
Homilias JOÃO PAULO II 123
123 Dilectíssimos Irmãos e Irmãs!
1. Sejam breves, hoje, as minhas palavras. Deixemos que nos fale a própria festa, a própria Eucaristia na plenitude da sua expressão litúrgica.
Estamos para celebrar, junto da Basílica de São João de Latrão, da cátedra do Bispo de Roma, o Santíssimo Sacrifício, para, depois, irmos em procissão até à Basílica de Santa Maria Maior, no Esquilino.
Deste modo desejamos reunir, num só acto litúrgico, o culto da adoração, como de nós exigem a solenidade de hoje e a tradição secular da Igreja.
2. Desejamos anunciar à Urbe e ao Orbe a Eucaristia, isto é, a Gratidão. Este Sacramento é o sinal da gratidão da criação inteira nela visita do Criador. Este Sacramento é o sinal da gratidão do homem porque o Cristo se tornou criatura; porque Deus se tornou Homem, porque «tomou o corpo humano da Virgem Mãe Imaculada», a fim de nos elevar de novo, a nós homens, para o Pai; de fazer de nós os Filhos de Deus.
Desejamos, sim, anunciar e cantar com a boca, e mais ainda confessar com o nosso coração humano, a Gratidão pelo Sacramento do Corpo e do Sangue de Deus, com o qual Ele alimenta as nossas almas e renova os nossos corações humanos.
3. Desejamos, ainda, anunciar à Urbe e ao Orbe a Eucaristia como o sinal da Aliança que Deus estabeleceu irreversivelmente com o homem, mediante o Corpo e o Sangue do Seu Filho.
Este Corpo foi submetido à paixão e à morte. Compartilhou a sorte terrestre do homem depois do pecado original. Este Sangue foi derramado para sigilar a Nova Aliança de Deus com o homem: a aliança de graça e de amor, a aliança de santidade e de verdade. Nós somos participantes desta Aliança ainda mais que o Povo de Deus da Antiga Lei. Hoje desejamos, por conseguinte, dar testemunho perante todos os homens.
Mas foi por todos os homens que Deus Se fez homem. Por todos morreu Cristo e ressuscitou. Todos, enfim, foram chamados para o Banquete da eternidade. E aqui, na terra, o Deus Senhor convida a todos e cada um, dizendo: «Tomai e comei ... Tomai e bebei! ... para não vos deterdes pelo caminho!».
4. Por fim, desejamos anunciar à Urbe e ao Orbe a Eucaristia como Sinal da adoração devida só a Deus. Como é admirável o nosso Deus! Aquele que nenhuma inteligência é capaz de abranger e adorar na medida da Sua Santidade. Aquele que nenhum coração tem capacidade de amar na medida do Seu amor.
Como é maravilhoso quando quer que o abracemos, o amemos e adoremos, segundo a dimensão humana da nossa fé, sob as espécies do Pão e do Vinho!
124 5. Aceita, Cristo Eucarístico, esta expressão da adoração e do amor, que a Igreja Te dirige mediante o ministério do Bispo de Roma, sucessor de Pedro. Sê adorado pela memória de todos os meus Predecessores, que Te adoraram perante os olhos da Urbe e do Orbe.
Ao fim da liturgia de hoje, receba-Te, das nossas mãos, no adro do seu templo, a Tua Mãe Santíssima, que a Ti, Eterno Filho do Pai, deu o corpo humano:
«Ave, verum corpus, / natum ex Maria Virgine. / Vere passum immolatum / in cruce pro homine; / esto nobis praegustatum / mortis in examine!
Salve, verdadeiro Corpo, / nascido da Virgem Maria, / que sofreste e foste imolado verdadeiramente / na Cruz, pela humanidade; / sê por nós saboreado / quando chegar a prova da morte! / /
Ámen.
Quarta-feira, 10 de Junho de 1979
Queridos Irmãos
1. Expresso cordial e sincera alegria pelo nosso encontro. É alegria, sobretudo porque o encontro se realiza no enquadramento do Simpósio sobre o tema: «Os jovens e a fé».
Recordo-me do Simpósio precedente, de 1975, em que tive a felicidade de participar activamente como um dos relatores. Ao mesmo tempo, desejo exprimir a minha alegria por me encontrar hoje convosco, concelebrando a Sagrada Eucaristia. Espero que nesta comunhão, em que se exprime do modo mais pleno e profundo a nossa unidade sacerdotal e episcopal, recebamos maior luz e força do Espírito Santo, vinda de Cristo-Príncipe dos Pastores, que, como único e Eterno Sacerdote, é também única fonte e fundamento desta unidade, que manifestamos e vivemos na concelebração eucarística.
De tal luz e força do Espírito de Cristo temos grande necessidade para todos os encargos que derivam da nossa missão — por exemplo, no âmbito do tema do vosso Simpósio: A juventude. Mas não exclusivamente. O conjunto daqueles encargos e toda a nossa missão exigem certa graça particular para sabermos ir ao encontro, com exacta e plena correspondência, dos sinais dos tempos, que formam o salvífico «kairos» dos europeus e do continente que representamos e ao qual «somos enviados» como sucessores daqueles mensageiros do Evangelho, de quem toma início a história da Europa depois de Cristo.
2. O vosso encontro — e portanto também a nossa concelebração eucarística de hoje — firmam as raízes naquele fausto pensamento do Vaticano II que recorda aos Bispos de toda a Igreja o carácter colegial do ministério por eles exercido. Exactamente de tal pensamento, expresso com a maior precisão doutrinal na Constituição dogmática «Lumen Gentium», tira origem uma série de instituições e iniciativas pastorais, que já hoje testemunham a nova vitalidade da Igreja e certamente no futuro constituirão o fundamento doutro renovamento da sua missão salvífica, na verdade das dimensões e das esferas de acção.
125 Ao dizê-lo, tenho ainda diante dos olhos a maravilhosa assembleia dos Bispos da América Latina, que tive a felicidade de inaugurar a 28 de Janeiro do corrente ano em Puebla, no México. Tal assembleia era fruto duma sistemática colaboração de todas as Conferências Episcopais daquele imenso continente, em que actualmente habita quase metade dos católicos de todo o globo. São Episcopados de vária importância numérica, alguns muito numerosos, como sobretudo o do Brasil que sozinho conta mais de 500 Bispos. A metódica colaboração de todas as Conferências Episcopais da América Latina tem o seu apoio no Conselho comummente conhecido pelo nome de CELAM, que permite às ditas Conferências relerem juntas os encargos que se apresentam aos Pastores da Igreja naquele grande continente, tão importante para o futuro do mundo.
Já só o título da Conferência realizada em Puebla de 27 de Janeiro a 1 de Fevereiro de 1979 o atesta de modo muito claro. O título era: A evangelização no presente e no futuro da América Latina. Já só do título é fácil concluir quanto aproveitou a Puebla o providencial tema da sessão ordinária do Sínodo dos Bispos de 1974: a evangelização.
3. Em relação com esse tema fundamental, cada Bispo do mundo, como pastor da sua Igreja particular, da sua Diocese, podia e devia considerar a sua Igreja do ponto de vista da sua contemporaneidade. E como a evangelização exprime a missão da Igreja, tal olhar deve ligar-se ao passado e abrir à perspectiva do futuro: ontem, hoje e amanhã. E não só cada Bispo na sua Diocese, mas também as diversas comunidades dos Bispos e sobretudo as Conferências Episcopais Nacionais podem e devem tornar aquele «tema-chave» do Sínodo de 1974, objecto de reflexão acerca da sociedade, perante a qual têm pastoral responsabilidade na obra de evangelização. O tema proposto por Paulo VI para o Sínodo, há cinco anos, possui múltiplas possibilidades de aplicação em vários âmbitos.
Ao mesmo tempo, este tema leva a reflectir, de modo fundamental, tratando-se de aplicar o próprio Concílio e de pôr em vigor a sua doutrina. A basilar realização do Vaticano II não é senão o novo sentido de responsabilidade pelo Evangelho, pela Palavra, pelo Sacramento e pela obra da salvação, de que todo o Povo de Deus se deve encarregar do modo que a ele se adapta.
É encargo dos Bispos dirigir este grande processo. Nisto está a dignidade e a responsabilidade pastoral deles.
4. É de grande peso e fundamental importância reflectir sobre o problema da evangelização quanto ao continente europeu. Considero-o tema complexo, extremamente complexo. Como aliás para qualquer outro contexto, é necessário fazer resultar da análise da situação presente a visão do futuro, enquanto tal situação é consequência do passado, tão antigo como a mesma Igreja e todo o cristianismo. Na análise deveríamos atingir cada país, cada nação do nosso continente, mas também compreender cada uma das situações, tendo diante dos olhos as grandes correntes da história que — especialmente no segundo milénio — dividiram a Igreja e o cristianismo no continente europeu.
Penso que actualmente, em tempo de ecumenismo, é a hora de encarar estas questões à luz dos critérios elaborados pelo Concílio: encará-las em espírito de colaboração fraterna com os representantes das Igrejas e comunidades com que não temos unidade perfeita; e, ao mesmo tempo, é necessário encará-las em espírito de responsabilidade quanto ao Evangelho. Isto não só no nosso continente, mas também fora. A Europa é ainda o berço do pensamento criador, das iniciativas pastorais e das estruturas organizativas, cujo influxo ultrapassa as suas fronteiras. Ao mesmo tempo a Europa, com o seu grandioso passado missionário; pergunta-se a si mesma nos vários pontos da sua «geografia eclesial» e pergunta se não está para tornar-se um continente missionário.
Existe pois para a Europa o problema que na «Evangelii nuntiandi» foi definido como «auto-evangelização». A Igreja deve sempre evangelizar-se a si mesma. A Europa católica e cristã precisa de tal evangelização. Deve evangelizar-se a si mesma. Talvez em nenhum outro lugar como no nosso continente se delineiem com tanta limpidez as correntes da negação da religião, as correntes da «morte de Deus», da secularização programada e do organizado ateísmo militante. O Sínodo de 1974 forneceu-nos não pouco material a este propósito.
É possível examinar tudo isto segundo critérios histórico-sociais. O Concílio indicou-nos porém outro critério: o critério dos «sinais dos tempos», isto é, dum especial desafio da Providência, d'Aquele que é o dono da messe (Lc 10,2).
No ano que vem, celebraremos os 1500 anos do nascimento de São Bento, que Paulo VI proclamou Padroeiro da Europa. Talvez pudesse ser este o momento idóneo para tal reflexão aprofundada sobre o problema do «ontem e do hoje» da evangelização do nosso continente ou antes para a reflexão sobre este desafio da Providência, que — no seu complexo histórico, rico e variado — constitui o «hoje» cristão da Europa quanto à sua responsabilidade pelo Evangelho; e também na perspectiva do futuro.
A nossa missão está sempre em toda a parte virada para o futuro. Tanto para o futuro, de que estamos certos na fé: o futuro escatológico; como para o futuro, de que podemos estar humanamente incertos. Pensamos naqueles que foram os primeiros a vir ao continente europeu como anunciadores da Boa Nova, como Pedro e Paulo. Pensamos naqueles que, através da história da Europa, aplanaram os caminhos para novos povos, como Agostinho ou Bonifácio ou os irmãos de Tessalónica: Cirilo e Metódio. Também eles não estavam certos do futuro humano da sua missão e mesmo da própria sorte. Mais poderosa contudo que esta humana incerteza foi a fé e a esperança. Mais poderoso foi o amor de Cristo que os «constrangia» (Cfr. 2Co 5,14). Em tal fé, esperança e caridade, manifestou-se o Espírito activo. É necessário que também nós nos tomemos instrumentos dóceis e eficazes da sua acção na nossa época.
126 6. O tema do vosso Simpósio é: «Os jovens e a fé».
Bom é que o seja. Julgo que ele está orgânica e profundamente inscrito no grande tema de reflexão de toda a Igreja pós-conciliar, que não poderá afastar-se muito tempo da nossa atenção, o tema da evangelização. Se pensamos na evangelização em função do futuro, é necessário virarmos os nossos espíritos para os jovens: devemos encontrar-nos com as inteligências, os corações e os caracteres dos jovens. Este é o problema escolhido, por meio do qual chegamos ao problema global.
A troca das vossas experiências e sugestões deve ser ampla, não pode ficar sendo só «particular». Todo o exercício de colegialidade serve a causa da universalidade da Igreja. Também vós, caros Irmãos, por meio deste exercício da colaboração colegial que forma o vosso Simpósio, deveis, por assim dizer, «ampliar os espaços do amor» (SANTO AGOSTINHO de Ep. Joan ad Parthos, X, 5; PL XXXV, 2060). Tal ampliação não afasta nunca da responsabilidade confiada directamente a cada um de nós, torna-a até mais aguda. É necessário que os Bispos e as Conferências Episcopais, de cada país e nação da Europa, vivam os interesses de todos os países e nações do nosso continente. E aqueles que entre vós estão ausentes, estejam — diria — presentes ainda com maior intensidade. É necessário elaborar métodos especiais, eficazes, para «tornar intensamente presentes» aqueles que estão «ausentes». A sua ausência não pode ser passada em silêncio ou ser justificada com lugares comuns.
Recordai-vos que, do mesmo modo que tomam parte neste Simpósio, por meio dos seus representantes, todas as Conferências Episcopais da Europa, assim também à roda deste altar estão — na eucaristia comunhão de amor, sacrifício e oração — todos os Episcopados, todos os Bispos. E em certo modo estão mais presentes aqueles que faltam, aqueles que não puderam estar aqui presentes.
Por meio de todos, a Igreja, como Povo de Deus de todo o nosso continente, «elabora» — na união com Cristo-Príncipe dos Pastores, com Cristo-Eterno Sacerdote —o seu futuro cristão.
Amen.
24 de Junho de 1979
1. Et tu puer propheta Altissimi vocaberis.
E tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo (Lc 1,76).
Estas palavras falam-nos do Santo de hoje. Com elas, o sacerdote Zacarias, saudou o próprio filho, depois de ter recuperado a possibilidade de falar. Com elas, saudou o próprio filho, ao qual por sua vontade e com surpresa de todos, a família deu o nome de João. Hoje, a Igreja recorda-nos estes acontecimentos, ao celebrar a solenidade do nascimento de São João Baptista.
Poder-se-ia denominar antes o dia da chamada de João, filho de Zacarias e de Isabel de Ain-karim, para ser o último profeta da Antiga Aliança, para ser o mensageiro e o imediato predecessor do Messias: Jesus Cristo.
127 Eis aquele que vem ao mundo em circunstâncias extraordinárias, e já traz consigo o Divino chamamento. Tal chamamento provém do desígnio do próprio Deus, do Seu amor salvífico, e está inscrito na história do homem, desde o primeiro instante da concepção no seio materno. Todas as circunstâncias desta, como depois as circunstância do nascimento de João, indicam um chamamento insólito: Irás adiante do Senhor a preparar os Seus caminhos (Id., ibid).
Sabemos que, a este chamamento, João Baptista respondeu com toda a vida. Sabemos que lhe permaneceu fiel até ao último suspiro. E este foi dado no cárcere por ordem de Herodes, como consequência do capricho de Salomé, que agia instigada pela vingança da Mãe Herodíades.
Tudo isto, porém, a liturgia de hoje não o menciona, reservando-o para outro dia. Hoje, manda-nos alegrar com o extraordinário nascimento do Precursor. Manda-nos dar graças a Deus pelo chamamento de João Baptista.
2. Quando, neste dia, meus caros Diáconos e candidatos ao Presbiterado, vos apresentais na Basílica de São Pedro em Roma, desejamos também, nós todos, alegrar-nos pelo vosso chamamento a uma ulterior participação no sacerdócio de Cristo.
No coração de cada um de Vós está inscrito o mistério de tal chamamento. Podemos repetir com o Profeta: Amo-te com amor eterno, e por isso te outorguei os meus favores (Jr 31,3).
Num determinado momento da vida, destes conta deste Divino chamamento. E começastes a preparar-vos, começastes a caminhar para a sua realização. O caminho para o sacramento da Ordem, que hoje recebeis das minhas mãos, passa através de uma série de etapas e ambientes, de que fazem parte a casa de família, os anos da escola elementar e preparatória, como também os estudos superiores, o ambiente dos amigos, a vida paroquial. Antes de mais, porém, encontra-se neste caminho o Seminário eclesiástico, ao qual todos nos dirigimos a fim de encontrar uma resposta definitiva à pergunta respeitante ao chamamento para o sacerdócio. Cada um de nós ali vai, no intuito de que, ouvindo tal resposta, cada vez mais claramente se possa preparar, ao mesmo tempo de maneira sistemática e profunda, para o sacramento da Ordem.
Hoje, tendes já sobre os ombros todas estas experiências. Já não perguntais como o jovem do Evangelho: Bom Mestre, que devo fazer? (Mc 10,17). O Mestre ajudou-vos a encontrar a resposta. Apresentais-vos a encontrar a resposta. Apresentais-vos para que a Igreja possa imprimir, nesta resposta, o seu selo sacramental.
3. Este selo imprime-se mediante toda a liturgia do Sacramento da Ordem. Imprime-o o Bispo, que age com a força do Espírito Santo e em comunhão com o seu presbitério.
A força do Espírito Santo vem indicada e transmitida pela imposição das mãos, seguida primeiro do silêncio e depois da oração. Como sinal da transferência desta força para as vossas mãos jovens, estas serão ungidas com o Santo Crisma, de modo a tornarem-se dignas de celebrar a Eucaristia. As mãos humanas não podem celebrar de outro modo senão na força do Espírito Santo.
Celebrar a Eucaristia quer dizer reunir o Povo de Deus e construir a Igreja na sua mais plena identidade.
O momento que vivemos, aqui juntos, é de grande importância, tanto para cada um de Vós, como para a Igreja inteira.
128 A Igreja orou por cada um destes chamados, que hoje recebem o selo sacramental do Presbiterado. A Igreja deseja que cada um de Vós a construa com o próprio sacerdócio, o próprio serviço, o qual — pela força recebida de Cristo — «amontoa e não desperdiça» (Cfr. Mt 12,30).
4. A Igreja ainda hoje reza. Rezam os vossos pais, as famílias, os ambientes com que até agora se relacionou a vossa vida, os vossos Seminários, as vossas Dioceses, as vossas Congregações Religiosas.
Oremos ao Senhor da messe, que chamou cada um de vós como operário para a sua messe, para que nela persevereis até ao fim.
Tal como João filho de Zacarias e de Isabel, cujo pai disse no dia do nascimento: E tu menino serás chamado Profeta do Altíssimo (Lc 1,76).
Que a vossa perseverança seja o fruto das orações que hoje elevamos ao Senhor! Perseverai como profetas do Altíssimo! Perseverai como sacerdotes de Jesus Cristo!
Produzi frutos abundantes!
Ámen.
Amadíssimos Filhos Legionários de Cristo:
No dia em que a Liturgia comemora a festa de uma grande figura da Igreja, Santo Ireneu, reunimo-nos diante desta gruta de Lourdes, junto do altar do Senhor, para lhe oferecer com a Eucaristia o tributo da nossa acção de graças, do nosso louvor suplicante e da nossa fidelidade renovada.
Conhecendo a proveniência da grande maioria de vós, o Papa não pode deixar de recordar e reviver tantos momentos inesquecíveis passados na vossa pátria de origem, o México; o vosso entusiasmo renova-me o eco daquelas multidões afectuosamente próximas e aplaudindo.
Ao contemplar diante de mim tão numerosos membros da vossa família religiosa, acompanhados pelo seu Fundador, vêm-me à mente as palavras do Génesis que acabamos de ouvir na primeira leitura desta Missa. Elas falam-nos da divina presença que multiplica a descendência com o favor da sua bênção. Foi também a bênção do Senhor que fez germinar fecundamente aquela fundação do não muito longínquo ano de 1941, e que tendo obtido o decreto de aprovação há apenas 14 anos, tem hoje mais de 130 sacerdotes e quase 700 membros; distribuídos em diversas casas e nações, trabalham já, ou preparam-se para difundir o reino de Cristo na sociedade, através de várias formas de apostolado específico.
129 Vós sois, amados filhos, uma jovem família religiosa, que procura um crescente dinamismo, para oferecer à Igreja um novo contributo de energias vivas no momento actual. Precisamente porque conheço estes vossos ideais, a minha voz quer convidar-vos, com as expressões evangélicas que acabamos de escutar, a imitar o homem prudente que edificou a sua casa sobre a rocha.
Para vós que tendes como traço característico a espiritualidade cristocêntrica, construir sobre a rocha o vosso edifício individual e comunitário, quererá dizer, esforçar-vos por crescer sempre no sublime conhecimento de Cristo, olhando-O para moldar a vossa vida na sua mensagem, bem radicados na fé e na caridade, a fim de serdes capazes de cuidar a todo o momento os interesses de Cristo. Deste modo podereis adquirir essa solidez interior que desafia a chuva, os rios e os ventos (Cfr. Mt 7,25) para construir o reino de Deus na sociedade actual, na juventude — com a qual frequentemente trabalhais — tão necessitadas de certezas vividas, de certezas derivadas de uma fé e confiança inalteráveis em Cristo. O Cristo Deus, morto e ressuscitado, feito princípio de nova vida para nós, que está sempre ao nosso lado como garantia de vitória perante as adversidades.
Parte importante dessa solidez na vossa vida será em si mesma a plena fidelidade à Igreja e ao Concílio Vaticano II, sem desvios de qualquer espécie, e em perfeita coerência com o que o Senhor pede e o Magistério propõe no momento actual.
Nesse caminho, ser-vos-á de grande ajuda a intensificada fidelidade a esses grandes amores que devem ser um distintivo, de acordo com a vossa própria vocação, de todo o legionário: amor a Cristo no crucifixo e amor à Virgem. Se fordes fiéis a este belo programa, não deveis temer: o vosso edifício espiritual assenta sobre alicerces firmes.
Para que vos mantenhais fiéis a esses ideais quero recordar-vos que deveis recorrer frequentemente à oração. É o único modo de renovar-se interiormente, de adquirir nova luz que oriente os próprios passos, de apoiar a fraqueza pessoal na força e solidez do poder divino. Numa palavra: é o único modo para manter uma perene juventude de espírito, na disponibilidade a Deus e aos outros.
Só assim podereis viver em plenitude a alegria transbordante da vossa vocação de eleitos para o serviço de Cristo e da Igreja. Uma alegria que é testemunho da presença do Senhor e que encoraja a entrega generosa ao irmão. É este o desejo que vos deixo, dizendo-o com palavras da liturgia de hoje: "Senhor, recorda-te de mim quando mostras a tua bondade para com o teu povo; visita-me quando operas a tua salvação, para que eu veja a felicidade dos teus escolhidos, me enebrie com o gozo do teu Povo e me alegre com a tua herança".
Uma palavra final. Sei que entre vós estão os jovens que durante a minha permanência no México prestaram a sua generosa e entusiasta colaboração à Delegação Apostólica. Vai para eles o testemunho do meu profundo apreço e gratidão. São os mesmos sentimentos que torno extensivos também, em presença das suas Irmãs de Congregação residentes em Roma, às Religiosas Clarissas do Santíssimo Sacramento, que tanto fizeram na Cidade do México durante a minha estadia na mesma Representação Pontifícia.
E agora, levemos ao altar do Senhor todas estas intenções.
29 de Junho de 1979
1. A liturgia de hoje conduz-nos, como todos os anos, à região de Cesareia de Filipe, onde Simão, filho de Jonas, ouviu da boca de Jesus estas palavras: És feliz, ... porque não foram a carne nem o sangue quem to revelou, mas o Meu Pai que está nos céus (Mt 16,17).
Simão ouviu estas palavras da boca de Cristo quando à pergunta: quem dizem os homens que é o Filho do homem? (Mt 16,13), só ele deu aquela resposta: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo (Mt 16,16).
130 Esta resposta encontra-se no centro da história de Simão, a quem Cristo começou a chamar Pedro.
O lugar onde ela foi pronunciada, é um lugar histórico. Quando o Papa Paulo VI, como peregrino, visitou a Terra Santa, dedicou uma atenção particular àquele lugar. Cada sucessor de Pedro deve voltar àquele lugar com o pensamento e o coração. Ali foi reconfirmada a fé de Pedro: não foram a carne nem o sangue quem to revelou, mas o Meu Pai que está nos céus (Mt 16,17).
Cristo escuta a confissão de Pedro, pronunciada pouco antes.
Cristo vê na alma do Apóstolo, que confessa. Abençoa a obra do Pai nesta alma. A obra do Pai atinge o intelecto, a vontade e o coração, independentemente da «carne» e do «sangue»; independentemente da natureza e dos sentidos. A obra do Pai, mediante o Espírito Santo, atinge a alma do simples homem, do pescador da Galileia. A luz interior proveniente desta obra encontra expressão nas palavras: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo (Mt 16,16).
As palavras são simples. Mas nelas exprime-se a verdade sobre-humana, divina, exprime-se com o auxílio de palavras simples. Tais foram as palavras de Maria no momento da anunciação. Tais foram as palavras de João Baptista no Jordão. Tais são as palavras de Simão nas proximidades de Cesareia de Filipe: Simão a quem Cristo chamou Pedro.
Cristo vê na alma de Simão. Parece que admira a obra nela realizada pelo Pai, mediante o Espírito Santo: eis que, confessando a verdade revelada sobre a filiação divina do Seu Mestre, Simão torna-se participante do divino Conhecimento, daquela imperscrutável Ciência que o Pai tem do Filho, tal como o Filho a tem do Pai.
E Cristo diz: És feliz, Simão, filho de Jonas (Mt 16,17).
2. Estas palavras encontram-se no centro mesmo da história de Simão Pedro.
Esta bênção nunca foi retirada. Tal como nunca foi ofuscada, na alma de Pedro, aquela confissão que então fez, nas proximidades de Cesareia de Filipe.
Com ela viveu toda a sua vida até ao último dia. Com ela viveu aquela terrível noite da captura de Cristo no jardim do Getsémani; a noite da própria fraqueza, da maior fraqueza, que se manifestou na renegação do homem ... mas que não destruiu a fé no Filho de Deus. A prova da cruz foi recompensada pelo testemunho da Ressurreição. Levou à confissão, feita na região de Cesareia de Filipe, um argumento definitivo.
Pedro ia agora, com esta sua fé no Filho de Deus, rumo à missão, que o Senhor lhe havia confiado.
131 Quando, por ordem de Herodes, se encontrou na prisão de Jerusalém, acorrentado e condenado à morte, parecia que tal missão teria durado pouco.
Pedro pelo contrário foi libertado pela mesma força com a qual tinha sido chamado. Estava-lhe destinado um caminho ainda longo.
O final deste caminho, encontrou-se, como indica uma tradição, aliás confirmada por muitas investigações rigorosas, apenas a 29 de Junho do ano 68 desta era, que convencionalmente se conta a partir do nascimento de Cristo.
No fim deste caminho, o Apóstolo Pedro, outrora Simão filho de Jonas, encontrou-se aqui em Roma, aqui, neste lugar, sobre o qual estamos agora, por baixo do altar onde é celebrada a Eucaristia.
«A carne e o sangue» foram destruídos até ao fim; foram submetidos à morte. Mas aquilo que antes lhe havia revelado o Pai (Cfr. Mt 16,17), sobreviveu à morte da carne; tornou-se o início do eterno encontro com o Mestre a quem deu testemunho até ao fim. O início da bem-aventurada Visão do Filho no Pai.
E tornou-se também o fundamento inabalável da fé da Igreja. A sua pedra, a rocha.
És feliz, Simão, filho de Jonas (Mt 16,17).
3. Na liturgia de hoje, que une a comemoração da morte e glória dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, lemos as seguintes palavras da carta a Timóteo: Quanto a mim, estou pronto para o sacrifício; e o tempo da minha partida já se aproxima. Combati o bom combate, terminei a minha carreira e guardei a fé. Já nada me resta senão receber a coroa da justiça que o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia, e não só a mim, mas também àqueles que desejam a Sua vinda (2Tm 4,6-8).
Certamente, entre todos aqueles que amaram a manifestação do Senhor, Paulo de Tarso foi o amante singular, o intrépido combatente, a testemunha inflexível.
«O Senhor (...) assistiu-me»; recordamos bem como e onde isto aconteceu; recordamos o que aconteceu junto das portas de Damasco? O Senhor assistiu-me e deu-me forças, a fim de que a palavra fosse anunciada por mim e os gentios a ouvissem (2Tm 4,17).
Paulo, num grandioso esforço, delineia a obra de toda a sua vida. Fala disso daqui, de Roma, ao seu dilecto discípulo, quando se aproxima o fim da sua vida inteiramente dedicada ao Evangelho.
132 É penetrante — ainda nesta etapa — esta consciência do pecado e da graça; da graça que supera o pecado e abre o caminho da glória: O Senhor me livrará de todo o mal e me dará a salvação no Seu Reino celestial (2Tm 4,18).
A Igreja romana reevoca hoje na sua memória, de modo particular os dois últimos olhares na mesma direcção; na direcção de Cristo crucificado e ressuscitado. O olhar de Pedro agonizante na cruz e o de Paulo a sucumbir sob a espada.
Estes dois olhares de fé — daquela fé que lhes encheu a vida até ao fim e pôs os fundamentos da luz divina na história do homem sobre a terra — permanecem na nossa memória.
E neste dia reavivamos a nossa fé em Cristo com uma força particular.
Nesta perspectiva é-me grato saudar a delegação enviada pelo amado irmão, o Patriarca ecuménico Dimítrios I, para associar-se a esta celebração dos corifeus dos Apóstolos, São Pedro e São Paulo, testemunhando assim como as relações entre as nossas duas Igrejas se intensificam cada vez mais num esforço comum para a plena unidade.
1 de Julho de 1979
Caríssimos Irmãos e Irmãs!
1. Desejo hoje, juntamente conVosco, contemplar a Igreja plenamente «sujeita a Cristo» (Cfr. Ep 5,24). como Esposa fiel. Os últimos dias, que vivemos meditando juntos o sacrifício dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo, comprometem-nos a procurar a manifestação do mistério realizado na sua vocação, através do testemunho de fé e de amor, prestado até à morte. Manifestação que encontramos ao longo de toda a história da Igreja, ao longo dos séculos e das gerações dos seus filhos e filhas fiéis, dos servos e pastores, remontando assim àquele amor sublime, com que o nosso Redentor e Senhor amou a Igreja, e por ela Se entregou para a santificar, purificando-a no baptismo da água ... para a apresentar a Si mesmo como Igreja gloriosa sem mancha nem ruga, nem qualquer coisa semelhante, mas santa e imaculada (Ep 5,25-27).
Desejo hoje, juntamente conVosco, ir em peregrinação espiritual, àquele amor sublime, àquele Coração trespassado na Cruz e aberto para a Igreja, Sua Esposa, da qual nós próprios devemos voltar «purificados, reforçados e santificados» segundo a medida destes dias. Eis a Igreja! Fruto do imperscrutável amor de Deus no Coração de Seu Filho!
Eis a Igreja! Que traz os frutos. do amor dos santos Apóstolos, dos Mártires, dos Confessores e das Virgens! Do amor de gerações inteiras!
Eis a Igreja: nossa Mãe e Esposa ao mesmo tempo! Meta do nosso amor, do nosso testemunho e do nosso sacrifício. Meta do nosso serviço e do trabalho incansável. Igreja para a qual vivemos a fim de nos unirmos a Cristo num único amor. Igreja para a qual vós, Veneráveis e Queridos Irmãos, criados Cardeais no Consistório de ontem, deveis viver daqui por diante mais intensamente, unindo-vos a Cristo num único amor para com ela.
133 2. A Igreja está no mundo. Dela vós todos constituis o vivo testemunho no mundo, vindos de tantos lugares distantes no espaço, mas, ao mesmo tempo, espiritualmente próximos.
A Igreja está no mundo como sinal da vontade salvífica do próprio Deus.Não será ela o Corpo d'Aquele que o Pai consagrou com a unção e mandou ao mundo? Enviou-me a levar a boa nova aos humildes, a curar os de coração despedaçado, a anunciar a redenção aos cativos, e a liberdade aos prisioneiros ... a dar uma coroa em vez de cinzas ... a glória em vez do desespero (Is 61,1-3).
Não deverá a Igreja ser tudo isto? Não deverá viver de tudo isto, se deve responder à missão salvífica d'Aquele que é Seu Esposo e Chefe?
Vós sabeis muito bem, Veneráveis e Queridos Irmãos — e também todas as Igrejas de onde provindes o sabem —, em que linguagem de factos, experiências, aspirações, tristezas, sofrimentos, perseguições e esperanças, é necessário traduzir aquele antiquíssimo texto profético de Isaías, para exprimir, na linguagem do nosso tempo, como a Igreja está radicada no mundo; como deseja ser, no mundo, um sinal vivo da vontade salvífica do Pai Eterno em relação a cada homem e a toda a humanidade! A Igreja da nossa época difícil — do segundo milénio que se está aproximando do seu fim — época de extremas tensões e ameaças ou de grandes receios e de grandes expectativas!
3. Em todos os tempos esta Igreja é simples da mesma simplicidade que lhe inspirou o nosso Senhor e Mestre com as palavras do Evangelho. Quão pouco é preciso para que a Igreja «comece a existir» entre os homens! Onde estiverem reunidos, em Meu nome, dois ou três, Eu estou no meio deles (Mt 18,20); e se dois de entre vós se unirem, na terra, para pedirem qualquer coisa, obtê-la-ão de Meu Pai que está nos céus (Mt 18,19).
Quão pouco é necessário para que esta Igreja exista, se multiplique e se difunda! Disto decidem aqueles dois ou três reunidos no nome de Cristo e unidos por meio d'Ele, na oração, com o Pai. Quão pouco é necessário para que esta Igreja exista em toda a parte, até mesmo ali, onde segundo as «leis» humanas não pode existir e onde é condenada à morte! Quão pouco é necessário para que exista, e realize a sua mais profunda substância!
E para que viva a sua perene juventude! A mesma que viveram os primeiros cristãos, os quais eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão, e às orações ... Partiam o pão em suas casas e tomavam o alimento com alegria e simplicidade de coração, louvando a Deus e tendo a simpatia de todo o povo (Ac 2,42 Ac 2,46-47), como ouvimos hoje na segunda leitura dos Actos dos Apóstolos, leitura de que despertam não só as recordações, mas os desejos de simplicidade da Esposa, que acaba de experimentar o sacrifício de amor do Seu Esposo Crucificado e rejubila com a sua fecundidade geradora no Espírito Santo, quando — como lemos — O Senhor aumentava, todos os dias, o número dos que tinham entrado no caminho da salvação (Ac 2,48).
Esta Igreja é simples pela simplicidade que lhe é inata.
E é forte por aquela única força que recebeu do Senhor: a única! Por nenhuma outra! Tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra será desligado no Céu (Mt 18,18).
Eis a qualidade própria desta força da Igreja. Uma tal força não a conhece nem o homem nem a humanidade, em nenhuma outra dimensão da sua existência individual ou social. Ela não atinge esta força em nenhum campo da própria temporaneidade nem em nenhuma reserva da natureza ... Tal força vem só de Deus. Directamente de Deus: Tal força é resgatada com o sangue do seu Redentor e Esposo. É força do Espírito Santo.
E ela entra em aliança com o que no homem existe de mais profundo: mediante a fé, a esperança e a caridade procura — procura constantemente — no Céu, as soluções daquilo que não pode ser resolvido plenamente na terra.
134 4. Veneráveis e Queridos Irmãos! Como nos regozijamos pelo facto de que vós, Cardeais recém-criados, desposais hoje esta Igreja segundo o exemplo de Cristo! Sinal de tais esponsais, é o anel que daqui a pouco vos colocarei no dedo.
Como nos alegramos por estes vossos esponsais, que emitem na vida do Povo de Deus, em toda a terra, um novo afluxo de amor e uma nova certeza de amor! Nova — esperamos - eficácia de amor. Daquele amor com que fomos amados e com que devemos amar-nos reciprocamente. Amor que provém do Esposo e é para o Esposo.
Amor mediante o qual a Igreja deve ser amada por cada um de vós com renovado fervor.
Amor mediante o qual ela deve exprimir-se de novo em toda a simplicidade e força que recebeu do Senhor.
Amor mediante o qual a Igreja deve novamente tornar-se Esposa «sine ruga et macula» para o Esposo.
Este amor é o que vos desejo e a todo o Povo de Deus que está em Roma e no Mundo. Deponho os meus votos nas mãos da Mãe da Igreja, Esposa do Espírito Santo.
Ámen!
Homilias JOÃO PAULO II 123