção pastoral à mediação educativa. Antes, uma Igreja particular só pode olhar com confiança para o próprio futuro, se for capaz de efectivar esta atenção pedagógica, provendo de modo constante ao cuidado dos formadores e, primeiros dentre todos, dos presbíteros. O Congresso, portanto, representa um convite a todos os chamados — sacerdotes, consagrados e consagradas — a serem testemunhas alegres no serviço do Reino, bem sabendo que a sua vida é presença sempre significativa ao lado dos jovens: ela encoraja ou desanima, suscita o desejo de Deus, ou então constitui um obstáculo a segui-l’O. A primeira proposta vocacional é oferecida por um testemunho coerente de Cristo ressuscitado.

O Congresso, além disso, quer favorecer o crescimento duma autêntica consciência educativa nos próprios formadores, chamados a uma grave e exaltante responsabilidade ao lado dos jovens: a de os acompanhar na sua busca, suscitando-os a respostas vocacionais generosas, para renovar neste período da Igreja o milagre da santidade, verdadeiro segredo da almejada renovação eclesial.

6. Caríssimos Irmãos e Irmãs! Está diante de vós uma tarefa certamente não fácil, mas a oração incessante, que está a acompanhar este encontro das Igrejas que estão na Europa, alimenta a esperança na promessa de Deus e nas respostas radicais ao Seu chamamento: elas são possíveis também nos nossos dias. É a oração o segredo capaz de garantir o renascer da confiança no interior das Comunidades cristãs. É a oração o apoio constante de quantos são chamados a servir a causa do Evangelho e a promover a pastoral das vocações nestes anos difíceis, mas não desprovidos de claros sinais de uma nova primavera espiritual. A profecia do radicalismo evangélico é um dom, que o Senhor, enfim, não deixará faltar à Sua Igreja no limiar do terceiro milénio.

Maria, modelo de toda a vocação e exemplo transparente de resposta sem reservas ao chamamento de Deus, vos acompanhe no vosso empenho pastoral ao serviço de «novas vocações para uma nova Europa».

Com estes votos, concedo a todos vós uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 29 de Abril de 1997.



                                                                       Maio

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO POVO LIBANÊS ANTES DA VIAGEM APOSTÓLICA






Queridos Irmãos e Irmãs do Líbano

Se Deus quiser, dentro de pouco tempo, irei ao vosso País para uma viagem apostólica, que há muito tempo desejo fazer. Agradeço vivamente aos Patriarcas e aos Bispos o seu convite fraterno. Estou grato às Autoridades civis do País pelas disposições tomadas, a fim de facilitar as diferentes etapas da minha visita. Os meus agradecimentos dirigem-se também a todos os Libaneses, que se prodigalizam para preparar a minha vinda. Conhecendo a hospitalidade libanesa, sei que posso contar com o acolhimento caloroso de todo o povo.

A minha viagem ao Líbano será para mim uma peregrinação na vossa terra, que faz parte da região que, há dois mil anos, foi palmilhada pelo Redentor. No espírito da visita realizada por Jesus a Tiro e a Sidónia, esta viagem tem uma finalidade profundamente religiosa e humana. Celebrarei convosco a fase conclusiva da Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para o Líbano, ao entregar- vos a Exortação Apostólica pós-sinodal.

Desde agora, devo exprimir o meu afecto profundo a todos os fiéis da Igreja católica, crianças, jovens e adultos, assim como aos membros das outras comunidades. Oro de modo especial pelos doentes e pelas pessoas que encontram dificuldades na sua vida quotidiana. Confio ao Altíssimo o empreendimento corajoso do povo libanês na via da reconciliação nacional e da reconstrução social, numa unidade e colaboração cada vez mais intensas. Tenho a certeza de que haveis de encontrar no amor à vossa terra a energia necessária, para vencerdes as divisões e superardes todos os obstáculos que se possam apresentar.

Irmãos e Irmãs da Igreja católica, vós todos homens e mulheres de boa vontade, convido-vos a preparar-vos espiritualmente para as diferentes manifestações religiosas, que viveremos juntos, a fim de darmos graças ao Senhor pela esperança que nos é concedida e de aceitarmos com coragem o apelo do Salvador a uma conversão sempre mais profunda dos corações e das mentalidades.

Deus vos abençoe a todos, a fim de poderdes fazer florescer a vossa terra, construir e transmitir aos vossos filhos um País onde reinem a paz e a concórdia entre todos os seus habitantes! Deus abençoe o Líbano!

Vaticano, 1 de Maio de 1997.


DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II

À «CONSULTAÇÃO ECUMÉNICA INTERNACIONAL

PERMANENTE DE RELIGIOSOS»


Sábado, 3 de Maio de 1997

Queridos Amigos

Dá-me grande prazer acolher no Vaticano a Permanent International Ecumenical Consultation of Religious, em representação das Comunidades religiosas de várias Igrejas cristãs e Comunidades eclesiais. «A graça e a paz da parte de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo estejam convosco» (Rm 1,7).

O vosso grupo procura desempenhar um papel muito específico no movimento ecuménico. Os cristãos têm sempre necessidade de ouvir de novo «a Palavra da reconciliação» que nos foi confiada no Evangelho (2Co 5,19). Todavia, os nossos esforços são com frequência obscurecidos pelas nossas divisões. A vossa singular contribuição consiste em dar testemunho do discipulado expresso na vida comum no Espírito, mediante a qual procurais viver em conformidade com a suprema lei evangélica do amor, em comunhão fraterna com os demais. Desta forma, enquanto reconheceis as diferenças, dais realce ao vínculo que, acima de todos os outros, pode construir a unidade do único Corpo de Cristo, a Igreja.

Formulo votos e rezo para que os vossos esforços dêem muito fruto, especialmente a vossa atenção ao valor do ecumenismo da vida consagrada como senda de formação cristã, de conversão e de transformação. Deus abençoe os vossos empreendimentos e derrame sobre vós as Suas abundantes dádivas espirituais.



MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AO MINISTRO-GERAL DOS FRADES MENORES


FRANCISCANOS POR OCASIÃO DO CAPÍTULO






Ao Reverendíssimo Padre HERMANN SCHALÜCK
Ministro-Geral dos Frades Menores

1. Por ocasião do Capítulo Geral Ordinário, que se realiza junto do Santuário da Porciúncula, lugar caro ao Pobrezinho de Assis, é-me grato fazer chegar a essa Ordem dos Frades Menores os meus cordiais sentimentos de felicitações. Foi precisamente ali que Francisco iniciou a sua vida evangélica (cf. 1 Cel. 22, FF 356) e terminou a sua jornada terrena (cf. 1 Cel. 110, FF 512), desejoso de «entregar a alma a Deus lá onde, pela primeira vez, tinha conhecido claramente a via da verdade» (1 Cel. 108, FF 507).

Ao dirigir-me a Vossa Reverência, quero fazer chegar aos Capitulares e a todos os Confrades que trabalham nas várias áreas do mundo a minha fervorosa saudação, desejando a cada um, com as palavras de São Francisco, «verdadeira paz do céu e sincera caridade no Senhor» (Ep. Fid. II, 1, FF 179).

2. «O mandato de evangelizar todos os homens constitui a missão essencial da Igreja, tarefa e missão que as vastas e profundas mudanças da sociedade actual não tornam menos urgentes» (Exort. Apost. Evangelii nuntiandi EN 14). Esta urgência é bem acolhida pela vossa Ordem, que a colocou entre os argumentos prioritários da reunião capitular. Nela quer-se reafirmar com vigor o empenho dos Frades Menores em seguir Cristo pobre, casto e obediente, para assim serem capazes de melhor anunciar a todos as sublimes verdades da Boa Nova, permanecendo «estáveis na fé católica » (RB XII, FF 109) e fervorosos na comunhão com a Santa Mãe Igreja (cf. Test. Sen., FF 135).

A obra apostólica e missionária, com efeito, será frutuosa se for realizada em sintonia com os legítimos Pastores, aos quais Cristo confiou a responsabilidade do Seu rebanho. A Ordem, por isso, deverá orientar os seus membros a colaborar de modo cada vez mais eficiente com as Igrejas locais, junto das quais eles prestam o seu apreciado serviço (cf. Fil Ph 1,5).

3. Na esteira de outros meus venerados Predecessores e, em particular, do Papa Paulo VI que, com a Carta Apostólica Quoniam proxime (AAS 65 [1973], 353-357), se dirigira ao Capítulo Geral de Madrid, quero também eu estar espiritualmente próximo dos trabalhos capitulares, que repropõem o tema da «Vocação da Ordem hoje», querendo aprofundá-lo na óptica da memória e da profecia.

Considerando o seu glorioso passado, rico de história, de santidade, de cultura e de empenho apostólico, os Franciscanos não podem deixar de sentir o empenho de estar à sua altura, esforçando-se por escrever novas e significativas páginas da própria história (cf. Exort. Apost. pós-sinodal Vita consecrata VC 110). Já no limiar do terceiro milénio, como não evidenciar a vocação e a missão evangelizadora da Ordem, as quais estão, por assim dizer, a peito da sua própria identidade

O apelo às origens e às fases salientes da história da Ordem deve ser assumido como paradigma para o actual empenho da Fraternidade, chamada a viver no hoje a missão que Deus, através da Igreja, lhe confiou mediante a profissão da Regra de São Francisco.

A «memória» do dom concedido por Deus à Igreja e ao mundo na pessoa do Pobrezinho, leva-vos a compreender as situações contemporâneas de modo renovado e a abrir-vos, numa linha de continuidade dinâmica, às expectativas e aos desafios do presente, para preparar com empenho construtivo o futuro.

4. A união vital entre o ontem, o hoje e o amanhã é necessária, para que a «memória» se torne «profecia». Com efeito, «a verdadeira profecia nasce de Deus, da amizade com Ele, da escuta atenta da sua Palavra nas diversas circunstâncias da história» (ibid., 84).

A autêntica «profecia» exige, além disso, que a Christi vivendi forma, compartilhada pelos Apóstolos (cf. ibid., 14.16) e feita própria por Francisco de Assis e pelos seus primeiros companheiros (cf. 1 Cel.22.24, FF 356.360-361), se torne norma para os Frades Menores deste último período de século, de maneira a entregarem intacta às gerações do terceiro milénio a herança espiritual recebida, através da mediação de tantos frades conhecidos e desconhecidos, das próprias mãos do Pai Seráfico.

A referência à experiência originária, suscitada pelo Espírito de Cristo Ressuscitado, abrirá com certeza a vossa Família a um futuro rico de esperança, ajudando- vos a descobrir nos acontecimentos quotidianos a presença de Deus operante no mundo, e a promover aquele sapiente diálogo entre fé e cultura, que hoje é particularmente necessário.

Com efeito, jamais deve ser esquecido que a vida consagrada, posta ao serviço de Deus e do homem, «tem a função profética de recordar e servir o desígnio de Deus sobre os homens, tal como esse desígnio é anunciado pela Escritura e resulta também da leitura atenta dos sinais da acção previdente de Deus na história» (Exort. Apost. pós-sinodal Vita consecrata VC 73).

Nessa perspectiva, torna-se indispensável, também para a vossa Ordem, um discernimento atento, que vos leve a interrogar- vos sobre o significado do vosso múnus na Igreja e sobre a vocação da Fraternidade franciscana no tempo presente.

5. O múnus específico dos Frades Menores foi indicado por São Francisco quando, na carta à inteira Ordem, escrevia: Louvai a Deus, «porque é bom, e exaltai-O nas vossas obras, porque vos enviou ao mundo inteiro a fim de testemunhardes a Sua voz, com a palavra e com as obras, e fazerdes com que todos conheçam que não há nenhum omnipotente senão Ele» (FF 216).

Esse múnus foi depois ilustrado pelos numerosos documentos da Igreja, relativos ao mandato de pregar a penitência, conferido à Ordem pelo Papa Inocêncio III (1 Cel. 33, FF 375) e confirmado ao longo dos séculos pelos meus venerados Predecessores.

A história inteira dos Menores confirma que o anúncio do Evangelho é a vocação, a missão e a razão de ser dessa Fraternidade. A própria Regra, ilustrando a vocação da Ordem na Igreja, recorda que os Frades são chamados a estar com Cristo e são enviados a pregar, curando os doentes (cf. Mc Mc 3,13-15 Mc 1 Cel. Mc 24,104 Exort. Apost. pós-sinodal Vita consecrata VC 41). Estas claras orientações do Fundador exigem a unidade e a complementaridade entre anúncio do Evangelho e testemunho da caridade. Trata-se duma tarefa apostólica e missionária, que interessa a todos: frades, clérigos e leigos. A Legenda dos três Companheiros recorda que «terminado o capítulo, [Francisco] conferia o encargo de pregar a quantos, clérigos e leigos, tivessem o Espírito de Deus e as capacidades requeridas» (Trium Soc. 59, FF 1471), enquanto os outros frades ofereciam a sua cooperação mediante a oração e a caridade.

6. Esta indispensável unidade da apostolica vivendi forma postula, portanto, que todos os frades, cada um segundo a própria condição e em conformidade com as capacidades específicas, se insiram a pleno título na única vocação evangelizadora da Ordem. E isto requer um constante esforço no plano da formação, que preceda e acompanhe o empenho dos trabalhadores na vinha do Senhor (cf. Exort. Apost. Evangelii nuntiandi EN 15). Seja cuidado vosso, portanto, garantir a todos, clérigos e leigos, uma côngrua formação, a fim de que cada frade seja capaz de se inserir, com espírito apostólico e adequada profissionalidade, no vasto campo da evangelização e das obras caritativas (cf. Mt Mt 10,7-8).

É necessário, além disso, que a acção apostólica e a obra de promoção humana sejam animadas por um constante espírito de oração, pois da experiência de Cristo brota o empenho de «encher o mundo com o Evangelho». Este é o significado profundo do conhecimento pessoal e interior de Cristo, que a Ordem, em comunhão com a Igreja inteira, é hoje chamada a promover no Povo de Deus. Como se sabe, a unidade entre evangelização e contemplação é ínsita na Regra dos Frades Menores, que convida a «não extinguir o espírito da santa oração e devoção» (RB V, FF 88). São Francisco recorda que «o pregador deve antes haurir no segredo da oração aquilo que, depois, proclamará nos discursos. Antes deve aquecer-se interiormente, para não proferir palavras frias no exterior» (2 Cel. 163, FF 747).

Da comunhão com Cristo, a vida apostólica e caritativa haurirá conteúdos, coerência e dinamismo. Da experiência da Sua presença vivificante brotarão também para os Frades Menores a força e a convicção do anúncio, que cria comunhão com Deus e com a Igreja, como recorda o apóstolo João: «O que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também vós tenhais comunhão connosco. Quanto à nossa comunhão, ela é com o Pai e com Seu Filho Jesus Cristo» (1Jn 1,3).

7. Reverendíssimo Padre, enquanto encorajo essa Fraternidade a enfrentar os trabalhos do Capítulo com o estilo evangélico que animou São Francisco, oro ao Senhor para que efunda abundantemente o Seu Santo Espírito sobre cada um dos Capitulares. A Maria Imaculada confio a reflexão destes dias para que, como Mãe e Rainha dos Menores, ajude cada frade a proclamar as maravilhas que o Senhor realiza no mundo, e estimule a vossa inteira Ordem a responder, com renovada dedicação, ao chamamento de Cristo.

Acompanho estes meus votos com uma especial Bênção Apostólica, que de coração concedo a Vossa Reverência, bem como aos Padres Capitulares e a todos os Frades Menores espalhados pelo mundo.

Vaticano, 5 de Maio de 1997.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO SENHOR MOHAMMAD HADI ABD KHODA'I



NOVO EMBAIXADOR DO IRÃ JUNTO DA SANTA SÉ

POR OCASIÃO DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS

5 de Maio de 1997



Excelência

Estou feliz por lhe dar as boas-vindas ao Vaticano e aceitar as Cartas Credenciais, mediante as quais Vossa Excelência é nomeado Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República Islâmica do Irã junto da Santa Sé. Grato pelas saudações da parte do seu Presidente, retribuo-lhas calorosamente, com a certeza das minhas orações ao Todo-poderoso pelo povo iraniano e pela sua paz e bem-estar.

A sua presença aqui hoje testifica os formais vínculos existentes entre a República Islâmica do Irã e a Santa Sé, bem como a nossa boa vontade em cooperar em questões de interesse bilateral e multilateral. As relações diplomáticas entre os vários Estados e a Santa Sé são verdadeiramente singulares, dado que a Sé Apostólica, enquanto goza de um antigo reconhecimento no seio da comunidade das nações e se empenha na diplomacia em conformidade com a lei internacional, possui as suas próprias características. A sua actividade diplomática reflecte esta diferença, que determina o seu modo de abordar as problemáticas de interesse tanto nacional como internacional. O Papa, como Sucessor do Apóstolo Pedro e cabeça da Igreja universal, é chamado a confirmar os próprios irmãos e irmãs na fé, revigorando a vida religiosa dos católicos em todas as partes do mundo. Portanto, não constitui uma surpresa o facto de a Santa Sé, baseando-se na amizade e na cooperação dos países onde vivem os membros da Igreja, seguir com atento interesse as suas condições de vida e o papel que desempenham na sociedade em geral.

Os católicos da República Islâmica do Irã constituem uma pequena minoria, mas estão presentes no seu País, Senhor Embaixador, desde os primeiros séculos da era cristã, e sempre fizeram parte da rica vida cultural da sua nação. A Santa Sé conta com a assistência das Autoridades iranianas para assegurar que continuem a gozar a liberdade de professar a própria fé e beneficiar de um número suficiente de Bispos, sacerdotes e outros membros religiosos. A Igreja que está no Irã, precisamente devido ao seu número exíguo, tem necessidade da solidariedade de outras Igrejas que, com a própria generosidade, estejam dispostas a contribuir com o pessoal necessário para um adequado cuidado pastoral.

A Santa Sé despende todos os esforços em vista de ajudar a comunidade católica do Irã a manter vivos os inúmeros sinais da presença cristã, a fim de que as Igrejas e os lugares sagrados no Irã não se tornem meros monumentos arqueológicos e tão-pouco sejam totalmente esquecidos. Ao mesmo tempo, essa pequena comunidade considera-se deveras iraniana, e a experiência de séculos de vida comum com os vizinhos muçulmanos pode ser extremamente útil na promoção da mútua compreensão e cooperação cada vez maiores entre os sequazes da fé cristã e os fiéis muçulmanos em toda a parte.

Esta importante questão leva-nos a considerar uma vez mais o compromisso, do qual falei com frequência e ao qual a Santa Sé adere firmemente, de promover o diálogo inter-religioso e, em particular, de desenvolver um diálogo permanente entre as religiões que possuem um comum ponto de referência na fé em Abraão. No ano de 1985, em Casablanca (Marrocos), expliquei o pensamento da Igreja acerca desta questão a milhares de jovens muçulmanos, que para lá foram a fim de me escutar: «Abraão é para nós [cristãos e muçulmanos] um mesmo modelo de fé em Deus, de submissão à Sua vontade e de confiança na Sua bondade. Cremos no mesmo Deus, o Deus único, o Deus vivo, o Deus que cria os mundos e leva as as Suas criaturas à própria perfeição» (Discurso aos jovens muçulmanos, 19 de Agosto de 1985, ed. port. de L’Osservatore Romano de 15 de Setembro de 1985, n. 1, pág. 10). Consequentemente, a Santa Sé tem confiança em que as Autoridades religiosas e os líderes governamentais hão-de colaborar, de maneira respeitosa e correcta, no crescimento do conhecimento recíproco e no progresso do diálogo comum entre os crentes e entre as religiões.

Esta referência à nossa fé no Deus único recorda-nos também o dever de trabalharmos juntos para a defesa dos valores humanos fundamentais. Vossa Excelência mencionou alguns sectores em que tal colaboração é possível, e é de bom grado que concordo com o seu desejo expresso de ver aumentar esta cooperação no futuro. Fundamentais entre os valores a tutelar são a liberdade religiosa, a liberdade de consciência e, além disso, os outros direitos que fluem da dignidade da pessoa e dos povos. De particular solicitude para os fiéis deve ser o progresso da justiça e da solidariedade, deveras essenciais para o bem-estar dos membros vulneráveis e necessitados da família humana.

Somente em um mundo de justiça e de paz as pessoas podem crescer na obediência a Deus e no serviço generoso dos seus semelhantes. A responsabilidade dos Estados em trabalhar em benefício de tal situação internacional não é uma simples exigência pragmática dos seus interesses potenciais; esta deriva da mesma natureza da responsabilidade que os líderes das nações assumem no serviço do seu povo. O respeito pela lei internacional e o empenhamento na negociação como modo de resolver tensões — também com a assistência da própria comunidade internacional, se for necessário — constituem imperativos da tarefa de edificar um mundo melhor, em que possam florescer a bondade e a religião. Hoje, todos nós devemos esperar e fomentar uma nova fase de cooperação internacional, mais solidamente fundamentada sobre a solicitude humanitária e a assistência efectiva a quem sofre, e menos dependente do cálculo insensível dos intercâmbios e benefícios técnicos e económicos.

As profundas tradições islâmicas do Irã e a sensibilidade religiosa do seu povo e dos seus líderes constituem motivos para uma bem fundada esperança de maiores abertura e cooperação com a comunidade internacional. Por sua vez, a Santa Sé estará sempre pronta a trabalhar em harmonia com aqueles que servem a causa da paz e salvaguardam a dignidade humana com que o Criador beneficiou cada ser humano.

Excelência, façolhe votos de bem no momento em que inicia a sua sublime missão como Representante diplomático do seu País junto da Santa Sé, assegurando- lhe a pronta cooperação dos vários departamentos da Cúria Romana. As minhas orações estão repletas de confiança de que o Altíssimo há-de derramar as Suas abundantes bênçãos sobre Vossa Excelência e sobre o querido Povo iraniano.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS NOVOS RECRUTAS DA GUARDA SUÍÇA PONTIFÍCIA


6 de Maio de 1997





Senhor Comandante
Senhor Capelão
Caros Oficiais e Membros da Guarda Suíça
Prezadas Senhoras e Senhores!

1. É para mim uma grande alegria saudar-vos, por ocasião deste dia celebrativo no Palácio Apostólico. Em particular, dou as boas-vindas aos novos recrutas, para os quais este dia reveste um significado particular, uma vez que hoje prestam juramento solene. Sinto-me feliz pelo facto de tantos parentes terem vindo a Roma, a fim de participar neste dia de festa. Precisamente a vossa presença, pais e parentes, exprime não só o vínculo de muitos católicos suíços ao Sucessor de Pedro, mas também a educação e o bom exemplo, mediante os quais transmitistes aos vossos filhos a fé cristã e o sentido do serviço desinteressado. Por isso, caros pais, digo-vos: «Deus vos recompense»!

2. Este dia permite-nos dirigir um olhar ao passado. Foi durante o «Saque de Roma» que os Guardas Suíços se puseram à prova, a superaram e defenderam o Papa. Muitos Guardas combateram por ele até à morte. Hoje já não deveis temer nenhum «Saque de Roma »! Contudo, incumbe a ameaça dum «saque da alma». Precisamente na nossa época muitos jovens estão em busca daqueles bens e valores, que não só preenchem as mãos, mas também e sobretudo a alma. Roma não é apenas a «Cidade eterna», rica de história, de cultura e de fé. Roma é também um convite à vida. Empregai o vosso tempo para usufruir as muitas possibilidades duma vida repleta de sentido que esta cidade vos oferece. Acolhei as oportunidades que vos são oferecidas aqui, para ampliardes o vosso horizonte cultural, linguístico e espiritual.

3. No momento em que alguns de vós jurarão hoje prestar com fidelidade o serviço na Guarda e outros renovarão este juramento no seu coração, podereis todos pensar naquilo que Jesus recomendou aos seus amigos: «Não temais os que matam o corpo e não podem matar a alma. Temei antes aquele que pode fazer perecer na Geena o corpo e a alma» (Mt 10,28). Jesus convida-nos a considerá-l’O parâmetro da nossa vida e do nosso comportamento, tal como Ele escolheu o divino Pai celeste como única medida e fulcro da Sua vida.

4. O período que transcorrereis em Roma será um momento excepcional na vossa existência, momento que muitas pessoas desejariam poder viver. Ao longo do ano, apesar dos compromissos requeridos pelo vosso serviço, exorto-vos a permanecer vigilantes, para escutardes os apelos de Deus no caminho que Ele quer percorrer convosco, hoje e nas etapas ulteriores da vossa existência. Vivei com espírito de fraternidade sincera e leal, ajudando-vos uns aos outros a crescer na fé e a levar uma vida que corresponde à vossa missão eclesial. A vossa formação e o serviço que sois chamados a prestar são necessários e essenciais. Mas ainda mais importante é que aproveiteis a ocasião para afirmar a vossa fé e amar cada vez mais a Igreja.

Neste dia, quero também exprimir-vos toda a minha gratidão pela vossa decisão de vos pordes à disposição do Sucessor de Pedro, durante algum tempo, e de ajudardes assim a garantir a ordem necessária e a segurança no território da Cidade do Vaticano. Entre as vossas diversas tarefas, sois chamados a acolher, com cortesia e gentileza, todos os peregrinos que se apresentam. Deste modo, ofereceis-lhes uma imagem cordial e acolhedora do Vaticano, dado que muitas vezes sois as primeiras pessoas às quais os visitantes se dirigem quando querem visitar o Vaticano.


Discursos João Paulo II 1997 - 27 de Abril de 1997