Sacerdotalis caelibatus PT 93

O coração do Bispo


93 A solidão humana do sacerdote, lacuna que é a origem não última de tentações e desânimos, há de ser preenchida sobretudo pela vossa presença ativa, fraterna e amiga. (47) Antes de serdes superiores e juízes dos vossos sacerdotes, haveis de ser mestres, pais, amigos, e irmãos bons e misericordiosos, prontos para os compreender, para os desculpar, para os ajudar. Procurai de todos os modos que os sacerdotes vos dediquem amizade pessoal e levai-os a abrirem-se confiadamente convosco, sem que esta amizade e confiança suprimam a relação de obediência jurídica; devem, pelo contrário superá-la dentro da caridade pastoral, para que essa obediência seja mais voluntária, mais leal e mais segura. A amizade dedicada e a confiança filial convosco, levarão os sacerdotes a abrir-vos, a tempo, as suas almas, a confiar-vos as dificuldades, na certeza de poderem contar sempre com o vosso coração, para nele depositarem mesmo as possíveis derrotas, sem o temor servil do castigo, mas esperando como filhos, correção, socorro e perdão, o que os irá estimular a retomarem confiadamente o árduo caminho da vida.

Autoridade e paternidade


94 Todos Vós, Veneráveis Irmãos, estais certamente persuadidos de que o restituir à alma sacerdotal a alegria e o entusiasmo pela própria vocação, a paz interior e a salvação, é ministério urgente e glorioso que tem influxo incalculável numa multidão de almas. Se em determinado momento fordes obrigados a recorrer à vossa autoridade e à justa severidade para com os poucos que, contra a vossa vontade, causam escândalo ao Povo de Deus com a sua conduta, procurai ter em vista, antes de tudo, a sua recuperação ao tomardes as providências necessárias. À imitação do Senhor Jesus Cristo, Pastor e Bispo das nossas almas (1P 2,25), não quebreis a cana fendida e não apagueis a mecha que fumega (Mt 12,20). Curai, como Jesus, as chagas (cf. Mt 9,12), salvai o que se tenha perdido (cf. Mt Mt 18,11), buscai com ânsia e amor a ovelha desgarrada e trazei-a ao calor do redil (cf. Lc 15,4ss.), procurai, como Ele, até ao fim, chamar uma vez mais o amigo infiel (cf. Lc 22,48).

Magistério e vigilância


95 Temos a certeza, Veneráveis Irmãos, que não deixareis de experimentar todos os meios para cultivar assiduamente no vosso clero, com doutrina e zelo de pastores, o ideal do celibato, e que não perdereis nunca de vista os sacerdotes que abandonaram a casa de Deus, que é a sua própria casa, pois eles serão para sempre vossos filhos, seja qual for o desfecho da sua dolorosa aventura.


V. A PARTE DOS FIÉIS


Responsabilidade de todo o Povo de Deus


96 A virtude sacerdotal é um bem de toda a Igreja, é riqueza e glória que, não sendo humanas, redundam em edificação e benefício de todo o Povo de Deus. Queremos, por isso, dirigir esta nossa afetuosa e premente exortação a todos os fiéis, nossos filhos em Cristo, para que também eles se sintam responsáveis pela virtude destes irmãos que assumiram a missão de servi-los no sacerdócio para os levar à salvação. Rezai e trabalhai pelas vocações sacerdotais, ajudai os sacerdotes com dedicação e amor filial, com dócil cooperação a eles dada, com a intenção bem determinada de oferecer-lhes o conforto da alegre correspondência aos seus cuidados pastorais. Animai estes vossos pais em Cristo a superarem as diversas dificuldades que encontram no cumprimento fiel dos deveres, para a edificação do mundo. Cultivai, com espírito de fé e de caridade cristã, profundo respeito pelo sacerdote, de modo particular na condição de homem totalmente consagrado ao serviço de Deus e da Igreja.

Convite aos leigos


97 O nosso convite dirige-se particularmente àqueles leigos que buscam mais assídua e intensamente a Deus, e tendem à perfeição cristã na vida secular: podem ser de grande auxílio aos sacerdotes com dedicada e cordial amizade. De fato, os leigos estando inseridos na ordem temporal e, ao mesmo tempo, empenhados na mais generosa e perfeita correspondência à vocação batismal, têm possibilidade de, nalguns casos, iluminar e confortar o sacerdote que, imerso no ministério de Cristo e da Igreja, poderia vir a sofrer dano na integridade da vocação, devido a certas situações e a um turvo espírito mundano. Deste modo, todo o Povo de Deus honrará o Senhor Jesus Cristo naqueles que o representam e dos quais Ele disse, prometendo recompensa certa àqueles que de algum modo, exercerem a caridade para com os seus enviados (Mt 10,42): "Quem vos recebe, a Mim me recebe; e quem me recebe, recebe ao que me enviou" (Mt 10,40).

CONCLUSÃO


Intercessão de Maria


98 Veneráveis Irmãos, Pastores do rebanho de Deus espalhado pelas diversas partes do mundo, caríssimos sacerdotes irmãos e filhos nossos, para concluir esta carta que vos dirigimos de alma aberta a toda a caridade de Cristo, convidamo-vos a voltardes confiadamente os olhos e o coração para a dulcíssima Mãe da Igreja, invocando, com renovada e filial confiança, a sua materna e poderosa intercessão em favor do sacerdócio católico. Nela, o Povo de Deus admira e venera o tipo e a figura da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo. Maria, Virgem e Mãe, alcance para a Igreja, que também é chamada mãe e virgem, (48) a graça de poder gloriar-se, humildemente e sempre, da fidelidade dos sacerdotes ao sublime dom da virgindade, e de vê-lo florescer e ser cada vez mais apreciado, em todos os ambientes, para que engrossem as fileiras dos que acompanham o Cordeiro por onde quer que Ele vá (cf. Ap Ap 14,4).

Firme esperança da Igreja


99 A Igreja proclama altamente esta sua esperança em Cristo: tem consciência da dramática escassez de sacerdotes em relação às necessidades espirituais da população do mundo, mas espera firmemente, fundada nos recursos inimitos e misteriosos da graça, que a qualidade espiritual dos seus ministros há de produzir também o seu aumento em número, pois a Deus tudo é possível (cf. Mc 10,27 Lc 1,37).

Nesta fé e nesta esperança, a bênção apostólica que de todo o coração vos concedemos, seja para todos vós augúrio de graças celestes e testemunho da nossa paternal benevolência.



Dado em Roma, junto de S. Pedro, a 24 de junho, festa de S. João Batista, do ano 1967, quinto do nosso pontificado.



PAULUS PP. VI


Notas

1. Carta de 10 de outubro a Sua Emcia. o Card. E. Tisserant, lida na Congr. Ger.146 de 11 de outubro.

2. Conc. Ecum. Vat. II, Decreto Christus Dominus, n. 25; Apostolicam actuositatem, n. l; Presb. Ordin., nn.10,11; Ad Gentes, nn. l9-38.

3. Conc. Ecum. Vat. II, Const. Gaudium et Spes, n. 62.

4. Decr. Presbyter. Ordinis, n.16.

5. Conc. Ecum. Vat. II, Const Dogm. Dei Verbum, n. 8.

6. Conc. Ecum. Vat. II, Const. Dogm. Lumen Gentium, n. 28; Decr. Presbyterorum Ordinis, n. 2.

7. Decr. Presbyter. Ordinis, n.16.

8. Decr. Presbyter. Ordinis, n.16.

9. Const. Lumen Gentium, n. 42.

10. Cf. Const. dogm. Lumen Gentium, n. 42; Decr. Presbyter. Ordinis, n.16.

11. Decr. Presbyter. Ordinis, n.14.

12. Cf. Decr. Presbyter. Ordinis, n.13.

13. Decr. Presbyter. Ordinis, n. 5.

14. Decr. Optatam Totius, n.10.

15. Decr. Presbyter. Ordinis, n. l6.

16. Const. past. Gaudium et Spes, n. 39.

17. Const. dogm. Lumen Gentium, n. 5.

18. Const. dogm. Lumen Gentium, n. 48.

19. Conc. Ecum. Vat. II, Decr. Perfectae Caritatis, n.12.

20. Cf. Tertuliano, De exhort. castitatis, 13: PL 2,930; S. Epifânio, Adv. haer. II, 48,9 e 59, 4: PG 41,869,1025; S. Efrém, Carmina nisibena., XVIII, XIX, ed. G. Bickell, Leipzig 1866, p. 122; Eusébio de Cesaréia, Demonstr. evang. 1,9: PG 22,81; S. Cirilo de Jerusalém, Catech.12,25: PG 33, 757; S. Ambrósio, De offic ministr. 1,50: PL 16,97 ss.; S. Agostinho, De moribus Eccl. cathol.1,32: PL 32,1939; S. Jerônimo, Adv. Vgilant, 2: PL 23,340-41; Sinésio Bispo de Toulon, Epist. 105: PG 66,1485.

21. A primeira vez no Concílio de Elvira em Espanha (c.a. 300), c. 33: Mansi II,11.

22. Sess. XXIV, can. 9-10.

23. S. Pio X, Exhort. Haerent animo, 4 ag.1908, AAS 41,1908, pp. 555-577; Bento XV, Carta ao Arceb. de Praga F. Kordac. 29 jan.1920, AAS 12,1920, p. 57s.; Alloc. consist. 16 dic.1920, AAS 12,1920, pp. 585-588; Pio XI, Enc. Ad catholici sacerdotii, 20 dic.1935, AAS 28,1936, pp. 24-30; Pio XII, Adhort. Ap. Menti Nostrae, 23 set.1950, AAS 42,1950, pp. 657-702; Enc. Sacra virginitas, 25 março 1954, AAS 46,1954, pp.161-191; João XXIII, Enc. Sacerdotii Nostri primordia,1 ag.1959, AAS 51,1959, pp. 554-556.

24. Aloc. II ao Sínodo Romano, 26 janeiro 1960, AAS 52,1960, pp. 235-236 (texto lat. p. 226).

25. Can. 6,12,13,48: Mansi XI, 944-948, 965.

26. Decr. Presbyter. Ordinis, n.16.

27. De Virginitate, l3: PG 46, 381-382.

28. De Sacerdotio, l, II, 4, PG 48,642.

29. Const. dogm. Lumen Gentium, nn. 21,28,64.

30. Const. cit., n. 29.

31. Const. cit., n. 42.

32. Decr. Presbyter. Ordinis, n.16.

33. Decr. Optatam Totius, n. 2; Presbyterorum Ordinis, n. 11.

34. Confes., X, 29,40: PL 796.

35. Cf.1Tes 2,11;1Cor 4,15; 2Cor 6,13; Gl 4,19;1Tm 5,1-2.

36. Decr. Presbyter. Ordinis, n. 3.

37. Decr. Optatam Totius, nn. 3-11; Cf. Perfectae Caritatis, n.12.

38. S. Tomás d'Aquino, Summa Th., IIa IIae, q.184, a. 8c.

39. Decr. Optatam Totius, n.12.

40. Decr. Presbyter. Ordinis, nn.16,18.

41. Decr. Presbyter Ordinis, n.18.

42. Decr. Presbyter. Ordinis, n. 8.

43. Decr. cit., ibid.

44. Const. Dogm. Lumen Gentium, n. 28.

45. Const. Dogm. Lumen Gentium, n. 21.

46. Decr. Presbyter. Ordinis, n. 7.

47. Decr. cit., ibid.

48. Const. dogm. Lumen Gentium, nn. 63, 64.







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