Homilias JOÃO PAULO II 357


PEREGRINAÇÃO APOSTÓLICA DO SANTO PADRE À ÁFRICA



DURANTE A MISSA CELEBRADA


NO «UHURU PARK» EM NAIROBI


Nairobi, Quénia, 7 de Maio de 1980




Veneráveis Irmãos no Episcopado
Caros Irmãos e Irmãs em Cristo

1. Reunimo-nos aqui hoje para louvar e glorificar o nosso Pai celeste. Acorremos juntos a esta praça, homens e mulheres de muitas condições diferentes, e no entanto todos unidos n'Aquele em quem todas as coisas subsistem (cfr. Col Col 1,17), todos unidos à volta da mesa da palavra de Deus e do altar do Sacrifício.

O meu coração está repleto de gratidão a Deus por este dia e pela ocasião que tenho de celebrar a Eucaristia juntamente convosco, de cantar louvores ao Senhor por ter reconciliado consigo todas as coisas, "pacificando pelo sangue da sua cruz" (cfr. Col Col 1,20).

No dia em que Jesus foi crucificado, disse a Pilatos: "Nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade" (Jn 18,37). Jesus não veio para fazer a sua vontade, mas a do Pai celeste. Com as suas palavras, com as suas acções e com a sua própria existência ele deu testemunho da verdade. Em Jesus foi vencida a tirania do engano e da falsidade, a tirania da mentira e do erro, a tirania do pecado. Porque Cristo é a Palavra viva da verdade divina que prometeu: "Se vós permanecerdes na minha palavra, sereis verdadeiramente meus discípulos, e conhecereis a verdade, e a verdade vos tornará livres" (Jn 8,31-32).

2. A Igreja recebeu de Cristo a mesma missão: cultivar profundo amor e veneração pela verdade e associar com a fé as intuições do saber e da sabedoria humana; em todas as coisas dar testemunho da verdade. Em todos os tempos e em todos os países, a Igreja prossegue nesta missão, confiante no facto que se Deus é a fonte de toda a verdade, não pode haver oposição entre a sabedoria natural e as verdades da fé.

Todos os fiéis, caros irmãos e irmãs, têm um papel a desempenhar na missão da Igreja em defesa da verdade. Por isto na minha Encíclica declarei que "a responsabilidade da Igreja pela verdade divina deve ser cada vez mais, e de diversas maneiras, compartilhada por todos. E assim, o que é que diremos aqui dos especialistas das diversas disciplinas, dos representantes das ciências naturais e das letras, dos médicos, dos juristas, dos homens da arte e da técnica, e dos que se dedicam ao ensino nos vários graus e especializações? Todos eles — como membros do Povo de Deus — têm a sua parte própria na missão profética de Cristo, no seu serviço à verdade divina" (Redemptor hominis RH 19). Na comunhão dos fiéis e especialmente no âmbito da comunidade cristã local, deve dedicar-se particular atenção a esta responsabilidade de dar testemunho da verdade. Na sua mensagem à áfrica, o meu predecessor Paulo VI dirigiu uma palavra especial aos intelectuais deste continente, exactamente porque estava persuadido da importância da sua missão ao serviço da verdade. E esta palavra ressoa ainda hoje: "A África precisa de vós, do vosso estudo, da vossa pesquisa, da vossa arte e do vosso ensino... Sois o prisma através do qual as novas ideias e as mudanças culturais podem ser interpretadas e explicadas a todos. Sede sinceros, fiéis à verdade e leais" (n. 32).

3. Devemos iniciar o nosso testemunho da verdade, cultivando uma fome da palavra de Deus, um desejo de receber e de manter no coração a mensagem vivificante do Evangelho em toda a sua plenitude. Quando escutais atentamente a voz do Salvador, pondo-a então em prática, participais verdadeiramente na missão da Igreja ao serviço da verdade. Testemunhais diante do mundo que credes firmemente na promessa feita por Deus mediante Isaías: "E, assim como descem do céu a chuva e a neve, e já não voltam para lá, mas embebem a terra, e fecundam-na e fazem-na germinar, a fim de que dê semente ao que semeia, e pão ao que come; assim será a minha palavra, que sair da minha boca; não tornará para mim vazia, mas fará tudo o que eu quero, e produzirá os efeitos para os quais a enviei" (Is 55,10-11). Só podereis ser mensageiros da verdade se fordes antes de tudo ouvintes da Palavra de Deus.

358 4. Quando Pilatos perguntou a Jesus se Ele era rei, a Sua resposta foi clara e sem ambiguidade: "O meu reino não é deste mundo" (Jn 18,35). Cristo veio trazer a vida e a salvação para cada ser humano: a sua missão não era de ordem social, económica ou política. Da mesma forma, Cristo não conferiu à Igreja uma missão social, económica ou política, mas religiosa (cfr. Gaudium et Spes GS 42). Todavia, seria errado pensar que o cristão não se deve ocupar destes sectores da vida social. A este propósito, os Padres do Concílio Vaticano II foram muito explícitos: "Este divórcio entre a fé professada e a vida quotidiana de muitos deve ser enumerado entre os erros mais graves do nosso tempo... Ao negligenciar os seus deveres temporais, o cristão negligencia os seus deveres para com o próximo e o próprio Deus e coloca em perigo a sua salvação eterna" (Gaudium et Spes GS 43). Os cristãos, portanto, e principalmente vós, membros do laicado, são chamados por Deus para se comprometerem no mundo a fim de o transformar segundo o Evangelho. Ao desempenhardes esta missão, o vosso compromisso pessoal com a verdade e a honestidade ocupa um lugar importante, porque o sentido de responsabilidade para com a verdade constitui um dos pontos fundamentais do encontro entre a Igreja e a sociedade, entre a Igreja e cada homem ou mulher (cfr. Redemptor hominis RH 19). A fé cristã não vos fornece soluções já prontas para os problemas complexos da sociedade contemporânea. Mas fornece-vos um conhecimento profundo da natureza humana e das suas exigências, chamando-vos a dizer a verdade na caridade, a assumir as vossas responsabilidades como bons cristãos e a trabalhar, juntamente com o vosso próximo, para construir uma sociedade em que os valores humanos genuínos sejam nutridos e aprofundados mediante uma visão cristã compartilhada da vida.

Um destes sectores que ocupa um lugar muito importante na sociedade e na vocação global de cada pessoa humana é a cultura: "É próprio da pessoa humana não atingir a humanidade verdadeira e plena senão pela cultura, isto é, cultivando os bens e os valores da natureza. Em todo o lugar, portanto, quando se trata da vida humana, a natureza e a cultura entrelaçam-se de um modo muito íntimo" (Gaudium et Spes GS 53). O cristão colaborará de bom grado na promoção da verdadeira cultura, porque sabe que a Boa Nova de Cristo fortalece no homem os valores espirituais que estão no coração da cultura de cada povo e de cada período histórico. A Igreja, que não se sente estranha a cultura alguma, mas não se apropria exclusivamente de nenhuma delas, encoraja os seus filhos e filhas que trabalham nas escolas, nas universidades e noutras instituições de instrução, a darem-lhes o melhor das suas actividades. Harmonizando estes valores que constituem a herança única de cada povo ou grupo com o conteúdo do Evangelho, o cristão ajudará o seu povo a alcançar a verdadeira liberdade e a capacidade de enfrentar os desafios do seu tempo. Cada cristão, unido com Cristo no mistério do Baptismo, esforçar-se-á por conformar-se ao desígnio do Pai para o Seu Filho: "Restaurar em Cristo todas as coisas... as que há no céu, como as que há na terra" (Ep 1,10).

6. Outro desafio importante para o cristão é o da vida política. No âmbito do Estado, os cidadãos têm o direito e o dever de participar na vida política, pois uma nação só é capaz de assegurar o bem comum de todos, os sonhos e as aspirações dos seus diversos membros, se todos os cidadãos, com plena liberdade e com total responsabilidade, derem o seu contributo solicito e desinteressado para o bem de todos.

Os deveres dos bons cidadãos cristãos compreendem muito mais do que fugir da corrupção, muito mais do que não explorar os outros; positivamente, os seus deveres incluem o contributo para o estabelecimento de leis justas e de estruturas que fomentem os valores humanos. Se o cristão encontra a injustiça ou qualquer coisa que vai contra o amor, a paz e a unidade na sociedade, deve perguntar-se: "Onde foi que eu falhei o objectivo? O que é que fiz mal? Que deixei de fazer, no que me obrigava a verdade da minha vocação? Pequei por omissão?"..

7. Aqui, hoje, no Quénia, como já muitas vezes fiz, desejo dirigir uma mensagem especial aos esposos e às famílias. A família é a comunidade humana fundamental; a primeira célula vital de qualquer sociedade. Por isso a força e a vitalidade de cada país só serão em medida da força e da vitalidade da família nesse mesmo país. Nenhum grupo tem tanto reflexo no país quanto a família. Nenhum grupo tem um papel tão influente no futuro do mundo.

Por esta razão, os esposos cristãos têm uma missão insubstituível no mundo de hoje. O amor generoso e a fidelidade do esposo e da esposa oferecem estabilidade e esperança a um mundo dilacerado pelo ódio e pela divisão. Com a sua perseverança durante toda a vida no amor vivificante, eles mostram o carácter sagrado e indissolúvel do vínculo sacramental do matrimónio. Ao mesmo tempo é a família cristã que promove simples e profundamente a dignidade e o valor da vida humana desde o momento da concepção.

A família cristã é também o santuário doméstico da Igreja. Numa família cristã encontram-se vários aspectos da Igreja no seu conjunto, como o amor mútuo, a atenção à Palavra de Deus e a oração comum. O lar é o lugar onde o Evangelho é recebido e vivido e de onde é irradiado. Além disso, a família dá testemunho quotidiano, embora tácito, da verdade e da graça da Palavra de Deus. Por esse motivo, declarei na minha Encíclica: "Os esposos... devem tender, com todas as suas forças, para perseverar na união, matrimonial, construindo com este testemunho de amor a comunidade familiar e educando as novas gerações de homens para serem capazes de consagrar, também eles, toda a sua vida à própria vocação, ou seja, àquele 'serviço real' do qual nos foram dados o exemplo e o modelo mais belo por Jesus Cristo" (Redemptor hominis RH 21).

Dilectos filhos, e filhas, todas as famílias que constituem a Igreja e todos os indivíduos que constituem a família, todos nós juntos somos chamados a caminhar com Cristo, dando testemunho da verdade nas vicissitudes da nossa vida quotidiana. Assim fazendo, podemos impregnar a sociedade com o fermento do Evangelho, o único que pode transformá-la no Reino de Cristo — um Reino de verdade e de vida, um Reino de santidade e de graça, um Reino de justiça, de amor e de paz! Amén.



PEREGRINAÇÃO APOSTÓLICA DO SANTO PADRE À ÁFRICA



DURANTE A MISSA CELEBRADA


NA PRAÇA DA INDEPENDÊNCIA EM ACRA (GANA)


Quinta-feira, 8 de Maio de 1980




Caros irmãos e irmãs em Cristo

1. Há pouco menos de dez anos celebrou-se aqui, em Acra, o primeiro encontro Pan-africano-malgaxe para os Leigos. Na minha qualidade de Bispo de Cracóvia e de consultor do Conselho para os Leigos, tive então ocasião — se bem que não tenha assistido pessoalmente — de seguir os pontos salientes daquele acontecimento histórico, com particular atenção, interesse e admiração. Com efeito, os leigos — homens e mulheres — vindos de 36 países Africanos disseram em uníssono: "Presente"! Disseram ao mundo: "Estamos presentes na comunhão dos fiéis; estamos presentes na missão da Igreja de Cristo em África!".

359 2. Dez anos mais tarde, Deus concedeu-me a oportunidade de me deslocar a Acra para estar aqui convosco, de vos falar e de, mediante vós, dirigir uma mensagem a todos os leigos Católicos da África. Hoje é o Sucessor de Pedro, é o Papa João Paulo II que diz: "Presente!". Sim! Eu estou presente no meio dos leigos da África; venho como vosso pai, e como Pastor da Igreja universal. Estou presente como vosso irmão na fé! Como irmão em Cristo, quero dizer-vos quão próximo estou de vós, no amor infinito do Senhor crucificado e ressuscitado, quanto vos amo, e quanto amo os leigos da África!

Como vosso Pastor, desejo confirmar-vos nos vossos esforços para permanecerdes fiéis ao Evangelho, e à nossa missão de levar aos outros a Boa Nova da nossa salvação. Desejo exortar-vos, leigos, a renovardes através da Eucaristia o poder do vosso empenho cristão, a fazerdes reviver a alegria de serdes membros do Corpo de Cristo, a dedicardes-vos, uma vez mais, como Cristãos em África, à promoção do desenvolvimento autêntico e integral deste grande continente. Convosco, desejo agradecer ao Pai celeste, "recordando a actividade da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a constância da esperança que tendes em Nosso Senhor Jesus Cristo" (
1Th 1,3).

3. Irmãos e irmãs em Cristo, desejo dirigir as minhas palavras e a minha bênção aos leigos Católicos de todos os países da África. Desejo ultrapassar as fronteiras linguísticas, geográficas e étnicas, e, sem distinções, confiar todos a Cristo Senhor. Peço, por isso, a cada um de vós que ouve a minha mensagem de solidariedade fraterna e de instrução pastoral, que a transmita a outros. Peço-vos que façais correr a minha mensagem de aldeia em aldeia, de família em família. Dizei aos vossos irmãos e irmãs na fé que o Papa vos ama a todos, e que vos abraça na paz de Cristo.

4. Este vasto continente Africano foi dotado pelo Criador de muitíssimos recursos naturais. Temos visto, no nosso mundo contemporâneo, quanto o desenvolvimento e o emprego destes numerosos recursos têm contribuído de boa maneira para o progresso material e social dos vossos países. Ao agradecermos a Deus os frutos destes progressos, não devemos esquecer, não podemos esquecer que o maior recurso e o mais precioso tesouro confiado a vós ou a qualquer outro, é o dom da fé, o tremendo privilégio de reconhecer Jesus Cristo como Senhor.

Vós, leigos da Igreja, que possuís a fé, o maior de todos os recursos, vós tendes uma oportunidade única e uma responsabilidade crucial. Vós mostrais, através da vida de cada um, no meio das actividades quotidianas no mundo, o poder que possui a fé para transformar o mundo e para renovar a família humana. Mesmo oculto e ignorado como o fermento, ou como o sal da terra de que fala o Evangelho, o vosso papel de leigos é indispensável à Igreja no cumprimento da sua missão, recebida de Cristo. Foi-nos isto ensinado, com clareza, pelos Padres do Concílio Vaticano II, quando disseram: "A Igreja não está fundada verdadeiramente nem é o sinal perfeito de Cristo entre os homens se, com a Hierarquia, não existir e trabalhar um laicado autêntico. De facto, sem a presença activa dos leigos, o Evangelho não pode penetrar profundamente nos espíritos, na vida e no trabalho de um povo" (Ad Gentes, AGD 21).

5. O papel dos leigos na missão da Igreja aponta em duas direcções: em união com os vossos pastores e assistidos pela sua direcção, vós edificais a comunhão dos fiéis; por outro lado, como cidadãos responsáveis, impregnais a sociedade em que viveis com o fermento do Evangelho, agindo segundo a sua dimensão económica, social, politica, cultural e intelectual. Quando vós realizais com fidelidade estes dois papéis como cidadãos, quer da cidade terrena, quer do Reino dos céus, cumprem-se então as palavras de Cristo: "Vós sois o sal da aterra... vós sois a luz do mundo" (Mt 5,13-14).

6. Hoje, os nossos irmãos e irmãs recebem a nova vida através da água e do Espírito Santo (cfr. Jo ss.). Através do Baptismo são incorporados na Igreja, e renascem como filhos de Deus. Recebem a mais alta dignidade que qualquer pessoa possa possuir. Como disse São Pedro, tornam-se "raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido, a fim de anunciarem as virtudes d'Aquele que os chamou das trevas para a Sua luz admirável" (1P 2,9). Através do Sacramento do Crisma, unem-se mais intimamente à Igreja, e são dotados de força especial do Espírito Santo (cfr. Lumen Gentium LG 11). Por meio destes dois grandes sacramentas, Cristo chama o seu povo, Cristo chama todos os leigos a aceitarem a sua parte de responsabilidade na edificação da comunhão dos fiéis.

Como leigos, vós sois chamados a tomar uma parte activa na vida sacramental e litúrgica da Igreja e, de modo especial, no sacrifício Eucarístico. Ao mesmo tempo, sois chamados a difundir activamente o Evangelho através das obras de caridade e do vosso empenho activo nos esforços catequéticos e missionários, segundo os dons que cada um de vós recebeu (cfr. ss.). Em cada comunidade cristã, quer seja a "Igreja doméstica" constituída pela família, quer a paróquia que colabora com o sacerdote, ou a diocese unida em torno do bispo, os leigos esforçam-se, como os seguidores de Cristo no primeiro século, por permanecerem fiéis ao ensino dos Apóstolos, fiéis ao serviço fraterno, e fiéis à oração e à celebração da Eucaristia (cfr. Act Ac 2,42).

7. A vossa vocação Cristã não vos separa dos vossos irmãos e irmãs. Não vos inibe de vos empenhardes nas tarefas políticas, nem vos dispensa das vossas responsabilidades de cidadãos. Não vos marginaliza da sociedade, e não vos poupa às provas quotidianas da vida. Pelo contrário, o vosso contínuo empenho nas actividades e profissões seculares constitui parte autêntica da vossa vocação. De facto, vós sois chamados a tornar a Igreja presente e fecunda nas circunstâncias ordinárias da vida — na vida conjugal e familiar, nas condições quotidianas para ganhar o pão, nas responsabilidades políticas e cívicas, e nos vossos interesses culturais, científicos e educativos. Nenhuma actividade humana é estranha ao Evangelho. Deus quer que toda a criação seja orientada para o Seu Reino, pelo que o Senhor confiou este dever, de modo particular, aos leigos.

8. Os leigos da Igreja em África têm um papel crucial a desempenhar na resolução dos problemas e dos desafios urgentes que este vasto Continente deve enfrentar. Como leigos Cristãos, a Igreja espera de vós que plasmeis o futuro dos vossos países e que contribuais para o seu desenvolvimento nalgum âmbito particular. A Igreja pede-vos que leveis a influência do Evangelho e a presença de Cristo a todas as actividades humanas, e que procureis construir uma sociedade em que a dignidade da pessoa seja respeitada, e a igualdade, a justiça e a liberdade sejam defendidas e promovidas.

9. Hoje, gostaria ainda de sublinhar a exigência de uma permanente instrução e catequização do laicado. De facto, só uma séria formação espiritual e doutrinal na vossa identidade Cristã, além de uma adequada preparação cívica e humana para as actividades seculares, tornarão possível este contributo do laicado ao futuro da África que é tão fortemente desejado. Neste contexto, pensemos na exortação de São Paulo: "nós vos pedimos e recomendamos no Senhor Jesus, que procedais em conformidade com as normas que de nós recebestes sobre o modo como deveis proceder para agradar a Deus, como já o fazeis. Tratai de progredir sempre" (1Th 4,1). Para atingir este fim é necessária uma consciência mais profunda do mistério de Cristo. É necessário que o laicado penetre neste mistério de Cristo e se forme especialmente na palavra de Deus que conduz à salvação. O Espírito Santo está a chamar a Igreja para prosseguir ao longo deste caminho, com amorosa firmeza e perseverança. Gostaria, portanto, de encorajar as dignas iniciativas que, a todos os níveis, foram já tomadas neste campo. Que tais esforços prossigam, e que disponham os leigos a realizarem, cada vez mais, a sua missão, para que, através da santidade de vida, possam satisfazer as muitas necessidades que os esperam, e para que toda a Igreja em África possa comunicar Cristo com crescente eficácia.

360 10. Irmãos e irmãs, a segunda leitura da Missa de hoje recorda-nos que Jesus Cristo "é a pedra viva..." (1P 2,4). Jesus Cristo é Aquele sobre o qual se constrói o futuro do mundo, e do qual depende o futuro de cada homem e de cada mulher. Devemos olhar para Ele em todas as ocasiões. Devemos construir sempre sobre Ele. Por isso vos repito o que disse ao mundo este ano, no dia de Páscoa: "Não rejeiteis Cristo vós, que de qualquer maneira e seja em que sector for, construís o mundo de hoje e de amanhã: o mundo da cultura e da civilização, o mundo da economia e da poética, o mundo da ciência e da informação. Vós, os que construís o mundo da paz... não rejeiteis Cristo: Ele é a Pedra angular!".

11. Com as palavras do Apóstolo Pedro, convido-vos a "aproximardes-vos d'Ele, de tal modo que também vós..., como pedras vivas, entreis na construção de um edifício espiritual" (1P 2,4-5), edificando a Igreja em África, e antecipando o Reino de Deus sobre a terra.

É neste espírito que rezamos ao nosso Pai celeste: "Venha a nós o Vosso Reino, seja feita a Vossa vontade assim na terra como no céu". Assim seja.

Depois da Homilia

Caros irmãos e irmãs do Togo e do Benin

Obrigado por terdes vindo em tão grande número, por terdes caminhado tanto para vos encontrardes com o Vigário de Cristo. Convido-vos, também a vós, a permanecerdes fortes na fé, e muito unidos entre vós. O Senhor é fiel. Ele nunca vos abondonará se n'Ele depositardes a vossa confiança. Tornar-vos-á fortes, para que possais testemunhar a vossa fé, não apenas na Igreja, mas também nas actividades da vossa vida quotidiana, onde é necessário optar incessantemente por viver segundo a verdade, a pureza e a caridade do Evangelho. Continuai a instruir-vos nas verdades da fé. Aproximai-vos com alegria dos sacramentos da penitência e da Eucaristia, pensando que é o Senhor que vos perdoa, que vos alimenta e vos dá a Sua graça. É este o sinal visível da Sua presença invisível. Como dizia Jesus ressuscitado: "A paz esteja convosco". "Não temais". Que o Senhor vos abençoe.





PEREGRINAÇÃO APOSTÓLICA DO SANTO PADRE À ÁFRICA



DURANTE A SOLENE LITURGIA EUCARÍSTICA


DEDICADA AOS CATEQUISTAS


Estádio de Kumasi, Gana

Sexta-feira, 9 de Maio de 1980




Caros irmãos e irmãs

1. Hoje é dia de grande alegria e há muito tempo que eu o estava esperando. Desejei vir e dizer aos catequistas quanto os estimo, quanto a Igreja precisa deles. Hoje é ainda dia de profundo significado porque Jesus — o Filho de Deus, o Senhor da história e o Salvador do mundo — está presente no meio de nós. Através do Seu Santo Evangelho fala-nos com aquelas palavras que uma vez dirigiu aos discípulos: "Foi-Me dado todo o poder no céu e na terra: Ide, pois, ensinai todas as nações, baptizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a cumprir tudo quanto vos tenho mandado. E Eu estarei sempre convosco..." (Mt 28,18-20).

2. Este mandamento e esta promessa de Jesus inspiraram a evangelização do Gana e de toda a África, orientando a vida de todos quantos colaboraram na causa do Evangelho. De modo particular, foram estas palavras impressas no coração dos numerosos catequistas do século passado. E hoje pretendo manifestar a profunda estima da Igreja por estes dedicados trabalhadores ao serviço do Evangelho. Exprimo a gratidão de toda a Igreja católica aos catequistas que estão aqui presentes hoje, aos seus predecessores na fé e aos seus colegas catequistas no continente africano: gratidão pelo auxílio por eles oferecido em recrutar discípulos de Cristo; pelo auxílio dado ao povo em crer que Jesus Cristo é Filho de Deus; e pela ajuda em instruir os seus irmãos e irmãs na sua vida e assim edificar o Seu Corpo, a Igreja. Esta actividade catequística foi exercida com a palavra e o exemplo, e a dedicação de inúmeros catequistas e o seu profundo apego à pessoa de Jesus Cristo constituem um capítulo de glória nos fastos desta terra e deste continente.

361 3. A Igreja reconhece nestes catequistas pessoas chamadas a exercitar um particular encargo eclesial, uma especial participação na responsabilidade de fazer avançar o Evangelho. Vê neles as testemunhas da fé, servos de Jesus Cristo e da Sua Igreja, colaboradores eficazes na missão de estabelecer, desenvolver e incrementar a vida da comunidade cristã. Na história da evangelização muitos destes catequistas foram, de facto, mestres de religião, guias das suas comunidades, zelosos missionários leigos e modelos de fé. Ajudaram fielmente os missionários e o clero local, apoiando-lhes o ministério com o exercício da sua missão característica.

Os catequistas prestaram muitos serviços relacionados com a difusão do conhecimento de Cristo, com a fundação da Igreja, com o enxerto cada vez mais profundo do poder transformador do Evangelho na vida dos seus irmãos e irmãs. Ajudaram o povo em muitas exigências suas humanas, contribuindo para o desenvolvimento e o progresso.

4. Em tudo isto, fizeram eles explicitamente conhecer o nome e a pessoa de Jesus Cristo, a sua doutrina, a sua vida, as suas promessas e o seu Reino. As comunidades que eles ajudaram a constituir eram baseadas nos mesmos elementos que se encontram na Igreja primitiva: no ensino e na fraternidade dos Apóstolos, na Eucaristia e na oração (cfr. Act
Ac 2,42). Assim era favorecido o domínio de Cristo numa comunidade a seguir à outra, de uma geração para a seguinte. Mediante o seu trabalho generoso, a ordem de Cristo é continuamente executada e verifica-se a Sua promessa.

5. A Igreja está não somente grata por tudo quanto foi realizado pelos catequistas no passado, mas está esperançada no futuro. Apesar das novas circunstâncias, das novas exigências e dos novos obstáculos, a importância deste grande apostolado não fica diminuída, porque sempre será necessário desenvolver uma fé inicial e guiar o povo para a plenitude da vida cristã. Uma crescente consciência da dignidade e importância da missão do catequista é consequência da insistência do Concílio Vaticano II em estar a Igreja inteira inserida na responsabilidade do Evangelho. Só com a colaboração dos seus catequistas poderá a Igreja corresponder adequadamente à exigência por mim descrita na minha exortação apostólica sobre a Catequese no nosso tempo: "A Igreja, neste século XX prestes a terminar, é convidada por Deus e pelos acontecimentos — que são outros tantos apelos da parte de Deus — a renovar a sua confiança na actividade catequética, como tarefa verdadeiramente primordial da sua missão; é convidada a consagrar à catequese os seus melhores recursos de pessoal e energias, sem poupar esforços, trabalhos e meios materiais, a fim de a organizar melhor e de formar, para a mesma, pessoas qualificadas. Nisto não há que ater-se a um cálculo simplesmente humano, mas tem de existir uma atitude de fé" (Catechesi tradendae CTR 15).

6. A Sagrada Congregação para a evangelização dos povos, numerosos Bispos e Conferências Episcopais muito valorizaram a importância da formação de catequistas, e são nisto dignos do maior elogio. O destino da Igreja na África está indubitavelmente ligado ao êxito desta iniciativa. Desejo, por isto, animar o mais possível este maravilhoso trabalho. O futuro da actividade catequística dependerá de profundos programas de preparação, que abracem uma instrução cada vez maior para os catequistas e dêem prioridade à formação espiritual e doutrinal deles, tornando-os capazes de experimentar nalguma medida o autêntico sentido da comunidade cristã que são chamados a edificar.

Os auxílios da catequese merecem também a devida atenção, incluindo neles um eficaz material catequístico que tenha presente a necessidade de encarnar o Evangelho em determinadas culturas locais. Por isso, deve a Igreja inteira sentir-se interessada a enfrentar as dificuldades e os problemas inerentes à execução dos programas catequísticos. De modo especial, a comunidade eclesial inteira deve manifestar a própria estima pela importante vocação do catequista, que deve sentir-se apoiado pelos próprios irmãos e irmãs.

7. Sobretudo, para assegurar o êxito de qualquer actividade catequística, é necessário que se mantenha cristalinamente clara a finalidade mesma da catequese: a catequese é trabalho de fé que ultrapassa qualquer técnica; é esforço da Igreja de Cristo. O seu objecto primário e essencial é o mistério de Cristo; a sua finalidade definitiva é colocar as pessoas em comunhão com Cristo (cfr. Catechesi tradendae CTR 5). Através da catequese continua a actividade de Jesus Mestre: solicita dos Seus irmãos a adesão à Sua pessoa, e mediante a Sua Palavra e os sacramentos guia-os para o Pai e para a plenitude de vida na Santíssima Trindade.

8. Reunidos aqui hoje para celebrar o Sacrifício Eucarístico, exprimamos a nossa confiança no poder do Espírito Santo para que Ele continue a fazer surgir e a manter, para a glória do Reino de Deus, novas gerações de catequistas, fiéis transmissores da Boa Nova de salvação e testemunhas de Cristo e Cristo crucificado.

9. Hoje a Igreja oferece aos catequistas o sinal do amor de Cristo, o grande símbolo da Redenção: a Cruz do Salvador. Para os catequistas de todos os tempos, a Cruz constitui a credencial de autenticidade e a medida do êxito. A mensagem da Cruz é, em toda a verdade, "o poder de Deus" (1Co 1,18).

Caros catequistas, caros irmãos e irmãs: ao desempenhardes a vossa missão, ao comunicardes Cristo, recordai-vos das palavras de um pioneiro da catequese do século IV, São Cirilo de Jerusalém: "A Igreja católica orgulha-se de todas as acções de Cristo, mas a sua glória maior está na Cruz" (Catequese, 13).

Com esta Cruz, com o crucifixo que vós hoje recebeis como sinal da vossa missão na Igreja, ide para a frente confiadamente e cheios de alegria. E recordai-vos também que Maria está sempre perto de Jesus, ao lado d'Ele; está sempre perto da Cruz. Ela vos guiará incólumes à vitória da ressurreição e ajudar-vos-á a comunicar aos outros o mistério pascal do seu Filho.

362 Dilectos catequistas do Gana e de toda a África: Cristo chama-vos ao Seu serviço; a Igreja envia-vos. O Papa abençoa-vos e recomenda-vos à Rainha do céu. Amém.





PEREGRINAÇÃO APOSTÓLICA DO SANTO PADRE À ÁFRICA



DURANTE A MISSA CAMPAL NA PRAÇA


EM FRENTE À CATEDRAL DE UAGADUGU


Sexta-feira, 10 de Maio de 1980




Caros Irmãos e Irmãs em Cristo

1. "Os pobres, os necessitados buscam água... Eu, o Senhor, os atenderei... Transformarei o deserto num reservatório..." (Is 41,17-18). "... A água que eu lhe der tornar-se-á nele uma nascente de água a jorrar para a vida eterna" (Jn 4,14).

Eis o ensinamento contido na Palavra de Deus que acabámos de ouvir; eis o ensinamento que o Senhor nos dá!

Eu sou a água viva, disse ainda o Senhor, eu sou a fonte da água que dá a vida. Para haurir desta fonte viestes aqui, esta manhã, para escutar a Palavra de Deus que vos é proposta por aquele que a Divina Providência escolheu para ser o Chefe da Sua Igreja, para ser, como São Pedro, o Seu porta-voz junto de todos os fiéis, em união com os bispos, os sucessores dos Apóstolos.

É com profunda emoção que fixo em vós o meu olhar, meus irmãos e minhas irmãs da Igreja que está no Alto Volta. Realiza-se hoje um desejo do meu coração: o de vir testemunhar junto de vós, no vosso próprio país, o amor de Deus nosso Pai e o de Seu Filho Jesus Cristo, o Seu amor a cada um de vós. Poder dizer, poder proclamar: Deus ama-me! Não é esta porventura uma grande alegria que deve encher o nosso coração? Sim, Deus ama-vos, onde quer que estejais: nas vossas cidades, nas vossas aldeias e nas vossas famílias, no mercado, como ao longo dos caminhos: Deus ama-vos em todas as partes e sempre!

A vossa presença aqui testemunha também a vossa afeição pela Igreja que vos transmite esta mensagem de amor. Quando vos fito, o meu coração enche-se de confiança, porque sei que aceitastes a Mensagem de amor com alegria e gratidão; porque sei que tendes afeição à Igreja e quereis ser testemunhas do Evangelho com generosidade e coragem.

2. A minha permanência entre vós será breve; demasiadamente breve para mim que gostaria de encontrar-vos em toda a parte: nas vossas paróquias, nas vossas escolas e nas vossas casas; demasiadamente breve também para vós porque sei que muitos que gostariam de estar aqui esta manhã, não puderam vir: os que moram distante, os enfermos ou os que sofrem, os que estão a trabalhar, e os que são ainda muito pequeninos! Digo a todos os que não estão presentes: o Papa saúda-vos e abençoa-vos!

E saúdo também com afecto o meu irmão, o Cardeal Paul Zoungrana, que foi um dos três primeiros sacerdotes do vosso país e que é hoje o grande e fiel pastor desta arquidiocese de Uagadugu. Saúdo com ele os meus irmãos no episcopado, como também os irmãos e irmãs de todas as suas dioceses: Uagadugu, Kupela, Bobo-Diulasso, Diebugu, Fada-N'Gurma, Kaya, Kudugu, Nuna-Dedugu e Uahigüia!

Desejaria saudar-vos um por um, meus irmãos no sacerdócio, padres que o povo do Alto Volta deu generosamente ao Senhor e padres que vieram de longe ao serviço do Evangelho entre vós. Todos vós, religiosos e religiosas, e catequistas, que vos entregais com dedicação à vossa tarefa de evangelização. E vós mulheres cristãs: depende também de vós grande parte do futuro e das suas esperanças para a Igreja e para o vosso povo; mães de família e jovens que sois ou que sereis responsáveis, com os vossos esposos, pela formação dos vossos filhos. Saúdo os anciãos, os pais de família que trabalham com tanta fadiga pelos seus entes queridos, os homens, os jovens e as crianças. Saúdo-vos a todos, também a vós que viestes tão numerosos do Togo; saúdo-vos em nome do amor que nos une numa só Igreja, na grande família de Deus!


Homilias JOÃO PAULO II 357