Discursos João Paulo II 1999 - Tbilisi, 9 de Novembro de 1999

MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


AOS PARTICIPANTES NA


43ª SEMANA SOCIAL DOS CATÓLICOS ITALIANOS




"Eis que faço novas todas as coisas" (Ap 21,5).

1. Venerados Irmãos no Episcopado, caríssimos Irmãos e Irmãs, estas são as palavras da Sagrada Escritura que há quatro anos propus à Igreja italiana no Congresso eclesial de Palermo, para infundir uma esperança nova na comunidade cristã e em toda a comunidade civil. O desejo de reavivar nos fiéis "o Evangelho da caridade para uma nova sociedade na Itália" fez nascer nessa época o propósito de caminhar "com o dom da caridade na história". Hoje, correspondendo ao desejo da Conferência Episcopal Italiana, sinto-me feliz de me dirigir a vós, participantes na XLIII Semana Social dos católicos italianos com esta mensagem, que haure força de outras palavras do Livro do Apocalipse: "A cidade não precisa do sol nem da lua para ficar iluminada, pois é iluminada pela glória de Deus" (Ap 21,23). A afirmação concerne directamente à Jerusalém celeste. Todavia, o crente sabe que também a "cidade eterna" poderá viver a sua verdadeira renovação, na medida em que receber a luz da "cidade de Deus".

Na vigília do Grande Jubileu do Ano 2000 quereria comunicar a vós e a quantos são chamados a projectar e promover o progresso da sociedade, uma grande confiança em Cristo Senhor da história. É n'Ele que "podemos entender completamente o homem, o mundo e também a Itália de hoje" (Discurso ao Congresso eclesial de Palermo: ed. port. de L'Osservatore Romano de 2 de Dezembro de 1995, n. 1, pág. 8). "Esta nação, que tem uma insigne e num certo sentido única herança de fé, é atravessada desde há muito tempo e hoje com especial força por correntes culturais que põem em perigo o fundamento mesmo desta herança cristã... Perceber a profundidade do desafio não significa porém deixar-se dominar pelo temor" (Ibid.,n. 2). O Concílio Ecuménico Vaticano II encorajou os responsáveis da sociedade, suscitando em todos o ardor do Espírito: "A Igreja louva e estima a actividade daqueles que se dedicam ao bem da vida pública e aceitam os respectivos cargos" (Gaudium et spes GS 75).

2. Antes de mais, exprimo o meu apreço pela escolha da Conferência Episcopal e da Comissão Científica organizadora de convocar esta Semana Social na cidade de Nápoles, "emblema" eloquente do Sul da Itália. Refiro-me, a este respeito, a quanto pude afirmar há quatro anos em Palermo: as povoações do Sul só poderão ser protagonistas do próprio resgate se forem sustentadas pela solidariedade de toda a nação.

Citando ainda esse Congresso eclesial, desejo reiterar que "não há renovação, mesmo social, que não parta da contemplação. O encontro com Deus na oração faz penetrar nos rumos da história uma força misteriosa que sensibiliza os corações, os induz à conversão e à renovação, e precisamente nisto se torna também uma poderosa força histórica de transformação das estrutruras sociais" (op. cit., n. 11, pág. 9). Precisamente em virtude da sua inspiração cristã, a mesma vocação europeia da Itália "pode oferecer um contributo essencial para a edificação de uma Europa do espírito" e "pode transformar a agregação política e económica numa verdadeira casa comum para todos os europeus, contribuindo para formar uma exemplar família de nações" (Discurso ao Embaixador da Itália: ed. port. de L'Osservatore Romano de 25 de Setembro de 1999, pág. 8).

À primazia da dimensão espiritual vincula-se também a prioridade da evangelização da cultura, terreno privilegiado em que a fé se encontra com a existência e a história do homem. Por isso, encorajo a prosseguirdes com confiança a actuação do Projecto cultural orgânico que a Igreja italiana se propôs.

3. Depois de um árduo período de discernimento, que envolveu os principais especialistas italianos, o tema deste encontro foi formulado com um interrogativo: "Qual sociedade civil para a Itália de amanhã?". Tema estimulador e urgente, já de alguma forma prenunciado na Assembleia eclesial de Loreto: "Os cristãos repropõem uma participação que é serviço, que nasce do amor e do interesse pela sociedade civil... com a vontade de partilhar a história dos homens" (Nota da Conferência Episcopal Italiana depois da Assembleia de Loreto, n. 36: Enchiridion CEI, n. 3, pág. 1506).

Onde o Estado reconhece a existência daquele conjunto de recursos culturais e associativos distintos do âmbito político e económico, que possuem uma original capacidade organizativa orientada para favorecer a convivência harmónica, abre-se o caminho para uma eficaz busca do bem comum. De igual modo, lá onde são organicamente valorizadas aquelas agregações de cidadãos que livremente se mobilizam com iniciativas de recíproco sustento e cooperação, instituem-se as premissas para uma convivência harmónica e fecunda. A aceitação dos princípios éticos que estão na base da convivência civil e, em particular, o sincero respeito do princípio e da subsidiariedade constituem as condições para um novo amadurecimento do espírito público e da consciência cívica em todos os cidadãos.

É motivo de conforto constatar que na sociedade existe um profundo fermento, que nasce da acção de muitas associações familiares preocupadas em fazer sentir o peso determinante da família nas escolhas sociais e políticas. Para este fermento contribui também o compromisso de um grande número de grupos e movimentos que se dedicam de modo diversificado à promoção dos direitos e dos deveres de cidadania.

Além disso, são louváveis as iniciativas que têm em vista a salvaguarda da criação, a melhoria da qualidade de vida, a obra do voluntariado de cada forma de serviço, a formação cultural e empresarial, e o progresso da participação democrática no território. São movimentos que actuam a partir de baixo, acompanhados pelo crescente dinamismo da "economia social" (também denominada "terceiro sector"), constituindo um vasto e variado arquipélago de formações sociais com base no voluntariado.

Trata-se de fenómenos que podem muito bem qualificar-se como "tesouro" da sociedade civil, porque constituem o lugar privilegiado para a elaboração e a reactualização dos valores.

4. A "chave" que deveria abrir a porta da sociedade política para a sociedade civil é o princípio de subsidiariedade. O meu predecessor Pio XI definiu-o com clarividência como "importantíssimo princípio da filosofia social" demonstrando que, "assim como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efectuar com a própria iniciativa e indústria, para o confiar à colectividade, do mesmo modo passar para uma sociedade maior e mais elevada o que sociedades menores e inferiores podiam conseguir é uma injustiça"; com efeito, "o fim natural da sociedade e da sua nação é coadjuvar os seus membros, não destrui-los, nem absorvê-los" (Quadragesimo anno, 79). Se a autoridade suprema do Estado respeitar e valorizar plenamente a acção dos organismos menores, então "poderá desempenhar mais livre, enérgica e eficazmente o que só a ela compete, porque só ela o pode fazer" (Ibid., n. 80).

O princípio de subsidiariedade foi sempre confirmado na sua validade pelo magistério pontifício. O Concílio Vaticano II auspiciou que todos os cidadãos tenham "a possibilidade efectiva de participar livre e activamente tanto no estabelecimento dos fundamentos jurídicos da comunidade política como na gestão da vida pública e na determinação dos limites do campo de acção das várias instituições" (Gaudium et spes GS 75). Por isso, "reconheçam-se, respeitem-se e promovam-se os direitos de todos os indivíduos, famílias e grupos, assim como o exercício dos mesmos, juntamente com os deveres cívicos, que obrigam todos os cidadãos" (Ibidem). A admoestação do Concílio é explícita: "Os governantes abstenham-se de obstacular as associações familiares, sociais e culturais, os organismos e instituições intermediárias, ou de impedir as suas actividades legítimas e eficazes; pelo contrário, que de bom grado as favoreçam dentro da ordem" (Ibidem).

Em várias ocasiões também eu recordei estes princípios, sobretudo na Encíclica Centesimus annus, relevando que o Estado deve criar as condições favoráveis para o livre exercício da actividade económica e que uma sociedade de ordem superior não deve interferir na vida interna de uma sociedade de ordem inferior, privando-a das suas competências, mas antes sustentá-la caso seja necessário e ajudá-la a coordenar a própria acção com aquela das outras componentes sociais, em vista do bem comum" (Cf. ibid., nn. 15 e 48).

5. Para a Semana Social, o Grande Jubileu do Ano 2000 representa um vigoroso estímulo à reflexão sobre o contributo a dar às expectativas da população italiana e à mesma missão da Igreja na evangelização dos pobres. Com efeito, é óbvio que "o empenho pela justiça e pela paz num mundo como o nosso, marcado por tantos conflitos e por intoleráveis desigualdades sociais e económicas, é um aspecto qualificante da preparação e da celebração do Jubileu" (Tertio millennio adveniente, TMA 51). Aplicando isto, na Bula de proclamação do Ano Santo Incarnationis mysterium escrevi que uma das finalidades do Jubileu é contribuir para criar "um modelo de economia ao serviço de toda a pessoa" (n. 12).

Muitas vezes tive ocasião de abordar o tema da globalização, um grande sinal dos nossos tempos. Na Encíclica Centesimus annus convidei todos os responsáveis a promover "organismos internacionais de controle e orientação que encaminhem a economia para o bem comum" (n. 58). Recentemente, solicitei a elaboração de determinados "códigos éticos" e "instrumentos jurídicos" mediante os quais se possam "enfrentar as situações cruciais" para poder eliminar o antigo drama pelo qual são sempre "primeira e maiormente... os mais débeis a pagar" (Discurso à Fundação "Centesimus annus Pro Pontifice", ed. port. de L'Osservatore Romano de 18 de Setembro de 1999, n. 2, pág. 11).

Em virtude da sua vocação, os cristãos são chamados a identificar as sendas percorríveis para exercer este dever da justiça social, compartilhável por todos os homens que colocam no âmago de cada projecto político a pessoa humana e o bem comum. Também no campo financeiro e administrativo é necessário "ter sempre como objectivo jamais violar a dignidade do homem, construindo para isto estruturas e sistemas que favoreçam a justiça e a solidariedade para o bem de todos" (Ibid., n. 3). A mesma globalização "terá efeitos positivos se puder ser sustentada por um forte sentido do carácter absoluto e da dignidade de cada pessoa humana e do princípio de que os bens da terra são destinados a todos". Por isso, "é bastante oportuno apoiar e encorajar aqueles projectos de "finanças éticas", de microcrédito e de "comércio equitativo e solidário" que estão ao alcance de todos e possuem um valor positivo, também pedagógico, na direcção da co-responsabilidade global" (Ibid., n. 4).

6. O coração da sociedade é a família. Assente no matrimónio, ela constitui uma comunidade estável, um santuário do amor e da vida, a célula essencial do tecido social. Da "saúde" da família depende o bem-estar da sociedade. Todos os animadores da vida pública têm a tarefa de colaborar para o bem do núcleo familiar. Para as autoridades civis este é um dever sagrado, que comporta a tutela da elevadíssima missão dos pais.

A salvaguarda da dignidade humana desde a concepção, princípio fundamental do direito natural, "espera da legislação positiva do Estado o pleno reconhecimento, que deriva da consciência de que na maternidade existe um valor indiscutível para a pessoa e a inteira sociedade" (Discurso ao Embaixador da Itália: op. cit.).

O porvir da sociedade está colocado totalmente na juventude. "É... na educação das jovens gerações que a experiência religiosa da Nação italiana se pode orgulhar de uma genialidade criativa de instituições escolares, em grande parte orientadas para os menos afortunados, que merece respeito e apoio mediante a efectiva igualdade jurídica e económica entre as escolas estatais e não estatais... Em nome da particular solicitude que nutro pelas jovens gerações, sinto-me impelido a pedir a todas as componentes da sociedade italiana um esforço concorde, para superar atrasos e lentidões e assegurar às novas gerações o trabalho que liberta a personalidade e enriquece a convivência civil" (Ibidem). Infelizmente, no mundo dos jovens o flagelo do desemprego alcançou uma condição de desumanidade, que aguarda a solução da parte de uma acção de justiça inteligente e tenaz.

Desde as suas origens, e na epoca contemporânea com a Encíclica Rerum novarum, a Igreja proclamou e pôs em prática a opção preferencial pelos pobres, considerando-a como uma "forma especial de primado na prática da caridade cristã" (Centesimus annus CA 11 cf. Sollicitudo rei socialis SRS 42). Acompanho com solicitude os dados segundo os quais também na Itália se está a acentuar a desigualdade entre ricos e pobres, enquanto a condição de pobreza se alarga e se diversifica. Estes dados ressentem-se de fenómenos complexos e em parte extranacionais. Porém, não é lícito resignar-se aos mesmos, mas é necessário responder com um renovado compromisso na solidariedade e na justiça, procurando novos caminhos que permitam conjugar as exigências económicas e sociais.

7. Caríssimos! A fé viva impele rumo ao empenhamento pela promoção do bem comum na sociedade. A certeza sobrenatural de que "para Deus nada é impossível" torna-se uma confiança humana de que a justiça é possível no mundo. Para os cristãos a Eucaristia constitui a inexaurível fonte de energia também em vista do serviço social e político. O Pão do céu é uma dádiva de Deus para o corpo e o espírito. O Evangelho é luz que ilumina a convivência humana com o amor divino.
"Bem-aventurados" são hoje e sempre os "que têm fome e sede de justiça" (Mt 5,6). Não obstante este seu compromisso abnegado possa atrair sobre si a perseguição (cf. Mt Mt 5,10). O político cristão deverá caminhar sem cessar à luz desta consciência, procurando reanimar em si próprio aquele espírito de serviço que, juntamente com as necessárias competência e eficácia, é capaz de tornar transparente e coerente a sua actividade (cf. Exortação apostólica Christifideles laici CL 42). Ele sabe muito bem que "a caridade que ama e serve a pessoa nunca poderá estar dissociada da justiça... Os fiéis leigos devem dar testemunho daqueles valores humanos e evangélicos que estão intimamente ligados à própria actividade política, como a liberdade e a justiça, a solidariedade, a dedicação fiel e desinteressada ao bem de todos, o estilo simples de vida, o amor preferencial pelos pobres e últimos" (Christifideles laici CL 42).

Nesta minha "segunda Pátria" que é a Itália não posso deixar de expressar os votos por que a sociedade civil seja sempre animada pela tradição e cultura cristãs. A caridade exercida pela justiça fará germinar sempre na colectividade a harmonia da concórdia, que Santo Agostinho considera a mais elevada resposta do Evangelho de Cristo às aspirações da humanidade: "O que é uma comunidade de cidadãos, se não uma multidão de pessoas unidas entre si pelo vínculo da concórdia? (...) No Estado, aquela a que os músicos chamam harmonia é a concórdia: a concórdia cívica não pode existir sem a justiça" (Ep 138, 2, 10; cf. Civitate Dei, 2, 21, 1).
Estes são os bons votos, unidos à oração, que formulo em prol da querida Nação italiana, enquanto a todos vós que a servis em nome de Cristo envio de coração uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 10 de Novembro de 1999.

PAPA JOÃO PAULO II




MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II


POR OCASIÃO DO ENCONTRO


"IGREJAS IRMÃS, POVOS IRMÃOS"


REALIZADO EM GÉNOVA




Ao venerado Irmão
Cardeal EDWARD I. CASSIDY
Presidente do Pontifício Conselho
para a Promoção da Unidade dos Cristãos

Sinto-me particularmente feliz por transmitir a minha saudação aos ilustres representantes das Igrejas e Confissões cristãs que participam no encontro "Igrejas irmãs, Povos irmãos". Essa assembleia coloca-se idealmente na esteira daquela de Assis, que continua a produzir preciosos frutos de paz e de diálogo, tanto entre os cristãos como entre os membros das outras grandes religiões mundiais. Agradeço à Comunidade de Santo Egídio que, com coragem e audácia, sustém esta singular peregrinação que continua a percorrer diversas cidades do mundo para que os homens e as mulheres se descubram irmãos e irmãs, membros da mesma família humana.

Na Assembleia inter-religiosa que se realizou no mês de Outubro passado no Vaticano, ao dirigir-me aos cristãos, dizia: "Aqueles de entre nós que são cristãos acreditam que tal esperança é um dom do Espírito Santo, que nos chama a alargar os nossos horizontes, a olhar para além das nossas necessidades pessoais e das carências das nossas comunidades particulares, tendo em vista a unidade de toda a família humana... Desta consciência espiritual brotam a compaixão e a generosidade, a humildade e a modéstia, a coragem e a perseverança. Estas são as qualidades de que a humanidade tem necessidade mais do que nunca, enquanto entra no novo milénio" (L'Osservatore Romano, ed. port. de 20/11/99, pág. 10). Por isso, estou particularmente feliz por que em Génova se realiza esta assembleia de cristãos, para reflectirem e fortalecerem o empenho em continuar no caminho da unidade.

Quereria saudar, antes de tudo, os Patriarcas e os representantes das diversas Igrejas do Oriente ali reunidos. A sua presença, juntamente com a dos representantes da Igreja católica, serve de conforto e de estímulo para todos. Uno-me de bom grado à oração e aos sentimentos fraternos que pulsam no coração de cada um e, ao mesmo tempo, dão graças a Deus pelos frutos que o diálogo ecuménico produziu nestes últimos anos. Na Encíclica Ut unum sint, ao referir-me de modo particular ao século que está a terminar, eu observava que "foi a primeira vez na história, que a acção em prol da unidade dos cristãos assumiu proporções tão amplas e se estendeu num âmbito tão vasto" (n. 41). Aconteceu que "os cristãos pertencentes a uma confissão já não consideram os outros cristãos como inimigos ou estranhos, mas vêem neles irmãos e irmãs" (Ibid., n. 42).

A fraternidade reencontrada entre os cristãos, de facto, é um dos frutos mais preciosos do diálogo ecuménico. Como canta o Salmista, ela certamente faz-nos saborear a alegria dos irmãos que se encontram juntos (cf. Sl Ps 132 [133] 1), mas torna-nos também mais conscientes da gravidade do pecado da divisão, escândalo para nós e para o mundo. Por isso, não podemos retardar o passo rumo à unidade das Igrejas. Com efeito, todo o atraso arrisca não só de diminuir a alegria fraterna, mas de nos tornar cúmplices das divisões que se estimulam em várias partes da terra. Quanto mais se fortalecer a fraternidade entre as Igrejas, tanto mais os povos serão ajudados a reconhecer-se como irmãos. A fraternidade, de facto, é uma energia que supera qualquer limite e produz os seus frutos para todo o género humano.

Neste espírito, que quis indicar como o "espírito de Assis", desejo saudá-lo, Senhor Cardeal, pedindo-lhe que faça chegar a expressão da minha afectuosa recordação à amada Arquidiocese genovesa e ao seu Arcebispo, Cardeal Dionigi Tettamanzi, assim como à Comunidade de Santo Egídio, que com ela organizou esse encontro. Além disso, dirijo uma cordial saudação a todos os participantes, assegurando-lhes a minha lembrança na oração, para que no amor fraterno possamos cruzar o limiar do novo século como servidores de Cristo e do seu Evangelho. Acompanho estes votos com a Bênção Apostólica.

Vaticano, 11 de Novembro de 1999.

PAPA JOÃO PAULO II


DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


ÀS RELIGIOSAS CAPITULARES


DAS IRMÃS FRANCISCANAS DA PENITÊNCIA


E DA CARIDADE CRISTÃ


Segunda-feira, 15 de Novembro de 1999



Queridas Religiosas!

Com afecto no Senhor vos saúdo, Irmãs Franciscanas da Penitência e da Caridade Cristã, por ocasião do vosso Capítulo Geral. A minha saudação cordial é dirigida sobretudo à Irmã Christiana Pecoraro, vossa Superiora-Geral, e às Irmãs que participam no Capítulo. Asseguro a todas vós a minha proximidade na oração nestes dias, durante os quais procurais discernir, com espírito de reflexão orante, a orientação mais adequada para enfrentar os desafios do presente, confiantes na força da graça de Deus para criar um futuro de esperança e renovar todas as coisas em Cristo.

O tema que escolhestes para o vosso Capítulo, "Motivadas em Deus", reflecte o empenho em edificar, partindo do rico património espiritual da vossa fundadora, Madre Magdalen Daemen, que inspirou o testemunho de consagração religiosa e de empenho missionário de gerações de Irmãs nos Países Baixos, Alemanha, Polónia, Indonésia, Brasil e Estados Unidos. A fecundidade daquele carisma de fundação continua a ser evidente hoje nas mais recentes missões da vossa Congregação na Tanzânia, Líbia, México, Guatemala, Irian Ocidental e Timor Leste e Oeste.

Como podemos deixar de reconhecer, no centro deste louvável "movimento" espiritual e apostólico, a pessoa de Jesus Cristo, Filho de Deus, que Madre Magdalen conheceu e amou desde os seus primeiros anos? Foi Cristo que escolheu cada uma de vós (cf. Jo Jn 15,16) e vos enviou, na força do Espírito Santo, a fim de produzirdes fruto para o crescimento do seu Reino. Toda a missão tem a sua origem última no movimento da graça de Deus no nosso coração. Todo o apostolado é inspirado pela chamada de Cristo ao seguimento e sobre ela está fundado. Por este motivo, encorajo-vos, como autênticas filhas de São Francisco, a promover em todos os aspectos da vida da vossa Congregação o empenho na conversão, penitência, oração intensa e contemplação, como base da vossa presença e missão no mundo. "Motivadas em Deus", oxalá sejais, portanto, canais da sua paz num mundo muitas vezes tragicamente conturbado por conflitos, divisões e injustiças.

O vosso Capítulo reúne-se de maneira significativa na vigília da celebração do Grande Jubileu por parte da Igreja, que tem em vista conferir-lhe "uma consciência nova da missão salvífica recebida de Cristo" (Carta Apostólica Tertio millennio adveniente, TMA 21). Uma parte relevante do Capítulo Geral, de facto, será uma peregrinação a Greccio, lugar em que São Francisco proclamou o mistério da encarnação de Cristo em toda a sua simplicidade e beleza radiosa. Que a luz de Cristo e a alegria do Grande Jubileu cumulem de esperança o vosso coração durante estes dias de discernimento e decisão, e despertem em todas as Irmãs Franciscanas da Penitência e da Caridade Cristã um renovado empenho na missão da Congregação! Enquanto procurais satisfazer as exigências das numerosas pessoas com as quais vos encontrais nos vários apostolados, oxalá, como São Francisco, irradieis a "paz de Deus que supera toda a inteligência" (Ph 4,7) e convida o coração humano, entre o rumor e as distracções do mundo, a conhecer e a amar Jesus Cristo e a viver na justiça e na paz, como amados filhos e filhas de Deus. Como Congregação internacional, o vosso testemunho de caridade fraterna e de respeito pelos outros e o vosso empenho pela justiça, a promoção dos direitos do homem e da sua dignidade, a educação e a solicitude, possam ser um sinal importante da presença do Reino universal de Cristo e da sua infinita graça reconciliadora. De modo muito especial, as vossas Irmãs idosas, que representam uma fonte tão rica de espiritualidade e de sabedoria, podem servir de exemplo e, com as suas orações e sacrifícios, ser uma fonte de imensa graça e de fecundidade espiritual no cumprimento da missão da Congregação nesta geração.

Queridas Irmãs, sabemos que "a missão revigora a vida consagrada, lhe dá novo entusiasmo e novas motivações, solicita a sua fidelidade" (Vita consecrata VC 78). Dado que o vosso Capítulo Geral tem em vista promover na vida de cada religiosa e da inteira Congregação a plena fidelidade ao carisma de fundação e uma união sempre mais profunda entre a mente e o coração com a Igreja universal, oro a fim de que todas vós experimenteis aquela renovação interior que é o fundamento e a garantia da fecundidade no apostolado.

Ao invocar sobre vós a luz e a força do Espírito Santo, concedo de coração a minha Bênção Apostólica como penhor de graça e de paz em nosso Senhor Jesus Cristo.



DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II


AO PRIMEIRO GRUPO DE BISPOS


DA ALEMANHA EM VISITA


«AD LIMINA APOSTOLORUM»


Segunda-feira, 15 de Novembro de 1999

Senhor Cardeal
Caros Irmãos no Episcopado!

1. Bem-vindos à casa do Bispo de Roma, que vos recebe com grande alegria para aquele vínculo de comunhão, que une todos os Pastores como sucessores do Colégio apostólico, reunido à volta de Pedro. O objectivo principal da vossa peregrinação aos túmulos dos Príncipes dos Apóstolos Pedro e Paulo é reavivar em vós a graça do ministério episcopal e o empenho na vossa missão pastoral. A mim, como Sucessor de Pedro, compete a tarefa de vos confirmar na fé e no vosso serviço apostólico (cf. Lc Lc 22,32). Ao mesmo tempo, é-me dada a possibilidade de assegurar, por vosso intermédio, a minha proximidade espiritual também aos sacerdotes, diáconos, religiosos e leigos das Igrejas particulares a vós confiadas: "Que o Deus da constância e da consolação vos conceda que tenhais uns para com os outros os mesmos sentimentos segundo Jesus Cristo, para que, com um só coração e uma só voz, glorifiqueis a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo" (Rm 15,5-6).

2. A circunstância da vossa visita ad Limina ocorre num momento particular. Enquanto apenas algumas semanas nos separam do início do terceiro milénio, estes dias trazem à nossa memória os acontecimentos extraordinários que, há dez anos, assinalaram a "viragem" na vossa pátria. O muro de Berlim foi derrubado. O arame farpado foi substituído pelas portas abertas. A Porta de Brandeburgo, durante decénios símbolo da separação, voltou a ser o que era antes: o símbolo da Alemanha unificada. Ao ver-vos, caros Irmãos, Pastores das dioceses dos Departamentos antigos e novos, unidos todos em torno de mim nestes dias da vossa visita ad Limina, dou graças a Deus que, com a sua providência dirige a história, e repito as palavras do Salmista: "Como é bom, como é agradável viverem os irmãos em unidade!" (Ps 133,1).

A relevância do momento histórico que estamos a viver induz-me a assumir como tema desta visita ad Limina um argumento fundamental, como é o da Igreja que, "em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, e o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano" (Lumen gentium LG 1). Ao reservar-me enfrentar com os outros dois grupos dos vossos Irmãos no Episcopado diferentes aspectos do argumento, quereria olhar hoje, juntamente convosco, para o mundo que actualmente na vossa pátria circunda a Igreja como "casa de Deus no meio dos homens" (cf. Tm 3, 15; Ap 21,3). A realidade social é certamente muito complexa para ser ilustrada em poucas linhas. Devemos contentar-nos com alguns elementos essenciais, para compreendermos todo o conjunto.

3. Após a "revolução de veludo" que, há dez anos, sem derramamento de sangue, abriu o caminho à liberdade, acenderam-se grandes esperanças. Naquela época todos falavam de "paisagens floridas". Mas muitos daqueles que sonhavam de olhos abertos, devem hoje contentar-se de poder dispor do indispensável para uma existência razoavelmente tranquila. Respondestes com coragem aos desafios do último decénio e continuais a ajudar, mediante a palavra e a acção, as pessoas desejosas de construir a sua existência sobre uma base segura. Por isto, exprimo o meu sincero reconhecimento a vós e a todos aqueles que vos sustentam no vosso empenho nem sempre fácil.

Congratulo-me convosco por todo o bem que a Igreja na Alemanha está a fazer através da sua presença e do seu trabalho na sociedade civil, na vida política, no âmbito caritativo e através da sua generosidade financeira onde quer que se sinta a sua necessidade. Como exemplo entre muitos outros, quereria recordar aqui o serviço importante que os consultórios da Igreja prestam em numerosos sectores, em particular no sector a favor das mulheres grávidas, que se encontram em dificuldade. Ressalto também a acção de fidelidade generosa com que o Consórcio das Dioceses na Alemanha, apesar das dificuldades da situação económica, sustenta o ministério pastoral do Bispo de Roma ao serviço da Igreja universal. O meu pensamento dirige-se também à cidade de Berlim, a capital, onde se tornou possível - não por último graças à vossa ajuda - a construção de uma sede apropriada para o Representante Pontifício. Estes factos demonstram que o vosso coração pulsa pelo Sucessor de Pedro, que é "o perpétuo e visível fundamento da unidade, não só dos Bispos mas também da multidão dos fiéis" (Lumen gentium LG 23). Ao considerar uma tão firme convicção, é possível nutrir a certeza de que também no futuro a casa de Deus, que é a Igreja na Alemanha, permanecerá solidamente fundada sobre a rocha.

4. Os habitantes do vosso País vivem no contexto da chamada "sociedade de consumo", na qual a média da população se encontra numa situação de bem-estar material jamais conhecida. Contudo, trata-se sem dúvida de uma conquista que não está isenta de aspectos negativos. Depois da "viragem", especialmente nos novos Departamentos federais pode-se falar até mesmo de "impacto consumista". Para relançar a economia, muitas necessidades até agora desconhecidas foram suscitadas e continuamente reforçadas, mediante uma forte publicidade, cujo objectivo é convencer que se pode sempre ter tudo. Os bens materiais são postos em evidência com uma tal insistência que sufocam muitas vezes qualquer desejo de valores religiosos e morais. Mas com o passar do tempo, se a alma permanece sem nutrimento e somente as mãos ficam cheias, o homem experimenta o vazio: "Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus" (Mt 4,4 cf. Dt Dt 8,3).

Neste contexto, quereria exprimir a minha solicitude quanto ao significado do domingo, que cada vez mais está ameaçado de esvaziamento. Aprecio as vossas iniciativas que têm em vista salvaguardar o domingo como dia do Senhor e dia do homem. Na Carta Apostólica Dies Domini ilustrei amplamente estas dimensões. Além disso, não posso deixar de mencionar a vossa declaração programática sobre a situação económica e social na Alemanha, elaborada depois de um amplo processo de consulta com as comunidades eclesiais evangélicas e que encontrou grande eco na opinião pública. Nesta tarefa fostes inspirados por um pensamento que também a mim está muito a peito: o homem, enquanto pessoa, não deve ser esmagado pelos interesses económicos. É este um risco real, porque a sociedade de consumo, onde Deus com frequência é dado por morto, criou muitos ídolos, entre os quais está em evidência o do lucro a qualquer preço.

5. Outro fenómeno no mundo que vos circunda é representado pelos meios de comunicação social. Na rede dos modernos "mass media", as notícias podem ser divulgadas no inteiro globo terrestre em tempo real. Muitas vezes, o homem não é só atingido pela informação, mas por ela é como que sufocado, de tal maneira que já não é capaz de controlar, avaliar e seleccionar as notícias. A consequência é que o homem permanece sozinho, angustiado e desorientado. E isto porque na sociedade pluralista se fala, sem freio algum, de tudo aquilo que promete novidade e sensação. Certamente, há também programas informativos e espectáculos de valor, que merecem apreço, mas é necessário educar para um amadurecimento crítico, capaz de seleccionar com sabedoria.

Por isso, a sociedade da informação representa um desafio para os Pastores. É preciso empenhar-se, por um lado, para fazer crescer nas pessoas a maturidade crítica a que me referi e, por outro, para promover uma melhor qualidade das notícias. A Igreja é chamada a "evangelizar" também os mass media! Bem utilizados, eles podem tornar-se para os Pastores uma espécie de púlpito. É necessário escolher com atenção os homens e as mulheres encarregados de fazer ecoar a voz da Igreja nos comités e conselhos da rádio e televisão. Seja vosso cuidado sustentar os jovens que desejam servir a verdade no mundo do jornalismo!

A experiência quotidiana ensina que a Igreja é um argumento atraente para muitos jornalistas. É oportuno não subestimar este dado. Convirá, por isso, não rejeitar por princípio qualquer aproximação a eles, mas mostrar que estais "sempre prontos a responder a todo aquele que vos perguntar a razão da vossa esperança" (1P 3,15). Contudo, isto não exclui o dever de uma reservada discrição, imposta quer pelas exigências do respeito recíproco quer pela necessidade de uma reflexão tranquila sobre o problema a examinar. Por isso, é preciso avaliar com atenção, vez por vez, se é o caso de se pôr diante das câmaras de televisão e dos microfones.

6. A vossa missão de Pastores, venerados Irmãos, é exercida numa sociedade sempre mais laica, na qual os valores religiosos não têm grande importância. Muitos vivem como se Deus não existisse. À secularização económica do século XIX seguiram-se, no século que está a terminar, as ondas da secularização intelectual, cujo fim não se entrevê. No vosso País este processo acelerou-se também como consequência da unificação. Essa diagnose encontra hoje muitas confirmações: a Alemanha reunificada não se tornou maiormente protestante - como no início se pensava - mas simplesmente menos cristã. Parece que o consenso fundamental sobre os valores cristãos como base da sociedade está a fragmentar-se. A Igreja deve interrogar-se sobre o próprio papel numa sociedade em que a referência a Deus é sempre menos frequente, porque em muitos âmbitos já não há lugar para Ele.

Este desafio refere-se de modo especial a vós, caros Irmãos. Conheço o significativo papel histórico e cultural que a Igreja desempenhou e continua a desempenhar na Alemanha: ele é expresso também numa particular forma jurídica e ultimamente nos acordos entre a Santa Sé e os novos Departamentos federais. Por um lado, aprecio muito esta grande herança que deve ser salvaguardada; por outro, posso bem compreender o vosso sofrimento pelas inúmeras defecções de fiéis e pela consequente menor influência da Igreja na vida da sociedade civil. Sei também que vos perguntais se os direitos e deveres que competem à Igreja no vosso País poderão efectivamente ser mantidos. Faz-se sentir esta tensão também a nível paroquial onde os sacerdotes, os diáconos e os colaboradores pastorais são às vezes constrangidos a fazer "acrobacias": por um lado, eles devem prover a um amplo "serviço pastoral" em favor de uma maioria em parte indiferente; por outro, devem dedicar oportunas solicitudes pastorais à "Igreja dos chamados ou decididos", isto é, àqueles que desejam de maneira efectiva pôr-se no seguimento de Jesus.

Isto não é um nó górdio que pode ser simplesmente cortado. Ele deve, antes, ser desatado com paciência, mediante a oração assídua, a reflexão sincera e a programação de pequenos passos corajosos que tornam crível na vossa pátria o testemunho dado pela Igreja ao esplendor da verdade. Para enfrentar o desafio da sociedade laica, a alternativa verdadeira não é refugiar-se no "pequeno rebanho" (Lc 12,32). É preciso antes tornar-se disponível ao diálogo, isto é, ao confronto crítico e racional, detendo as tensões que no momento não podem ser resolvidas. Solução evangélica não é retirar-se da sociedade! Ao contrário, deve-se tomar a palavra em toda a ocasião, oportuna e inoportuna (cf. 1Tm 4,2)! Fazei-vos envolver lá onde pensais que se deve defender Deus e o homem! Não estais sozinhos no mundo, mas não vos afasteis do mundo (cf. Jo Jn 15,19)! Uma sociedade laica em que se faz sempre mais silêncio sobre Deus, tem necessidade da vossa voz.

7. Os actuais condicionamentos da Igreja na Alemanha não devem ser identificados simplesmente com um contexto agnóstico de indiferença religiosa. Embora posto de lado ou calado, Deus está presente; e o seu desejo está sempre vivo nos corações de muitos. Com efeito, o homem não se contenta apenas de quanto é humano, mas procura uma verdade que o transcende, porque percebe, embora de maneira confusa, que nela está o sentido da própria vida. Santa Teresa Benedita da Cruz, que no ano passado pude incluir entre os Santos e que, por ocasião da recente Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos, proclamei co-Padroeira da Europa, entregou esta intuição numa fórmula de singular eficácia: "Aquele que procura a verdade, está em busca de Deus, mesmo sem o saber". A resposta à questão de Deus é a grande ocasião favorável da Igreja. Estejam, pois, abertas as portas da Igreja a todos aqueles que sinceramente estão em busca de Deus! Aquele que pede à Igreja a verdade, tem direito de esperar que dela lhe seja exposta, de maneira autêntica e integral, a Palavra de Deus escrita ou transmitida (cf. Dei Verbum DV 10). Deste modo, a busca da verdade é protegida dos perigos de uma religiosidade indeterminada, irracional e sincretista, e a Igreja do Deus vivo revela-se como "coluna e fundamento da verdade" (1Tm 3,15).

À verdade da fé deve corresponder a coerência da vida. Com as suas múltiplas actividades, a Igreja está sem dúvida presente em tantos e vários âmbitos da sociedade civil do vosso País. Esse empenho é apreciado também por círculos estranhos à Igreja. Mas para que este trabalho não ofusque a verdadeira e autêntica missão eclesial, peço-vos que examineis e, se for necessário, fortaleçais o perfil das instituições que agem em nome da Igreja. O amor puramente horizontal que se tem para com o próximo é chamado sempre de novo a cruzar-se com o amor vertical, que sobe até Deus. De facto, a cruz não é apenas um símbolo que nós, Bispos, trazemos no peito; ela é, antes de tudo, o sinal característico, o grande "mais" do nosso perfil cristão. Portanto, nas casas das Instituições católicas a cruz deve ser mais do que uma decoração ou um objecto de adorno: ela é a "marca" típica do incansável zelo dos inúmeros colaboradores e colaboradoras eclesiais nos sectores social, educativo e cultural. Sob o braço da cruz floresce a "cultura da vida", na qual são acolhidas de modo particular as pessoas que normalmente estão marginalizadas, em especial os nascituros e os moribundos. É preciso, pois, promover de todos os modos a formação espiritual e moral do pessoal nas Instituições eclesiásticas ou dependentes da Igreja! A verdadeira solidariedade entre os homens exige que se possa contar com um sólido fundamento em Deus, que precisamente por meio do seu Filho, enviado à terra, manifestou ser um apaixonado "que ama a vida" (Sg 11,26).

8. Caros Irmãos! Não quereria terminar esta reflexão sem vos fazer uma confidência. Durante o meu Pontificado foi-me dado, até agora, visitar três vezes a vossa amada pátria. Entre tantas recordações comovedoras, permaneceu-me na memória, com particular intensidade, um hino à Igreja, que os fiéis cantavam com fervor: "Uma casa gloriosa estende-se no nosso País...". Este hino exprime a alegria e o afecto pela Igreja e também o orgulho de a ela pertencer, que ainda hoje distingue plêiades de fiéis na Alemanha. Tenho diante dos olhos os sacerdotes, os diáconos e os religiosos, que sustentam a Igreja com o testemunho do seu serviço e da vida consagrada. Penso em tantos homens e mulheres que vivem a própria vocação de fiéis leigos, colaborando com missão oficial ou como voluntários no cuidado das almas ou nos conselhos administrativos e paroquiais. Não por último quereria recordar as associações eclesiais, entre as quais algumas muito antigas, que são semelhantes a árvores majestosas, e os novos movimentos espirituais, que em parte são ainda pequenas plantas delicadas. De modo especial quereria recordar os fiéis que oram em silêncio, dando respiro à acção da Igreja. Levai a todos as minhas mais caras saudações! De modo especial levai aos jovens o convite para o Dia Mundial da Juventude no ano 2000: o Papa espera-os!

9. A minha esperança para vós e para todos os católicos da vossa pátria é aquela que o Apóstolo Pedro formulou: "Como pedras vivas, entrai na construção dum edifício espiritual, por meio dum sacerdócio santo, cujo fim é oferecer sacrifícios espirituais a Deus, que vos chamou das trevas para a sua Luz admirável" (1P 2,5-9). Pela intercessão de Maria, que como "domus aurea" é modelo da Igreja, faço votos por que a Igreja na Alemanha seja e se torne sempre mais, também no novo milénio, "uma casa gloriosa que se estende no nosso País", como cantais no vosso bonito hino.

Com estes sentimentos e estas esperanças concedo de coração a Bênção Apostólica a vós e a todos aqueles que estão confiados ao vosso cuidado pastoral.




Discursos João Paulo II 1999 - Tbilisi, 9 de Novembro de 1999